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Montenegro está apostado em dramatizar ao máximo e obrigar Pedro Nuno a assumir-se como força de bloqueio
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Montenegro está apostado em dramatizar ao máximo e obrigar Pedro Nuno a assumir-se como força de bloqueio

JOÃO PORFÍRIO/OBSERVADOR

Montenegro está apostado em dramatizar ao máximo e obrigar Pedro Nuno a assumir-se como força de bloqueio

JOÃO PORFÍRIO/OBSERVADOR

Governo admite cenário de duodécimos, mas não quer dar trunfos a Pedro Nuno

Governar em duodécimos é possível, mas núcleo duro do Governo não quer alimentar tese. Objetivo é pressionar Pedro Nuno e obrigar socialista a decidir o que fará no OE. Recados de Marcelo registados.

Até outubro a pressão é para manter. Depois, logo se verá. Luís Montenegro não está disposto a dar um ponto de fuga a Pedro Nuno Santos e vai continuando a fazer saber que, uma vez viabilizado o Programa de Governo, o socialista está de alguma forma obrigado a viabilizar o próximo Orçamento do Estado, o cabo das tormentas de Montenegro e um seguro que lhe permitiria manter-se no cargo, em teoria, pelo menos durante dois anos. Mas há um ângulo morto que está a ser explorado por alguns socialistas (e que vai alimentando a fé de alguns sociais-democratas): o chumbo do Orçamento não significa a queda automática do Executivo, que pode perfeitamente governar em duodécimos e manter-se assim em plenitude de funções. Esse cenário é contemplado pelo núcleo duro do Governo, mas admiti-lo abertamente coloca um problema: desobriga Pedro Nuno Santos a comprometer-se com o próximo Orçamento do Estado.

Ora, essa é uma vantagem que Luís Montenegro não quer perder. O primeiro-ministro arrancou para esta legislatura apostado em dramatizar ao máximo e usar desde logo a cartada da vitimização: se o PS se comportar como um “bloqueio democrático“, terá de ser penalizado. No discurso de tomada de posse, o novo primeiro-ministro deixou, aliás, duas ideias-chave: “Não rejeitar o Programa do Governo no Parlamento não significa apenas permitir o início da ação governativa. Significa permitir a sua execução até ao final do mandato ou, no limite, até à aprovação de uma moção de censura“.

Ou seja, o que Montenegro quis com isto sugerir foi que se o PS, como já garantiu, não alinhar no derrube do Executivo já na discussão do Programa de Governo, então está coerentemente obrigado a permitir a viabilização do Orçamento do Estado. Este é o ponto número um. Mas Montenegro disse mais: nesse cenário, só uma moção de censura, que teria sempre de ser aprovada por Pedro Nuno Santos e André Ventura, derrubará o primeiro-ministro. E é esta frase pode ser interpretada (e está a ser) como a assunção de que Luís Montenegro estará apostado em governar em duodécimos se for essa a melhor opção na altura.

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Em tese, este cenário é perfeitamente possível. Este Orçamento é generoso do ponto de vista da despesa que pode ser acomodável, existe um entendimento de que há margem suficiente para fazer aprovar algumas das medidas mais prioritárias do programa da Aliança Democrática e a convicção de que é possível negociar autorização de despesa peça à peça no Parlamento. No fundo, seria a aplicação prática daquilo que sugeriu Marcelo Rebelo de Sousa na tomada de posse do Governo: “O pão partido em pequeninos, aplicável a esta situação, significa que se parte um problema em vários pequenos e resolve-se um a um com paciência, sem criar ambições ilusórias”.

Entre sociais-democratas ouvidos pelo Observador existe a ideia de que, desarmadilhando a questão do Orçamento do Estado como um todo, os partidos da oposição que contam verdadeiramente para aritmética parlamentar (PS e Chega) teriam muitas dificuldades em votar contra determinadas autorizações de despesa que permitissem resolver problemas pendentes em várias áreas e fazer aprovar medidas teoricamente populares. E mesmo que o fizessem, numa legislatura que será toda ela em modo “campanha eleitoral“, teriam de justificar depois o chumbo de propostas concretas e facilmente identificáveis pelos eleitores — o que não é a mesma coisa que explicar o chumbo abstrato de um Orçamento por discordância política de fundo, como Pedro Nuno Santos vem fazendo.

No entanto, admitir publicamente que pode ser esta a estratégia do Governo coloca um problema à cabeça: liberta Pedro Nuno Santos do seu maior desafio como líder da oposição, que é decidir o que vai fazer em relação ao Orçamento do Estado. O socialista tem dito repetidamente que é “praticamente impossível” votar a favor daquele documento, mas é um ponto de leitura comum a todos que quem bloqueia a governação acaba penalizado nas urnas. É com essa dramatização que Montenegro vai jogando: se estará ou não o PS disposto a chumbar o Orçamento, provocar a queda do Governo, lançar o país a votos outra vez e responder nas urnas por isso mesmo.

Por tudo isto, assumir que é possível governar em duodécimos e sem amarrar Pedro Nuno Santos é permitir que o socialista encontro um ponto de fuga e se liberte da decisão de ter ou não de aprovar um Orçamento do Estado — ideia que o núcleo duro do novo Governo quer a todo custo evitar. De resto, não passou despercebida a entrevista de Eduardo Ferro Rodrigues à SIC Notícias, onde o antigo presidente da Assembleia da República admitiu, preto no branco, que Montenegro pode perfeitamente governar em duodécimos.

Para os sociais-democratas ouvidos pelo Observador, estas declarações de Eduardo Ferro Rodrigues têm três propósitos: desonerar Pedro Nuno Santos, castigar a Aliança Democrática no Orçamento do Estado e anunciar preventivamente que, se quiser governar, Montenegro está condenado a fazê-lo em duodécimos — o que, mesmo sendo possível, transformar-se-á, mais cedo ou mais tarde, num pântano de onde a AD dificilmente sairá vencedora.

Em tese, cenário de duodécimos é perfeitamente possível. Este Orçamento é generoso do ponto de vista da despesa que pode ser acomodável, existe um entendimento de que há margem suficiente para fazer aprovar algumas das medidas mais prioritárias do programa da Aliança Democrática e a convicção de que é possível negociar autorização de despesa peça à peça no Parlamento. No fundo, seria a aplicação prática daquilo que sugeriu Marcelo Rebelo de Sousa na tomada de posse do Governo: “O pão partido em pequeninos, aplicável a esta situação, significa que se parte um problema em vários pequenos e resolve-se um a um com paciência, sem criar ambições ilusórias". Mas levanta problemas.

Recados de Marcelo registados. Mas vai mesmo ter de decidir

Depois, há uma outra variável que ninguém ignora: o que fará Marcelo Rebelo de Sousa se for confrontado com o chumbo do Orçamento do Estado. O Presidente da República tem dois precedentes (Costa 2021 e Bolieiro 2023) que não lhe deixam grande margem política para não dissolver o Parlamento em circunstâncias semelhantes. Nesses momentos, quando os orçamentos foram chumbados, o Chefe de Estado decidiu-se pela dissolução dos parlamentos.

Mas Marcelo Rebelo de Sousa está em fim de ciclo, pode despedir-se do cargo com um país bloqueado e ingovernável e quererá, a todo o custo, evitar dissolver pela quinta vez um Parlamento (fê-lo por duas vezes no continente, uma nos Açores e outra na Madeira). A pressão, como se viu no discurso da tomada de posse do Governo, é para que Montenegro encontre soluções criativas que evitem o cenário mais drástico, lavando daí as mãos presidenciais.

Aliás, segundo o semanário Expresso, Belém vai sugerindo que, mesmo que haja um chumbo orçamental, Montenegro só não governa se não quiser. No núcleo mais duro do Governo, ainda assim, ninguém vai ao engano: apesar da renovada relação de confiança entre Montenegro e Marcelo, acredita-se que o Presidente da República procurará todos os argumentos que lhe permitam salvar a face e não ficar com o ónus de dissolver (mais uma vez) um Parlamento; logo, ir dizendo que foi Montenegro quem não quis governar em circunstâncias adversas e que procurou ativamente uma crise política é só um meio para atingir esse mesmo fim.

Os sociais-democratas não são indiferentes aos recados de Marcelo, mas vão notando o óbvio: antes de se saber se Montenegro quer ou vai governar em duodécimos, terá de ser o Presidente da República a decidir se dissolve ou não o Parlamento e justificar porquê. Só depois, e só se Marcelo decidir contra os precedentes que abriu, é que Luís Montenegro decidirá se tem ou não condições para governar e se se demite ou não.

Até lá, muitas variáveis podem mudar. A evolução da conjuntura internacional, as eleições europeias de 9 de junho (um barómetro determinante), a dialética parlamentar, a coesão interna do PS ou as sondagens que existiram em outubro, por exemplo. Montenegro, que tem horror às fugas de informação e a que os seus mais próximos alimentem cenários e antecipem estratégias, vai metendo gelo nos pulso. Tudo vai ser mexido peça a peça, jogada a jogada, sem precipitações, como numa partida de xadrez.

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