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Região Norte é a que se mantém mais longe dos níveis de afluência às urgências registados antes da pandemia
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Região Norte é a que se mantém mais longe dos níveis de afluência às urgências registados antes da pandemia

PAULO NOVAIS/LUSA

Região Norte é a que se mantém mais longe dos níveis de afluência às urgências registados antes da pandemia

PAULO NOVAIS/LUSA

Afluência às urgências atinge níveis pré-pandemia. Governo acusado de ignorar soluções propostas por grupo de trabalho

Depois da diminuição provocada pela pandemia, a procura pelas urgência hospitalares já recuperou. "Tudo voltou ao mesmo. Não estranho", critica a médica que, em 2019, apresentou soluções ao Governo.

A afluência às urgências dos hospitais do SNS atingiu, no primeiro trimestre deste ano, níveis muitos próximos daqueles que foram registados no mesmo período de 2019, o último inverno antes da aparecimento do SARS-CoV-2, o vírus que levou a Organização Mundial de Saúde a decretar uma pandemia e que conduziu, nos dois anos seguintes, a uma quebra na procura pelos serviços de urgência.

Entre janeiro e março de 2023, registaram-se 1.412.943 atendimentos feitos após o recurso à Triagem de Manchester nestes serviços, um valor muito próximo do de 2019, quando foram triados nas urgências 1.427.586 utentes (apenas mais 1%), segundo os dados consultados pelo Observador no Portal da Transparência do SNS no final da semana passada. Os números do primeiro trimestre de 2023 já ultrapassam mesmo os de 2018 e 2017.

Cai assim por terra a expectativa de que a pandemia pudesse vir a arrefecer, de forma permanente, a procura dos utentes pelas urgências hospitalares, um local de elevada concentração de pessoas e onde os vírus podem disseminar-se com mais facilidade. Afinal, uma vez ultrapassada a fase mais crítica da pandemia — e já depois de ter sido decretado o “fim da emergência global” —, a afluência está quase em níveis pré-Covid.

“Esta evolução era expectável, não estranho”, reage, em declarações ao Observador, a presidente da Sociedade Portuguesa de Medicina de Urgência e Emergência (SPMUE). Adelina Pereira sublinha que há um excesso de procura nas urgências em Portugal, sendo que os problemas identificados por vários grupos de trabalho ao longo dos anos, inclusive um liderado por si, “não foram resolvidos”. “Como não foram tomadas medidas básicas, tudo voltou ao mesmo”, lamenta a médica, que trabalha no serviço de urgência do Hospital de Matosinhos.

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Problemas das urgências mantêm-se e tutela ignorou recomendações de grupo de trabalho

Adelina Pereira liderou, em 2019, um grupo de trabalho, criado pela tutela, e que tinha a função de apresentar soluções para melhorar os serviços de urgência. Os membros desse grupo de trabalho percorreram todo o país, garante, tendo reunido com todas as Administrações Regionais de Saúde (ARS) e com dezenas de diretores clínicos de hospitais e outros responsáveis, de modo a identificar as maiores dificuldades.

Um dos problemas transversais a todos os serviços de urgência foi a escassez de recursos humanos, situação que ainda hoje se mantém.

Hospitais da região de Lisboa com procura nas urgências semelhante a valores pré-pandemia

Outro dos problemas apontados foi o da falta de formação dos médicos que trabalham nestes serviços. Desde que foi criada, em 2020, que a SPMUE se tem batido pela criação de uma especialidade de Medicina de Urgência, criação que foi, entretanto, chumbada pela Ordem dos Médicos. Adelina Pereira não tem dúvidas de que as urgências funcionariam melhor, assim como os hospitais como um todo, se os recursos humanos tivessem formação específica naquele contexto hospitalar. “Devíamos ter médicos especialistas em Medicina de Urgência”, sublinha.

Ordem dos Médicos chumba criação de especialidade de medicina de urgência

“Neste momento, as equipas de urgência dependem de médicos que são retirados de outros serviços (como a Medicina Interna). E, depois, temos pessoas que não têm formação, muitos são colegas mais jovens que ainda não entraram na especialidade e que vão fazer urgência”, frisa a médica, acrescentando que a elevada rotatividade de médicos faz com que os “diretores de serviço tenham uma dificuldade enorme em fazer escalas”.

Outro dos problemas identificados, diz, foi o elevado número de admissões na urgência de idosos residentes em lares (em muitos casos, por falta de cuidados médicos nas instituições onde vivem). Apesar de não ser possível saber quantos dos episódios de urgência são referentes a pessoas institucionalizadas, o Governo, preocupado com esta realidade, anunciou, em 2022, um serviço de atendimento e resposta médica do SNS24 para idosos de lares.

Adelina Pereira refere também o elevado peso dos internamentos sociais, que, além de ocuparem camas que deveriam ser destinadas a casos de doença aguda, consomem também o tempo de recursos humanos (nomeadamente médicos) que deveriam estar centrados no serviço de urgência. Estes internamentos referem-se a utentes que têm alta clínica dos hospitais do SNS mas que se mantêm internados (por falta de acompanhamento familiar ou de resposta social adequada, como vaga num lar ou numa Unidade de Cuidados Continuados Integrados, por exemplo).

Ainda assim, a situação não é hoje tão grave como antes da pandemia, uma vez que, de modo a libertar camas para doentes Covid, os hospitais articularam-se com a Segurança Social para retirar dos hospitais centenas de “casos sociais”. Os últimos dados, relativos a janeiro de 2023, davam conta de 665 pessoas sem respostas sociais (mas com alta clínica) nos hospitais públicos — um número bastante inferior ao que chegou a ser registado antes da pandemia, quando rondava um milhar.

Depois de ouvidos vários responsáveis e as Administrações Regionais de Saúde, o grupo de trabalho liderado por Adelina Pereira entregou um relatório, em novembro de 2019, com um conjunto de soluções para melhorar as urgências. No entanto, a médica lamenta que nada tenha sido feito. “Das medidas que foram propostas, nenhuma delas foi implementada”, sublinha. Entre elas estavam a criação de uma especialidade, a implementação de campanhas de literacia em saúde (“é importante que as pessoas comecem a perceber que nem tudo tem de ser resolvido no momento”, realça a médica) e o reforço dos cuidados de saúde primários, em várias vertentes.

"Temos de descentralizar os cuidados de urgência para os Serviços de Urgência Básica - nos centros de saúde"
Adelina Pereira, presidente da Sociedade Portuguesa de Medicina de Urgência e Emergência

Adelina Pereira recusa medidas que limitem o acesso à urgência a doentes pouco graves. Perante a falta de resposta dos cuidados primários e o retomar da procura pelas urgências hospitalares, muitos responsáveis têm vindo a público defender soluções mais drásticas para travar o recurso às urgências em casos não urgentes. O médico internista Luís Campos, por exemplo, defendeu, já este ano, que estes casos deviam ser “admitidos em sítios anexos ao serviço de urgência por equipas não hospitalares, tendo a possibilidade de usar os exames complementares ou a consultadoria dos especialistas que existem na urgência”.

Mais drástica é a solução proposta pelo coordenador da Unidade de Medicina de Urgência e Medicina Intensiva do São João. Nelson Pereira já defendeu que “é imprescindível regular o acesso”, fechando as urgências aos doentes pouco graves que recorram aos serviços por iniciativa própria, isto é, sem serem encaminhados pela linha de Saúde24, do INEM ou dos centros de saúde.

Em vez de condicionar o acesso, Adelina Pereira sublinha que é necessário atuar a montante dos serviços de urgência, aumentando o número de utentes com médico de família atribuído. Ora, de 2019 até agora, esse reforço não se verificou, antes pelo contrário: em abril deste ano, quase 1,7 milhões de utentes não tinham médico, o número mais elevado dos últimos oito anos.

Depois de um período inicial, até meados de 2019, em que o número de utentes a descoberto (isto é, sem médico) até foi diminuindo (com o valor mais baixo a fixar-se nos 640 mil), a verdade é que a tendência se inverteu. Em dois anos e meio, até abril de 2022, este número quase duplicou, para 1,2 milhões. Uma subida que continuou a verificar-se até ao último mês. Aliás, o número de população sem médico é, neste momento, superior à registada quando o primeiro governo de António Costa tomou posse, em novembro de 2015. Nessa altura, cerca de um milhão de portugueses não tinham clínico atribuído.

O grupo de trabalho, coordenado pela especialista que falou com o Observador, propunha ainda o reforço das competências dos centros de saúde, nomeadamente com a instalação de meios complementares de diagnóstico nestes locais, bem como o alargamento dos Serviço de Urgência Básica (SUB), medidas que permitiriam, diz, aproximar os cuidados das população e retirar mais pessoas das urgências hospitalares. “Temos de descentralizar os cuidados de urgência para os Serviços de Urgência Básica (SUB)”, reforça.

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O indicador referente ao peso dos utentes pouco urgentes triados nos serviços de urgência é a prova de que não avançou nenhuma das medidas propostas relacionadas com os cuidados de saúde primários. Embora o número absoluto de urgências não seja ainda superior ao de há quatro anos, um dado importante a reter dos dados publicados no Portal da Transparência é o aumento (em percentagem) das chamadas ‘falsas urgências’, isto é, doentes triados com pulseiras azuis ou verdes e, por isso, considerados pouco urgentes. Enquanto no primeiro trimestre de 2019 esse valor era de 38,6%, este ano atingiu os 40%.

Região Norte é a que menos contribui para o aumento da procura

A recuperação, quase total, da afluência às urgências acontece depois de dois anos em que a pandemia originou uma diminuição significativa do recurso a estes serviços, muito por causa do receio do contágio. Em 2020, registaram-se menos 38% de doentes triados nas urgências em relação a 2019. Em 2021, o número de atendimentos subiu mas, ainda assim, ficou cerca de 19% abaixo do último ano pré-covid. Mas, em 2022, a recuperação foi ainda mais expressiva.

Apesar de, no primeiro trimestre de 2023, a afluência ainda estar 1% abaixo da registado no período pré-pandémico, há duas regiões de Portugal Continental que já ultrapassaram os episódios de urgência triados em 2019, neste mesmo período: a região Centro (mais 6,5% no primeiro trimestre de 2023 em relação ao período homólogo de há quatro anos) e o Algarve (mais 2,8%). Tanto o Alentejo como a região de Lisboa e Vale do Tejo quase igualaram dos níveis de afluência de 2019.

Já a região Norte é aquela que mantém ainda uma maior distância (menos 5,4%) face à realidade pré-pandémia, muito por causa da boa cobertura de médicos de família, um fator importante para reduzir o recurso aos serviços de urgência.

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