O período do Renascimento define-se por um regresso ao antigo ou, se quisermos, por conceber a modernidade segundo parâmetros e inspirações da Antiguidade Grega e Romana – na arte e não só, também na religião e no pensamento político.

Este é um paradoxo a que não será alheia a situação política do berço deste movimento, a península itálica, durante o século XIV: dividida em ducados, repúblicas, reinos e estados que procuravam liderança política forte, digna das memórias da Roma Antiga e respetivos césares. A evocação desses grandes homens e das glórias de outrora criou o cenário perfeito para o surgimento do humanismo, a corrente filosófica que está na origem do Renascimento e que faz a exaltação do potencial da humanidade, fundamentada nos exemplos clássicos.

Os ideais renascentistas foram manifestados em diversos campos da arte por mestres italianos cujo nome ficou, para sempre, ligado a este movimento. Falamos de pintores como Bellini, Ticiano e Rafael ou dos multifacetados Leonardo da Vinci e Michelangelo.

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A Coleção do Fundador do Museu Calouste Gulbenkian inclui uma obra de um dos grandes pintores da época, Cima da Conegliano. Intitulada “Descanso na Fuga para o Egipto”, ou Sacra Conversazione, data do final do século XV (1496-1498) e é uma obra exemplar nas características que normalmente se associam ao Renascimento: o cuidado nas proporções da figura humana, simetria na composição, atenção à paisagem, uso da perspetiva e jogo de luz e sombra.

O Renascimento é, também, uma época de retrato. Não só de reis, mas de pessoas anónimas. Afinal, esta era a época de consagração do indivíduo. E o retrato era um gosto particular de Calouste Gulbenkian, por isso a Coleção inclui alguns exemplares do género, como “Retrato de Uma Jovem”, de Domenico Ghirlandaio, do fim do século XV, e “Retrato de Marco António Savelli”, assinado por Giovanni Batista Moroni e produzido em meados do século XVI.

Domenico Ghirlandaio, «Retrato de uma Jovem». Florença, c. 1490. Têmpera sobre madeira. Museu Calouste Gulbenkian. Foto: Catarina Gomes Ferreira

Mas nem só de pintura se compõe o espólio renascentista do Museu Calouste Gulbenkian. A medalhística, que recupera a tradição da numismática da Antiguidade, também está representada na Coleção, através do seu nome maior, Antonio di Pucio Pisano (c.1395-1455), mais conhecido como Pisanello, inventor da medalha do Renascimento ou “medalha moderna”. As medalhas de Pisanello retratam figuras importantes da época, entre reis, marqueses e capitães.

Outra medalha importante da Coleção, esta cunhada em Veneza em 1480, é a do Sultão Maomé II, o Conquistador, de autoria de Gentile Bellini, e que demonstra como o célebre soberano otomano, que tomou Constantinopla ao Império Bizantino, se gostava de comparar aos imperadores romanos.

Esta medalha é sinal da influência oriental que também teve um peso significativo nesta época, especialmente devido às trocas comerciais cada vez mais intensas. A seda vinda do Oriente foi utilizada, por exemplo, em magníficas tapeçarias decorativas que fazem parte da Coleção, casos de “Vertumno e Pomona”, produção flamenga do século XVI que retrata uma composição mitológica baseada em “Metamorfoses”, de Ovídio, e a imponente armação “Jogos de Criança” com cartões do pintor maneirista Giulio Romano, produzida em Mântua para o cardeal Hércules de Gonzaga.

Outro exemplo flagrante dessa influência encontra-se nas encadernações da época, executadas com grande qualidade e requinte e recorrendo a materiais ricos e motivos ornamentais trazidos do Oriente. Calouste Gulbenkian era um apreciador deste tipo de obras. Da Coleção, destacamos “Giuramento di Francesco Priolo, Procurator della Chiesa di San Marco”, uma belíssima encadernação em couro lacado a azul-escuro, seguindo o esquema ornamental utilizado nos exemplares islâmicos.