Desta vez é diferente, pelo menos na abordagem das autoridades norte-americanas ao problema do colapso de dois bancos em menos de três dias. A situação está a ser enfrentada pela administração Biden assegurando o dinheiro dos depositantes na sua totalidade, não salvando os accionistas nem os obrigacionistas dos bancos e tentando vender os activos das instituições. Um modelo pelo menos em parte semelhante ao que foi seguido em Portugal com o BES, com Washington a assegurar que a conta não irá para os contribuintes, mas será paga pelos bancos do sistema. Podemos responsabilizar a incompetência da gestão dos bancos que caíram, mas estas são as primeiras vítimas da subida rápida das taxas de juro. E o medo de novos casos pode levar a Reserva Federal a ser mais prudente nas próximas subidas de juros, como já estão a antecipar os analistas.

Foram dois os bancos que colapsaram. Tudo começa com o Silicon Valley Bank (SVB) seguindo-se, e durante o fim de semana, o Signature, já um dano gerado pela falta de confiança. O SVB é um banco da Califórnia que tem basicamente como clientes empresas tecnológicas e das ciências da vida. Aparentemente as startups tecnológicas têm feito mais levantamentos do que o habitual, reflexo de necessidades de recursos financeiros que vão faltando noutras fontes, na sequência da subida das taxas de juro.

O SVB tinha razões para se considerar sólido. Os depósitos dos seus clientes estavam basicamente aplicados no que se pode considerar um ativo superseguro, os títulos de dívida norte-americana, mas a taxa de juro fixa. Problema: não se terão protegido devidamente do risco de subida de taxas de juro, que foi muito rápida. Quando os levantamentos começam a ser significativos têm de vender esses títulos com perdas – as obrigações a taxa de juro fixa, da era dos juros baixos, estão agora a desvalorizar. Tentam ainda um aumento de capital que fracassa e assim se instala o pânico. (O Signature é um caso de contágio de um banco muito exposto às criptomoedas).

Como refere o Wall Street Journal, parece que estamos a ver a história repetir-se quando se estão a completar 15 anos do primeiro resgate da crise de 2008, o Bear Stearns, ainda antes de se ter deixado cair o Lehman Brothers. Mas será que é assim?

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Para já parece que não, mas todos aprendemos com dor, na crise que se arrastou de 2007 a 2014, que com os bancos nunca ninguém sabe nem pode garantir nada. Sendo o seu negócio a confiança, quando ela falha tudo falha. Como os banqueiros gostam de dizer, é a liquidez que mata um banco, não a solvabilidade (é verdade que não foi assim com o BES, mas tal só prova a importância da confiança – todos continuavam a confiar apesar de o banco estar falido). E foi a liquidez que deitou ao chão o SVB.

A memória ainda viva da grande crise financeira pode contribuir para que não se cometam os mesmos erros. Sim, salvar empresas constitui sempre um incentivo à irresponsabilidade dos seus donos. E salvar depositantes é igualmente um incentivo à sua falta de cuidado na escolha das instituições a que entregam o seu dinheiro, reforçada neste caso porque alguns desvalorizam o papel do regulador em particular e do Estado em geral. Mas se esse resgate for feito com perdas para os donos dos bancos, como vai acontecer, estamos a minimizar os efeitos perversos e, especialmente, a reduzir a probabilidade de uma crise financeira com efeitos muito mais graves.

Existem condições para que desta vez seja diferente. Para que desta vez não sejamos apanhados por um ‘tsunami’ financeiro. Mas os riscos estão lá. O passado tem mostrado que sempre que os bancos centrais iniciam subidas nas taxas de juro, desencadeiam-se tempestades financeiras. Ou, parafraseando Warren Buffett, a maré baixa expõe quem está a nadar sem calções. Esperemos que o pânico se dissipe e que as lições da grande crise tenham ensinado os banqueiros e nadar bastante protegidos. O tempo o dirá.