1. Marcelo Rebelo de Sousa e Ferro Rodrigues ocupam as funções mais elevadas do Estado português. No entanto, o modo como as exercem não poderiam ser mais diferentes. Não posso ser acusado de ser um defensor do Presidente Marcelo Rebelo de Sousa. Nem defensor, nem eleitor. Não acreditava que Rebelo de Sousa pudesse ser um bom Presidente. Mas devo dizer que me enganei. Apesar de ser um pouco frenético de mais, especialmente para a função, e de se expor demasiado, acho que está a desempenhar o cargo de um modo positivo. A sua preparação jurídica dá-lhe sentido de Estado e dimensão institucional. O que é muito importante numa democracia representativa.

Muitos à direita criticam o Presidente por uma excessiva simpatia pelo governo socialista. Acho que em grande medida esta crítica resulta de expectativas erradas de muitos dos seus eleitores. Marcelo não foi eleito para fazer a vida difícil ao governo nem para facilitar o regresso da direita ao poder. Aliás, estou absolutamente convencido que Passos Coelho nunca esperou e nem deseja essa ajuda; e com razão. Se todos nós nas direitas atacámos a oposição activa do Presidente Mário Soaras contra o governo de Cavaco e o derrube de um governo de maioria parlamentar pelo Presidente Jorge Sampaio, não podemos esperar um comportamento semelhante de Marcelo. Eu, pelo menos, não espero. Pelo contrário, compete ao Presidente manter uma relação construtiva com o governo, como fez o Presidente Cavaco com o PM Sócrates entre 2005 e 2009.

No entanto, a boa relação com São Bento não impede o Presidente de criticar o PM quando acha necessário, de ser exigente com as políticas económicas do governo, de zelar pelos compromissos europeus e atlânticos e de defender outras instituições quando foram atacadas injustamente pela geringonça, como aconteceu com o governador do Banco de Portugal. Também elogiou o trabalho do anterior governo, e muito bem, quando o país saiu agora dos procedimentos pelo défice excessivo. Há um ponto que não se pode questionar. Marcelo Rebelo de Sousa chegou a Belém, colocou-se imediatamente acima dos partidos e tornou-se o Presidente de Portugal.

Ao contrário de Marcelo, a segunda figura do Estado, Ferro Rodrigues, não foi capaz de seguir o exemplo do Presidente da República. Teria muito a aprender se olhasse para Belém. Preside à Assembleia da República como um aliado do governo, sendo incapaz de despir a camisola de militante socialista. Faz declarações muito infelizes, tanto sobre a política interna como sobre a Europa. Como é possível o Presidente da Assembleia da República afirmar que o Euro tem beneficiado apenas a Alemanha? Não percebeu nada sobre as eleições francesas? Trata a oposição como um adversário político, atacando-a frequentemente durante os plenários da Assembleia. Já como líder do PS, Ferro Rodrigues havia mostrado uma total ausência de sentido de Estado.

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Ferro Rodrigues devia ainda recordar os exemplos de alguns dos seus antecessores, começando pelos socialistas. Almeida Santos e Jaime Gama (na minha opinião o melhor Presidente da Assembleia da República da democracia portuguesa) desempenharam as suas funções com total imparcialidade e com sentido de Estado. Almeida Santos e Jaime Gama deixaram a militância socialista quando chegaram à posição de segunda figura do Estado português. Infelizmente, Ferro Rodrigues não se compara as seus antecessores socialistas e não reúne as condições mínimas para ser Presidente da Assembleia da República. É mau para ele. Mas é muito mau para a democracia em Portugal.

2. A greve dos sindicatos comunistas num momento decisivo do ano lectivo é miserável. Mostra muito bem o que são os sindicatos da GCTP. Não passam de instrumentos políticos do PCP e usam as greves como estratégia política. A greve de sexta feira faz parte das negociações dos comunistas para o Orçamento do Estado do próximo ano.

O PCP enfrenta dois problemas políticos. O PS está a crescer e aproximar-se da maioria absoluta, e não consegue ultrapassar o Bloco de Esquerda nas sondagens. Pior, começam a recear uma excessiva aproximação entre o PS e o BE. Os comunistas arriscam-se a sair da aventura da geringonça diminuídos e isolados na esquerda. Precisam de voltar a fazer oposição e de usar os sindicatos, sabendo muito bem como Costa valoriza a paz social e a ausência de luta política nas ruas. Comparado com os interesses do PCP, a preparação dos alunos e os cuidados dos doentes não valem nada para a CGTP.

3. Não sei se o governo e próprio Centeno já perceberem bem o que significaria a escolha do ministro das Finanças para presidir ao Eurogrupo. Centeno perdia toda a margem para criticar as políticas decididas pelos ministros das Finanças dos países do Euro. O Presidente do Euro grupo também é o porta voz do grupo. Centeno não teria poder para mudar as políticas do Euro e perderia liberdade para as criticar. Seria o alinhamento total entre Centeno e Schauble. Por mim, gostaria de assistir à preparação do orçamento de 2018, com Centeno à frente do Eurogrupo, e uma extrema esquerda mais combativa em Portugal. Não deixaria de ser interessante.