No final do século XX, o jornalismo foi confrontado com uma revolução tecnológica que alterou o ecossistema mediático tradicional. O surgimento e massificação da Web trouxe a plataformização e, com ela, chegaram novos concorrentes – blogues, redes sociais, etc – que acabaram com o exclusivo dos media tradicionais no acesso ao espaço mediático.

Em paralelo, a oferta de informação online criou hábitos de consumo gratuito e a crise económica global levou ao corte de receitas publicitárias. O tradicional modelo económico dos media (publicidade + vendas/assinaturas) deixou de funcionar, obrigando o jornalismo a procurar soluções alternativas, mas sem sucesso.

Atualmente, a televisão resiste, a rádio sobrevive e a imprensa definha. Se nos dois primeiros casos a informação é apenas uma pequena parte da programação (excluímos aqui os media especializados), quando falamos da imprensa (em papel ou online) a situação é mais grave porque se trata de um meio quase exclusivamente informativo.  O jornalismo está mais frágil, menos vigilante em relação ao poder político e, consequência disso, em acelerada perda de credibilidade junto da sociedade.

Sabemos que só os cidadãos devidamente informados têm capacidade para tomar as melhores decisões políticas, por isso o normal funcionamento das democracias está em perigo, e a emergência de movimentos radicais em todo o mundo é a prova disso mesmo.

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Numa situação como esta, o Estado deve ter uma intervenção indireta no sistema e, talvez por isso, no passado dia 8 o Conselho Ministros aprovou uma resolução que cria o #PortugalMediaLab, uma Estrutura de Missão para a Comunicação Social.

Outra iniciativa recente foi a entrega na Assembleia da República de um documento intitulado “Apoios e incentivos do Estado à Comunicação Social” produzido pela ERC.  A proposta apresentada é o resultado de um excelente trabalho, mas considero que deveria ser complementada com mais alguns apoios indiretos que tenho defendido ao longo dos anos.

Uma dessas propostas é a oferta de uma assinatura anual de jornal ou revista de informação geral aos jovens que completem 18 anos. A escolha da publicação ficaria ao critério do portador do voucher “jovens +informados”. A medida poderia ainda ser complementada com a oferta da assinatura de um jornal regional aos jovens residentes em regiões de baixa densidade geográfica.

Uma segunda medida seria a constituição do Fundo de Apoio ao Jornalismo (FAJ) financiado por uma parte dos impostos pagos pelos consumidores sempre que adquiram bens ou serviços relacionados com telecomunicações.

Veja-se o caso dos smartphones: embora criados para comunicação oral, atualmente são usados fundamentalmente para aceder à internet. Considerando que no ano de 2023 foram vendidos em Portugal 2,6 milhões de smartphones no valor de mil milhões de euros, se o Estado prescindisse de 3 pontos percentuais do IVA, o FAJ receberia 30 milhões de euros. Outra alternativa seria criar uma pequena taxa adicional sobre estes produtos, tal como já acontece com as fotocópias. Em compensação, o consumidor receberia a assinatura anual de um jornal.

Para além dos fabricantes de equipamentos, os operadores de telecomunicações (ISP) também deveriam contribuir para este fundo com uma taxa por cada pacote de dados vendido ou renovado. Em 2023 existiam em Portugal 4,6 milhões de subscritores de pacotes de serviços de telecomunicações, pelo que uma taxa anual de dois euros acrescentava imediatamente 9.2 milhões ao fundo.

Outro imposto que poderia apoiar a imprensa, neste caso os jornais regionais, é o IMI. Neste caso seriam as Câmaras Municipais a prescindir de uma parte do imposto a favor do jornalismo. Em 2023, o valor de IMI pago rondou os 148 milhões de euros, pelo que apenas um por cento acrescentaria 1.48 milhões de euros ao fundo.

Por fim, as empresas tecnológicas, que atualmente arrecadam a maior parte das receitas online, como a Alphabet (Google), Meta (Facebook, Instagram, etc), Amazon, etc, deveriam igualmente contribuir com um imposto sobre a sua faturação. Embora muitas deles tenham sede fora de Portugal, há certamente formas de fazer a taxação em Portugal.

No final restaria estabelecer as regras de distribuição do Fundo de Apoio ao Jornalismo pelos media. Esse regulamento deveria ter em conta as audiências, o número de jornalistas na redação, o tipo de contrato e a remuneração média dos profissionais, por exemplo, beneficiando aqueles que mais apostam na qualificação dos seus recursos humanos.

No ano em que se assinalam os 50 anos do 25 de Abril é importante relembrar que a liberdade nunca pode ser dada por adquirida. A emergência de movimentos radicais, e alguns resultados eleitorais recentes, mostram que deixar a formação da opinião pública ao critério das redes sociais é um risco para as democracias. Só um jornalismo forte e livre pode garantir cidadãos informados e capacitados para fazer as melhores escolhas eleitorais, mantendo assim o normal funcionamento das democracias. Por isso é essencial que o Estado crie mecanismos de apoio permanente e indiretos que não criem dependências em relação aos poderes políticos vigentes.