Passaram, à velocidade da luz, quase seis meses (sim, perto de meio ano) entre a queda do governo até à tomada de posse deste novo elenco e, certo é, que não vamos ficar por aqui pois estão mesmo à nossa frente as eleições dos deputados ao Parlamento Europeu… e quiçá uma nova ronda. Com a consciência que não sou um analista político, mas um cidadão e profissional na área da criatividade e construção de marca, perseguem-me algumas conclusões na construção das insígnias e campanhas partidárias e, claro, do quanto elas (também) afetam os resultados.  E partilho estas ideias precisamente na semana da tomada de posse de um novo Governo para uma honesta “food for thought” sem ser na pressão da boca de urna pois há muito para fazer pelas marcas – sim, marcas – que nos movem a construir um país.

Falando em branding de partidos e as suas campanhas, há sempre um cliché enraizado que os partidos, movimentos e coligações não são marcas “como as outras”, que devem centrar as suas estratégias em especialistas de política e que a “palavra da salvação” vem pela mão de marketeers políticos internacionais que deram o seu toque de Midas noutros mercados, totalmente desfasados da realidade nacional. Estes dois factos são, para mim, inquietantes, pois persistimos em ficar agarrados a estratégias do passado, que em nada preparam os (antigos) partidos para o futuro, enquanto toda uma nova geração em Portugal grita a palavra mudança. Os resultados destas legislativas e as sondagens de intenções de voto no futuro são claras: estão muito mais pulverizados em novos partidos pela mão da nova geração de eleitores, esses grandes ex-abstencionistas.

Numa análise que não fala de amplificação e narrativa – isso deixo à disciplina das Relações Públicas para falar – vejamos o branding, a começar pelos novos partidos. Nomes curtos, incisivos e que despertam a uma ação (como chamamos em marketing call-to-action) fizeram magia nestas eleições. O Chega e o Livre são exemplos disso, embora a sua iconografia não verse a seu (total) favor. Se o Livre, com a sua flor como ícone, desperta-nos para a natureza e sustentabilidade – que é uma tendência, mas que minimiza a ação bem mais abrangente do partido – o ponto de exclamação do Chega potencia (ainda mais) o extremismo que o partido de André Ventura procurou combater nesta campanha. O PAN, embora ilustre modernidade e tenha uma boa sonoridade – também muito relevante na construção de uma marca – padece de alguma falta de compreensão, e a iconografia versa mais sobre Natureza do que Pessoas e Animais, estes últimos, tão relevantes no nosso ritmo cardíaco. Já o Bloco de Esquerda, embora tenha nascido com uma enorme força na sua imagem e nome, esta nova era da perceção e comunicação vai trazer desafios em termos de conceito, pois “Bloco” até poderia gerar uma força de bloqueio positivo nas legislaturas, mas, tendo em conta o atual cenário, a sua marca ilustra impasse e barreira.

Casos menos felizes desta vertente incisiva – e que resultaram numa óbvia ausência de assento parlamentar – foram os partidos com nomes que apelam com termos antiquados (e até bíblicos) como Ergue-te!, que nada dizem para além de uma sonoridade moderna (e que nos lembram TVDE’s) como o VOLT e outros que  conferem pouca credibilidade como o RIR, sigla muito mais reconhecida como um festival de verão ou mesmo gracejo ou troça.

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Mas há um grande alerta vermelho nestes nomes dos partidos emergentes (e alguns enraizados): são marcas que fazem todo o sentido numa campanha e na oposição, mas, chegando a uma liderança, deixam imediatamente de fazer sentido pois são designações muito mais relacionadas com protesto do que com fazedores pelo país. Neste ponto, a exceção feita e talvez o nome e imagem mais feliz – mesmo que não tenha conseguido duplicar os seus deputados e os jovens não estejam totalmente alinhados com o conceito de liberalismo – é a Iniciativa Liberal, um partido que transmite a ideia de uma ação positiva, dinâmica e sempre em movimento pois a palavra “iniciativa” evoca mangas arregaçadas. O seu “i” elástico nas peças gráficas e a cor que ilustra modernismo beneficiam a sua imagem que, espante-se, não foi só criada por “políticos”, até porque a sua equipa fundadora tem reputados marketeers e especialistas em comunicação.

Sobre os “partidos dos regimes”, aqui o caso muda de figura pois é mais complexo e longe de mim a leviandade de colocar em causa o seu nome e património consolidado. Mas sem dúvida, devem apostar numa séria avaliação de imagem, mensagem e iconografia, para tornar mais elucidativo o que cada nome representa. Percebo que estes partidos apontem a mira aos mais velhos – ora não falássemos do segundo país mais envelhecido da Europa – mas o ângulo morto aos millenials (nós) e geração Z, acabará por comprometer a sua sustentabilidade enquanto grandes forças políticas.

Acredito que as equipas que montaram a coligação AD quisessem evocar o país de Sá Carneiro como força motriz da sua campanha, mas, na construção de marca, é também fundamental olhar para todas as peças do xadrez. E os jogadores da comunicação da AD só olharam para a rainha (PSD), o rei (CDS-PP) e a Torre (PPM), descurando o peão ADN, que surpreendeu tudo e todos, alegadamente (não vou ser eu a concluir), por motivos de branding.

Os jovens não sabem e não são do tempo da AD de Sá Carneiro. E até alguns adultos apenas não se moveram ou não se conectaram à política do passado. Não conhecem a história do PS de Mário Soares, não sabem o que quer dizer a sigla CDU e muito menos que esta resulta da união do PCP com o PEV, aliás, nem sequer sabem quem era Álvaro Cunhal. Nem todos cantaram o “Somos como um Rio”, o “Avante Camarada”, a “Internacional Socialista” e o “Prá Frente Portugal”. Nunca disseram “Soares é fixe” ou “Não lhes dês Cavaco!”, nem tão pouco fazem ideia do que é o PêcêTêpêÉmeÉrrePêPê (PCTP/MRPP). Ou seja, a ideia de que o legado dos partidos, intimamente ligado aos seus respetivos nomes, é percecionado por todas as faixas de eleitorado para sempre é errada.

É preciso olhar, avaliar, escutar e arranjar formas de recolocar esse património no imaginário das novas gerações. Enquanto os novos partidos apostam no Youtube e TikTok para explicar tudo e as suas convicções e “short vídeos” – durante muito tempo e não só em fase de campanha – os grandes partidos foram apostar em mensagens do passado e do revivalismo, nalguns casos, com desfibrilador. Isto para além de usar jargões de “Portugal Inteiro” com uma peça gráfica que ilustrava uma bandeira quebrada – algo que nada faz sentido em termos de imagem e que me gritava em cada outdoor ou ecrã, assumindo desde já o meu defeito de profissão.

Trocando tudo isto, não por “miúdos”, mas por “jovens-adultos”, há um longo trabalho que cada marca partidária – repito, marca –deve fazer com urgência. Os partidos podem e devem acordar, como muitos partidos internacionais já o fizeram, ao auscultar os eleitores e redefinir – ou não – os seus posicionamentos de forma mais clara. Porque não há pior sensação de ver, em plena televisão ou em vídeos pulverizados na internet, um discurso nada coerente com a imagem que os rodeia e que lhes serve de pano de fundo.

Nesta semana, marcada pela tomada de posse de um novo governo, que as forças políticas comecem também tomar posse dos seus partidos e, acima de tudo, dos seus eleitores que poderiam estar muito mais próximos a eles. Eu faço, literalmente, votos que assim seja, independentemente do partido ou corrente.