O coordenador do Chega na comissão de inquérito à TAP, Filipe Melo, explica que quer manter a companhia na esfera pública porque a operação de aviação comercial “dá lucro” e só admite a privatização se for devolvido aos portugueses o apoio de 3,2 mil milhões e se ficarem garantidas rotas estratégicas para zonas onde há comunidades portuguesas. Em entrevista ao programa Vichyssoise, da Rádio Observador, o deputado do Chega defendeu políticas de imigração com base da nacionalidade do país de origem, dizendo que é preferível viver num prédio com europeus do que com muçulmanos.
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Filipe Melo argumenta com as diferenças culturais e diz que convenceu um amigo que criticava o Chega da sua poisção quando lhe perguntou se preferia viver num prédio com nove vizinhos de “certa etnia” (numa referência velada à comunidade cigana) ou com “nove vizinhos caucasianos“.
O deputado mantém que a culpa do ataque no Centro Ismaili é do Governo e que Portugal está um país “cada vez menos seguro”. Diz ainda acreditar que o Chega pode ser o partido mais votado das legislativas se estas só ocorrerem em 2026 e que já pagou os milhares em dívidas que tinha quando foi eleito deputado.
Questionou na quarta-feira Alexandra Reis sobre um motorista que a CEO da TAP tentou afastar. E perguntou-lhe se sabia que esse motorista era familiar do presidente de um dos sindicatos da TAP. De que sindicato estava a falar?
Não posso adiantar hoje, por uma questão de respeito pelo dirigente sindical, que ainda vai ser ouvido na comissão como todos os sindicatos ligados à TAP, preferia não dizer antes de o inquirir.
Poderia apostar que é Tiago Faria Lopes, do SPAC.
Não confirmo nem desminto.
Vai falar com ele antes da audição?
Não.
Só há três partidos dos maiores contra a privatização da TAP: Bloco de Esquerda, PCP e Chega. Portanto, o Chega não se importa de manter a TAP na esfera pública e pagar cheques de 3,2 mil milhões como aconteceu nos últimos apoios?
O Chega defende que a TAP é uma empresa estratégica para o país pelo que representa na ligação com as comunidades, com a nossa diáspora, em termos de compras para o nosso PIB… não nos opomos à venda desde que salvaguardados estes interesses. Mas com a venda, a ser feita, os contribuintes têm de ser ressarcidos dos investimentos que lá fizeram. A Lufthansa, por exemplo, teve um empréstimo por parte do Estado de um valor exorbitante e devolveu na íntegra e com juro. Quando a TAP estiver em condições de devolver aos portugueses…
Mas acredita que isso vai acontecer, conhecendo o historial da empresa?
Depende de quem compre.
E se continuar a acumular prejuízos são sempre contra a venda?
A TAP, SA não dá prejuízo, dá lucro. É o negócio puro e duro da aviação. A TAP só começou a dar prejuízo quando houve a tal TAP SGPS que, dentro daquele grupo, meteu todos onde a TAP SA estava. Se olharmos para a TAP apenas como um ativo na área da aviação dá lucro e muito.
Portanto, com a TAP a dar lucro não há problema de se manter uma empresa pública.
Pública ou privada. Nós não somos a favor de empresas públicas, mas o Estado não serve para gerir empresas, quem gere empresas são os privados, as pessoas. O que defendemos é que para a TAP ser vendida, no acordo de venda, têm de ser salvaguardados alguns interesses estratégicos nacionais e ser devolvido o investimento que lá foi feito e aí não temos nada a opor.
Deixe-nos recordar uma citação: “Propomos entre outras medidas: “alínea g) Todas as empresas de transporte sob tutela da Administração Central e Local serão privatizadas”. Sabe em que programa político está esta frase?
Essa afirmação é válida. Empresas como a CP, a Carris, a Transtejo, a Soflusa não faz sentido nenhum estarem no Estado.
Mas o Chega tem defendido que é contra a reprivatização da TAP. André Ventura até chegou a dizer que não devia haver uma privatização selvagem…
Estou perfeitamente de acordo com o que ele disse. As empresas não devem estar na esfera pública, a começar pela degradação dos transportes: compra-se barcos sem bateria e as baterias vão-se pagar muito mais caras à parte; o que se passa nos comboios, com as pessoas a terem de sair do comboio com o mesmo em andamento; comboios e metros lotados. Isto é a gestão do Estado em matérias de transportes. Uma gestão privada com um investimento privado e com o conhecimento que têm os privados nestas áreas, certamente que ficaríamos muito melhor servidos.
Na TAP não?
A TAP é diferente por uma questão estratégica nacional. Seja qual for a companhia que compre a TAP, os nossos emigrantes que estão no Luxemburgo, em Cabo Verde, em São Tomé, na Suíça… como é que eles conseguiam vir a Portugal? Não são rotas estratégicas e temos de ter esse cuidado. A nossa emigração é um tema central, preocupamo-nos muito com os nossos emigrantes, o retorno deles, e essas ligações não serão rotas prioritárias para quem compra.
Então, regressando à primeira pergunta sobre o tema: só há três partidos que são contra a privatização da TAP, Bloco de Esquerda, PCP e Chega. Está a dizer-nos que mantém esta ideia ou, afinal, não é contra a privatização da TAP?
Não nos opomos à privatização da TAP desde que seja salvaguardada…
Com uma concessão de serviço público que mantenha rotas [para países com grandes comunidades lusófonas] e que devolva o dinheiro, é isso?
Naturalmente e que devolva o dinheiro, os 3,2 mil milhões. Não pode haver sacrifício dos portugueses para salvar uma empresa e depois entregarmos ou vendermos a uma grande empresa estrangeira e ficarmos com prejuízo e eles comprarem uma empresa financeiramente estável e equilibrada com esse esforço.
E acha que alguém está disponível para aceitar as condições do Chega?
A longo prazo acredito que sim.
Quanto tempo vai demorar, quantas mais injeções serão precisas?
Penso que mais nenhuma injeção, os lucros que supostamente a empresa teria de dar em 2025 foram antecipados e a empresa já começou a apresentar resultado positivo em final de 2022. Se com um plano de reestruturação pesado e algumas limitações pesadas que existiam dentro da empresa se reverteu e há resultados positivos acho que só podemos esperar que a empresa continue a melhorar. O turismo em Portugal é uma arma fortíssima para quem comprar a TAP, temos é de saber potenciar essas rotas.
As autoridades acreditam que o ataque ao Centro Ismaili foi um ato isolado. Estar a usar estas mortes como um cavalo de batalha político, como o Chega acabou por fazer, não é populismo e oportunismo?
Muito sinceramente, não houve oportunismo nem qualquer forma de tentar capitalizar a desgraça alheia. É do mais baixo a que podemos assistir em política e o Chega não o fez. O Chega manifestou uma preocupação muito grande de que isto fosse o início de algo que pode vir a ser.
André Ventura chegou a dizer que a teoria de que poderia ser um surto psicótico era uma fantasia. O que é que leva o Chega a tirar essas conclusões que as autoridades não retiraram?Já houve novos desenvolvimentos que dizem que isto pode não ser um surto psicótico, que já estava a ser pensado.
Na altura não havia nenhuma outra indicação que não a das autoridades, de que foi um ato isolado. E o Chega falou na hipótese do terrorismo e agendou um debate sobre imigração e segurança logo a seguir. Isso não é tornar a questão política sem ter dados para isso?
Não, é uma preocupação. Temos dito muitas vezes que uma das nossas principais preocupações é a segurança e preocupa-nos muito que isto não seja um ato isolado e que possa ser o início de algo mais no nosso país. Isso é que nos assusta.
Mas o início de quê? E tendo em conta que também há crimes em Portugal todos os dias, cometidos por portugueses. O que é que lhe indica que isto é o início de outra coisa?
Infelizmente há. Nós vimos muito drama acerca do que nós dissemos. Deixe-me fazer a pergunta ao contrário: se fosse um português num surto psicótico que matasse dois afegãos. Tínhamos certamente a imprensa a dizer “coitados dos refugiados afegãos que vêm para cá e são mortos”.
Mas ninguém colocou em causa que as vítimas são vítimas. O que está em causa é quem cometeu o crime, e foi isso que o Chega cavalgou em termos políticos. Ventura disse que o sangue das vítimas está nas mãos do Governo. Isto não é capitalizar politicamente?
Não, é responsabilizar o Governo pela falta de segurança que o país atravessa.
Acha mesmo que a culpa do que se passou ali é de António Costa?
A culpa é do Governo. Se fosse outro governante diríamos o mesmo.
Mas acha que Portugal não é um país seguro?
Está a ficar cada vez menos seguro, infelizmente. Repare no que aconteceu ontem em Carcavelos. Se eu estivesse naquele momento com a minha mulher e os meus filhos na praia, como é que iam ficar, se eram apanhados no meio daquela cena de pancadaria imensa? Posso-me sentir seguro durante o dia numa praia em Portugal?
Pancadaria às vezes até há dentro do Parlamento, entre pessoas do Chega.
Olhe, desconheço.
Já aconteceu.
Desconheço, com toda a verdade. Nunca presenciei e do que conheço do grupo parlamentar não acredito de todo.
Deputado e militante do Chega envolvidos em confronto físico na Assembleia da República
Foi entre um deputado e um membro de uma distrital. Avançando: a solução para o Chega pode passar por proibir a vinda de pessoas que o partido identificou, como o Afeganistão ou o Paquistão?
Não é proibir. O Chega não fecha as portas à imigração, porque respeitamos quem muda de país à procura de uma vida melhor, ou não fôssemos nós um país de emigração. Mas quem vem para cá tem de vir com um contrato de trabalho.
Isso é o que pede o PSD. Vocês fazem uma diferença por nacionalidade.
Mas com certeza. Deixe-me colocar esta questão e responda-me frontalmente: vive num prédio com dez apartamentos. Sentia-se confortável em ter dez famílias afegãs ou sírias ou nove famílias italianas ou francesas? O que é que preferia?
Dependia das pessoas. Se fossem vizinhos respeitáveis…
Regra geral.
Já lhe disse, é indiferente.
Não será assim tão indiferente.
Então a questão não é o contrato de trabalho. Se for uma pessoa do Afeganistão com contrato não é tão bem vinda como da Suíça, Espanha, Angola ou Moçambique — exemplos dados por André Ventura.
Não dissemos que não é bem vinda. Dissemos que não podemos escancarar as portas a determinados imigrantes que vêm de determinados pontos do mundo. É diferente termos dez pessoas muçulmanas ou dez da Europa ocidental.
Mas é diferente porquê?
As práticas, os costumes…
Isso não é só uma questão de preconceito? Não conhecendo esses vizinhos, não sabendo se têm contrato.
Fiz na altura uma questão idêntica a uma pessoa da minha amizade que também nos criticava muito pelo que dizíamos em relação a certa etnia. E perguntei: se tivesses de optar entre nove vizinhos dessa etnia ou nove caucasianos, o que escolhias?
Mas uma política de imigração não se define assim, tendo em conta o que preferia um amigo.
Nós não podemos querer para o nosso país o que não queremos dentro do nosso prédio.
O que está a dizer que não quer dentro do seu prédio não é igual ao que todas as pessoas que aqui estão, ou no país, querem.
Tenho a certeza de que o que quero para o meu país é o que quero para o meu prédio: paz, tranquilidade, harmonia, igualdade de oportunidades para todos.
Vamos saber agora o que quer para o Governo. Num cenário, como o da última sondagem, em que o PSD pode vencer as eleições sem maioria absoluta, se o PSD não quiser fazer aliança com o Chega, o Chega não está condenado a viabilizar o programa de Governo no Parlamento e viabilizar esse Governo?
O Chega não está condenado a nada.
Preferirá manter o PS no Governo?
Jamais, o Chega prefere a esquerda a qualquer tipo de solução.
Então levantam-se e saem.
Não, não. Sentamo-nos à mesa e mostramos que o Chega não é uma alternativa, é a solução. É que não há outra. Luís Montenegro pode dizer o que quiser, pode haver outro partido que se diz de direita mas que já disse que não é esquerda nem de direita, mas Governo sem chega não existe. Neste momento, não há Governo sem o Chega. Daqui por um ano, ou se este Governo chegar a 2026 — que eu duvido — podemos estar a falar noutra condicionante, que é: quem é que vai fazer parte de uma solução governativa com o Chega? Digo isto muito convicto.
O Chega ganha as eleições, nesse cenário, ou será uma espécie de partido charneira?
É possível. Quem diria que o Chega no espaço de um ano dobrava a intenção de voto? Neste momento estamos nos 15%. Porque é que não há de conseguir, com o trabalho que está a fazer, estar nos 20% daqui a um ano? E se o Governo chegar a 2026, porque é que não podemos chegar aos 30%?
O Chega é crítico do programa do Governo para a habitação. Está tudo bem na habitação em Portugal?
Se somos críticos é porque está tudo mal.
O programa propõe-se a resolver os problemas no setor.
Desde 2015 os programas do Governo propõem resolver. E não se resolve, só se piora a situação.
E deu por esse problema quando?
Quando? Todos os dias.
E porque é que não está no programa do Chega?
O programa do Chega… vocês tendem a apontar lacunas, mas faço-vos um convite: vejam o programa do partido do Governo e apontem as falhas. São muito mais do que as nossas.
Fazemos isso quando temos uma oportunidade de entrevistar pessoas desse partido. Agora estamos aqui consigo. E de facto o Chega tem duas ou três referências muito vagas sobre habitação, que não concretizam nenhuma ideia.
O nosso programa tem mais de um ano. O flagelo da habitação na altura não estava como está agora. Agora atravessamos uma crise gravíssima. Na altura havia esse problema e daí essas menções.
O que é que o Chega propõe sobre habitação?
Sobre fiscalidade, o que o Governo fez não resolve. Qualquer reforma tem de começar por aí.
Baixar o IMI?
Não é só o IMI, é dar vantagens por via do IRS. O Governo mexeu, é verdade, mas não o suficiente, longe disso. A questão do PRR está muito mal aproveitada. Há um preconceito ideológico muito grande em entregar a construção aos privados. O regresso do crédito bonificado, por que não? Estimula todos os setores da economia.
Em breve, o presidente do Brasil virá à Assembleia da República para uma sessão de boas-vindas. Que tipo de protesto é que a bancada do Chega vai fazer durante a sessão?
Quero acreditar que não vamos fazer porque quero acreditar que Lula não vai discursar.
Acha que ainda é possível travar isso?
Espero que sim, a bem do país.
Jair Bolsonaro virá a um evento do Chega. A 29 de outubro, Bolsonaro, perante um jornalista da RTP disse: “Não falo espanhol nem portunhol”. O Chega revê-se nesta abordagem? Quando vier cá, vai falar com sotaque do Brasil para Bolsonaro o perceber?
No Brasil fala-se a língua portuguesa. Eu respeito-a muito. Não se fala brasileiro no Brasil nem em Portugal.
Disse à Visão há um ano que tinha dívidas de 120 mil euros “em resolução”. Já pagou tudo o que devia?
Já na altura estava a ser resolvido. Está ultrapassado.
Foi acusado do crime de desobediência simples, por um jantar em Braga durante a campanha e a pandemia Covid. Se for condenado neste processo abandona o cargo de deputado?
Com certeza que não. Isso é um não assunto. Na minha opinião pessoal, que não vincula o partido, isto é uma perseguição política. No mesmo dia, no dia anterior, no dia depois, eventos idênticos realizaram-se, com outros candidatos apoiados por outros partidos e não aconteceu rigorosamente nada.
Vamos agora ao nosso segundo segmento, o bloco “Carne ou Peixe”. Tem a possibilidade de fazer uma visita guiada ao Bom Jesus. Quem prefere levar: João Galamba ou Pedro Nuno Santos?
Pedro Nuno Santos.
Num cenário em que o Chega não tem candidato nas próximas presidenciais, em quem preferia votar: Paulo Portas ou Luís Marques Mendes?
Paulo Portas.
Se tivesse um lugar vago num jantar-comício do Chega (não um em tempos de Covid) e só pode convidar uma pessoa: Mariana Mortágua ou Inês Sousa Real?
Inês Sousa Real.
Tem um bilhete a mais para ir ver o Benfica, quem leva consigo: António Costa ou Nuno Afonso?
António Costa.