1. “Não ser seduzido pelo máximo, mas deixar-se abarcar pelo mínimo… isso é que é divino!”.

Todas as instituições, organizações, grupos, equipas, carreiras, planos, expectativas… apontam sempre para o topo; para que tudo seja imenso, maior, espetacular. A grande marca do escutismo é, paradoxalmente, a simplicidade da sua proposta: “deixar o mundo um pouco melhor do que o encontrámos”.

Baden-Powell (BP) nasceu em Londres, a 22 de fevereiro de 1857 e faleceu com 83 anos no Quénia , mais precisamente em Nieri, no dia 8 de janeiro de 1941. O seu pai era o reverendo Baden Powell, professor catedrático em Oxford e sua mãe era filha do almirante inglês W. T. Smyth. Quando tinha apenas 3 anos de idade perdeu o pai, ficando a sua mãe com sete filhos para criar. B-P foi um tenente-general do Exército Britânico, e foi o fundador do movimento escutista.

De acordo com a sua formação e trajectória não se pode considerar BP como um pedagogo, um filósofo, e muito menos como um teórico da educação. Que segredo, então, encerra a proposta educativa do escutismo, a qual mobiliza, na actualidade, mais de 30 milhões de jovens em todo o mundo?

Há quem descreva BP com alguém dotado de grande capacidade de observação, muito intuitivo, sensível e pragmático. E o mais da sua proposta educativa seria, então, o ser, precisamente, espontânea, clara, óbvia, imediata, intuitiva… e não propriamente o produto de um qualquer complexo corpo teórico de conhecimentos,  bem elaborado e fundamentado pedagogicamente. Por outro lado, teve a lucidez e a capacidade para se dirigir aos jovens da sua época e com eles directamente contactar. Tudo isto potenciou, finalmente, o nascimento espontâneo de um grande movimento tão empolgante quanto imparável, até aos nossos dias.

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Alguém nos deu este Movimento!

2. A base pedagógica do escutismo é a vida em Patrulha, o denominado “Sistema de Patrulhas”. Patrulha não quer referir-se a qualquer tipo de colectivismo; isso seria matar o pessoal dando primazia ao individual, ao “anónimo” e impessoal, qual formiga no formigueiro. Patrulha quer dizer que o pessoal é valorizado, assumido e plenificado no seio de um grupo especial que partilha um ideal comum! O processo de construção da patrulha nunca está terminado, mas quando ela começa a ficar forte e coesa, há como que um poder e um espírito especial que circula entre os seus elementos e é como o ar que se respira… A natureza comunitária que caracteriza a patrulha ajuda os seus elementos a perceber que a plenitude da sua realização pessoal não está encerrada dentro de si próprios, mas depende da qualidade das relações amorosas que estabelecerem entre si.

Nós fomos talhados para a comunhão e, por isso, somos muito mais do que a soma das partes! E por isso BP ensinou-nos que a Patrulha é muito mais do que a soma das partes. Sim, BP ensinou-nos que a Patrulha é muito mais do que a… Patrulha!

Anda, desafia-nos BP; leva a tua Patrulha e quando chegares a campo, levanta abrigo, monta acampamento… e dança! Dançar ajuda-nos a vencer o individualismo, o calculismo, os raciocínios…

A vida em campo traz mistério, a vida em campo é sempre um acontecimento!

Anda, continua BP, leva a tua Patrulha e pergunta pelo sítio das árvores; as árvores sabem coisas, as árvores sabem do cair das folhas, sabem da chegada tardia das águas… Leva a tua patrulha e faz-te sentir em casa, faz-te sentir da terra; leva-te a sério! Leva a tua Patrulha e põe-te a chegar ao meio dos campos; os campos não são vazios, são habitados; leva a tua patrulha e demora-te!

Alguém nos deu a Patrulha!

3. O escutismo, hoje, diz-nos que a vida é séria, a vida é muito séria!

BP ensinou-nos que o que falamos e o que fazemos, o que está dentro e o que está fora, o céu e a terra, o ideal e a justiça, as férias, o tempo, as escolhas… e Deus; que todas estas coisas, têm ligação entre si.

BP também nos diz que o escutismo é para todos, mas… não por qualquer édito ou “decreto”, não por qualquer regulamentação que vem de cima para baixo, de tipo  administrativo ou burocrático; é preciso compromisso, dedicação, mudança de vida!

O método de BP propõe-nos precisamente o contrário, ou seja: o que muda o coração de um, é o que pode mudar o coração de outros; o método de BP diz-nos que o escutismo pode chegar a todos através de muitos… mas, esses muitos, começam por ser os poucos que incansavelmente se juntam na sede, nas reuniões, nos acampamentos, na missão, no ideal comum. Os “poucos que aqui estão” levam, então, o Lenço, a Promessa e o Ideal Comum… a muitos; e esses muitos é que o levam a todos.

Serão então “poucos”, com grande fidelidade ao ideal, muito empenhados e apaixonados … que o levam aos outros!

Alguém nos deu este método!

4. “O homem de pouco vale, se não acreditar em Deus e obedecer às suas leis. Por isso todo o escuteiro deve ter uma religião” (BP).

BP relembra-nos que o Homem é, estruturalmente, um ser religioso. Isto é, um ser aberto à transcendência, aberto a algo que vai para além dele, que o ultrapassa. Não podemos, por isso, desvalorizar e rejeitar o sentido transcendente da nossa existência, reduzindo todas as nossas esperanças humanas a este nosso frágil e incompleto mundo dos Homens! No fundo, seria achar que a Promessa Escuta é uma mera fórmula a ser repetida numa qualquer cerimónia desprovida de coisas sagradas, sentidas, vividas… desprovida de mística.

BP diz  aos jovens de hoje para se apegarem à sua vocação espiritual e intelectual. Não cedam à pressão de um mundo que neles quer matar a mística, o espírito, a fé… à força de os torturar com problemas materiais, tecnológicos, financeiros, de afirmação pessoal, de habitação, de carreira, de futuro…

BP diz aos jovens para acreditarem num mundo melhor,  que podem deixar o mundo um pouco melhor do que o encontraram. Mas BP recorda-nos que esta mudança é, sobretudo, interior e tem de começar por nós próprios! Tudo depende de vós, meus escutas… disse-nos BP.

O nível de coragem da pessoa em geral tem diminuído ao longo destas últimas décadas. O problema de se descredibilizar uma certa vida de “heroísmo” é que o mundo actual convida-nos a um estado de perpétuo comodismo, de aburguesamento, e de enfraquecimento da vida interior. É um mundo que nos alicia a não crescermos, a não termos espírito crítico, a não sermos mais do que meros consumidores… prolongando artificial e eternamente a infância.

É preciso lutar contra os clichés, contra os slogans, contra a manipulação encapotada e a falsa misericórdia. As novas gerações de escutas têm um papel importante a desempenhar.

Alguém nos relembrou da Fé!

5. Por outro lado BP diz-nos que precisamos de líderes, de dirigentes, de chefes escutas; não de tiranos, não de autoritários, mas precisamos de líderes com autoridade. E alguém com autoridade é alguém firme, lúcido e clarividente; alguém com autoridade é alguém que tem um ideal, é alguém que constrói coesão, que constrói Comunidade, constrói Agrupamento, constrói Patrulha.

As comunidades vivem da verdade e morrem da mentira, dizia o sábio…

Precisamos de líderes com autoridade, precisamos de líderes que falem com coragem, precisamos de líderes que falem a Verdade!

A nossa coragem como líderes, não é, contudo, uma descrição de nós próprios, das nossas realizações, dos nossos títulos e medalhas… Nós não estamos na Verdade porque fazemos coisas “espectaculares”, porque fazemos muito voluntariado, separamos o lixo e somos amigos dos animais. Não é o fazer muitas coisas… que, por si só, nos traz a paz e, sobretudo, a “Verdade”. Pois, tal… poderia até, porventura, dar-nos uma ideia muito rica de nós próprios e constituir um entrave que nos mantém fechados em relação à “Verdade”, em relação à Promessa escuta que fizemos!

Precisamos de líderes que se recusem a aceitar esta cultura anti cristã… secularizada mas perfumada, dissimulada mas alegre, cotidiana; que se organiza na cultura, na escola, na universidade, na política, na média, na arte e, pasme-se, dentro da própria igreja!

Precisamos de líderes que se recusem a aceitar este veneno do relativismo contemporâneo, esta teia poluída de argumentos, de razões, de murmurações…

Precisamos de líderes que não sejam uma mera personagem psicológica, anímica ou moralista; não se é bom líder por causa da actuação psicológica.

Alguém nos deu o “Guia de Patrulha”!

Às vezes, olhamos para trás e pensamos: devíamos ter feito mais; devíamos ter cantado mais, chorado mais, sorrido mais, acampado mais; devíamos ter amado mais!
Por isso, nós temos um método imbatível, poderoso; temos um método para todas as crises que se chama: “Façamos tudo como BP nos disse”!

Alguém nos deu tudo isto!

Obrigado Baden Powell!

Nota: este artigo resulta de uma iniciativa individual e o seu conteúdo não vincula qualquer posição intitucional do CNE