Até de olhos fechados se percebe que se está a passar pela Ponte 25 de Abril. Basta ouvir o barulho dos pneus sobre as grelhas abertas. Um zumbido constante causado pelos cerca de 160 mil veículos que atravessam a ponte diariamente. Estas grelhas são estruturas fundamentais para que a ponte resista à força dos ventos, refere ao Observador Pedro Abegão, engenheiro das Estradas de Portugal, lembrando o que aconteceu à ponte de Tacoma, nos Estados Unidos, que ficou toda torcida quando o vento forçou o tabuleiro compacto.

Mesmo assim a ponte abana. E ainda bem. Os cabos de aço ancorados em cada margem dão à ponte elasticidade suficiente para abanar sem quebrar – cada pilar pode inclinar-se um metro para cada lado. “Em termos de construção é das mais flexíveis. Se houver um sismo a ponte abana como uma gelatina, sem partir”, diz o responsável pela segurança da exploração rodoviária e ferroviária numa visita à sala da amarração. São quatro em cada margem, as salas frias de betão onde os cabos se ligam à terra, mas não diretamente – as roldanas é que se fixam ao solo e a envolvê-las os fios de aço que compõe os cabos.

Durante a construção daquela que chegou a ser a maior ponte suspensa fora dos Estados Unidos, os fios de cabo corriam entre as margens e as torres de forma contínua – a ponta final do fio de cada bobine era ligado ao início do próximo -, gastando até à inauguração da ponte, a 6 de agosto de 1966, mais de 54 mil quilómetros de fio de aço galvanizado com 5 milímetros de espessura. Com a instalação da linha de caminho-de-ferro em 1996, aos dois cabos principais juntaram-se 20 mil quilómetros de fio para os dois cabos secundários.

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São mais de 11 mil fios de aço a dar espessura a cada cabo principal (se visto em corte transversal) – 4100 em cada cabo secundário – enrolados com um último fio que os mantém bem apertados entre si num cilindro perfeito onde a humidade não entra. Além da humidade, a corrosão provocada pela poluição e pelo ar salgado vindo do mar são as principais preocupações em relação aos cabos, por isso os fios têm uma pintura especial, suficientemente elástica para que não quebre enquanto os cabos esticam e encolhem com o movimento da ponte.

Aos dois cabos principais, de 54 centímetros de diâmetro cada, juntaram-se os dois secundários, de 35 centímetros. O objetivo era reforçar a estrutura para receber a linha de caminho-de-ferro prevista desde a construção nos anos 1960, mas apenas concretizada mais de 30 anos depois. De Almada vem o túnel do comboio, pavimentado até à entrada na ponte para permitir o acesso de veículos de emergência, uma das medidas de evacuação e segurança que as duas dezenas de visitantes puderam conhecer ao longo deste percurso. A outra medida está sobre os pés: plataformas de evacuação largas o suficiente para permitir a circulação dos passageiros evacuados até às zonas de refúgio ou a umas das 12 escadas de evacuação que dão acesso ao tabuleiro rodoviário.

Do nível do rio, que corre 70 metros abaixo das grelhas por onde se caminha, até ao topo dos pilares são 190 metros. Mas abaixo da superfície, o pilar sul tem ainda mais 80 metros até tocar no leito do rio (35 metros no caso do pilar norte). As fundações da ponte foram colocadas no fundo do rio sem um único homem ter tido necessidade de entrar dentro de água. Como as peças de um Lego, as caixas metálicas com cilindros no meio foram sendo colocadas umas sobre as outras – viajavam pelo rio até ao local marcado, eram cheias com betão e à medida que se iam afundando outras eram colocadas por cima. Pelos cilindros ocos que perfuravam as caixas metálicas foi possível escavar o leito do rio para enterrar melhor a base dos pilares.

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Todas as estruturas de aço foram fornecidas e montadas pela empresa portuguesa Sorefame (extinta no início dos anos 2000) e os testes de capacidade de carga da ponte foram realizados pelo Laboratório Nacional de Engenharia Civil, tanto nos anos 1960 como nos anos 1990. Esta instituição científica continua a monitorizar o desempenho da ponte – agora com 72 mil toneladas de aço e 263 mil metros cúbicos de betão. Uma equipa de técnicos especializados da EP, que trabalham em conjunto com outras entidade e empresas nomeadamente o LNEC e ISQ, desenvolve permanentemente um conjunto de atividades de monitorização, inspeção e manutenção da estrutura da Ponte 25 de Abril e seus equipamentos garantindo a segurança e mobilidade das milhares de pessoas que diariamente nela circulam.

E são estes mesmos funcionários do ISQ, parte de uma equipa de 16, que constatam o prazer que é trabalhar neste local. “Stress é coisa que raramente existe, porque basta uma caminhada pelo tabuleiro para ter acesso a uma vista extraordinária e única.” Mas isso não quer dizer que o trabalho seja fácil. As vistorias de segurança são extenuantes, a manutenção da ponte é uma tarefa exigente que obriga a uma atenção permanente ao detalhe e a uma organização perfeita. No inverno, quando o clima se torna impiedoso e dificulta os trabalhos de manutenção, o esforço é maior — mas compensado pelo acesso ao topo dos pilares de onde de desfruta da melhor vista possível sobre Lisboa, a partir de um ponto suspenso sobre o Tejo. De lá vê-se desde a Lezíria do rio até à serra de Sintra, enquanto na outra margem a vista se estende bem para lá da Arrábida. E basta olhar para baixo para entender a importância da ponte, que tem um tráfego imparável.

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O desejo era antigo. Datava de 1876 o primeiro projeto de uma travessia sobre o Tejo. Na altura foi Miguel Pais, respeitado engenheiro, quem propôs uma arrojada construção entre o Grilo e o Montijo — era já coisa ambiciosa, com dois tabuleiros para permitir rodovia e ferrovia. Os setenta e cinco anos seguintes foram passados entre projetos aventureiros de túneis ou pontes de enormes dimensões e burocracias que embatiam sempre contra os custos de tais ideias. Só na década de cinquenta do século XX, já óbvio o potencial e o atraso da região sul, se decidiu enfim pela construção. O concurso internacional de 1962 foi ganho pela United States Steel Export Company (hoje conhecida simplesmente como US Steel, uma das maiores do negócio do aço em todo o mundo). A inspiração, óbvia, é a da Golden Gate de São Francisco, construída 25 anos antes e uma referência mundial no capítulo das pontes suspensas. Neste documentário, disponível no canal do Youtube da Estradas de Portugal, pode acompanhar-se todo o processo de construção com imagens da época.

A ponte chamada Salazar na inauguração acompanhou os sinais dos tempos e em 1974 passou a chamar-se 25 de abril, mas muitos continuam a chamar-lhe simplesmente Ponte sobre o Tejo. Foi vítima do seu próprio sucesso: criada para estimular o desenvolvimento da margem sul e permitir a expansão de Lisboa, não durou trinta anos até ficar desatualizada graças ao enorme fluxo rodoviário que a atravessava diariamente. Primeiro optou-se por uma via intermédia reversível, mas a solução também não durou e entre 1992 e 1996 a ponte ganhou mais duas vias, obrigando à reconversão da praça da portagem sul e usando finalmente o tabuleiro inferior para o comboio como estava no projeto original. A concorrência da Ponte Vasco da Gama ajudou a libertar algum tráfego, mas é ainda hoje pela ponte metálica que se tem a mais nobre entrada de Lisboa.

São 48 anos feitos no dia 6 de agosto, mas a efeméride vai mais longe — a Estradas de Portugal (EP) inicia a comemoração do quinquagésimo aniversário com um ciclo de atividades que vai estender-se ao longo de 24 meses para dar a verdadeira dimensão da importância da ponte. A primeira destas atividades é a exposição “Uma ponte para o futuro” que foi inaugurada em Almada e apresenta fotografias e peças do período de construção da Ponte. António Ramalho, presidente da EP, assume o orgulho na “responsabilidade de preservar um dos maiores ícones da engenharia portuguesa.” E isto porque a ponte é “mais que um marco da engenharia, é um verdadeiro ex-libris de Lisboa que atravessa elegantemente rio Tejo”. Será na dimensão única desse ex-libris que se vão centrar as comemorações da construção da ponte.

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No imediato, há uma forma de poder conhecer esta estrutura por dentro. O Ciência Viva faz visitas guiadas à Ponte no âmbito da Engenharia no verão. Dado o sucesso, esta será sempre uma iniciativa a manter. Naturalmente, nesta visita não estão acessíveis espaços como os pilares centrais. Mas pode conhecer as salas de amarração, aceder à estrutura da ponte, passear pelo passadiço e cruzar-se tranquilamente com um comboio que cruza o Tejo.

Pela primeira vez na visita à Ponte 25 de Abril, que já vai na 5ª edição, Ana Noronha, diretora do programa Ciência Viva no Verão, mostrou-se fascinada. “Andava há muito tempo para fazer esta visita, mas ainda não tinha tido oportunidade”, disse, aproveitando para recomendar ao Observador outras visitas, como os centros de controlo de tráfego, as antenas de telecomunicações ou as barragens. Os programas no âmbito da Engenharia no verão existem desde 2004 e, segundo Ana Noronha, foram bem recebidos pelo público, assim como a generalidade das atividades do programa Ciência Viva no Verão implementado em 1996.

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