É indiscutível que neste espaço critico, amiúde, tudo o que me parece exasperante atraso civilizacional do nosso país. Ora, tais reparos baseiam-me, por norma, na comparação fácil entre o que se passa dentro das nossas fronteiras e naqueles países que nos habituámos a ver como mais desenvolvidos. Pelo que notícias como a de que o estado inglês pressionou empresas de media para cancelarem o humorista e actor britânico, Russell Brand, com base em alegados crimes, estragam um bocado a dinâmica desta minha coluna.

E isto é gravíssimo, estragarem-me a dinâmica desta crónica. Mas também o caso de Russell Brand. Senão vejam. Uma comissão parlamentar britânica tentou forçar várias plataformas de media a “desmonetizar” os conteúdos produzidos pelo comediante. Ou seja, o governo inglês procurou obrigar empresas privadas a pararem de fazer negócios com um cidadão privado, por haver alegações de que esse indivíduo cometeu crimes. Alegações. Não há sequer uma acusação. Muito menos um processo a decorrer em tribunal. Eventual condenação, essa, a existir um dia, estará a anos-luz.

Isto é um estado a interferir directamente nas relações profissionais entre privados, sem qualquer fundamento legal, com vista a destruir, no mínimo, a vida profissional de um seu cidadão. E isto não é o estado da Venezuela. É mesmo o inglês. E isto é mesmo desconcertante.

Tentarei ilustrar o problema em termos que nos sejam mais próximos. Imagine que era produtor de conservas de frutas. E que, de repente, um militante do PAN acusava-o de, há 15 anos, ter colhido dois pêssegos com uma brusquidão que induziu profundo sofrimento nos frutos. Alegação sem qualquer fundamento, claro, pois se você sempre foi especialmente cuidadoso no trato do Prunus persica. Ainda assim, e sem nenhuma acusação formada, o governo proibia qualquer espaço comercial de lhe pagar as compotas que entretanto vendesse. Deixando-lhe apenas a possibilidade de trocar as suas compotas em quintais e patamares de escadas. E oferecendo-lhe assim a possibilidade de falir em quinze dias. É mais ou menos isto que está a acontecer ao Russell Brand. Aliás, amanhã, para encerrar a reunião de condomínio do prédio, ele vem cá fazer um stand up.

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Já que falei do PAN, merece referência o acordo de incidência parlamentar feito na Madeira entre o partido e a coligação PSD/CDS. O líder do governo regional, Miguel Albuquerque, fez assim uma jogada de três pontos: na prática é como se tivesse uma maioria absoluta; ao dispensar um acordo com a Iniciativa Liberal livra-se de ter de negociar assuntos realmente importantes; em contrapartida, ao estabelecer esta parceria, o PAN sabe que, com este interlocutor, só terá mesmo de falar de assuntos de lana-caprina.

E quase ao mesmo tempo que, na Madeira, os activistas do PAN pintavam a manta em jeito de celebração, no continente um trio de activistas pelo clima tentava pintar a cara do Ministro do Ambiente, Duarte Cordeiro. Tentava e conseguia. Confesso que fiquei surpreendido, quer com a potência, quer com a precisão com que as jovens lançaram aqueles projécteis com tinta. Depois é que me lembrei. Claro, isto são jovens que preconizam um estilo de vida que, a ser adoptado, nos faria voltar à Idade da Pedra para a semana. Isto é malta que anda a treinar o uso de fundas para arremessar calhaus a primitivos simpatizantes do heteropatriarcado.

Quanto à tinta na cara do ministro Duarte Cordeiro, nada que um pouco de decapante e uma espátula não resolvessem. No fundo, a receita tradicional para tirar tinta de uma cara de pau.