É motivo de censura generalizada que depois de vários anos a aprender coisas que só em Portugal se ensinam cada vez mais pessoas se sintam inclinadas a ir pregar para outras freguesias. O ensino custa muito dinheiro; e esse dinheiro, que vem em parte de um milhão de portugueses, é a seguir usado para dar de comer a outro milhão de portugueses: os que ensinam. Famílias inteiras correm pois o risco de morrer à fome; e Portugal de languescer como as cassetes e as carvoarias.

O problema requer uma solução; e tem preocupado aqueles cujo talento mais permanente é o de as encontrar. Uma abordagem recente mostra engenho: consiste em imaginar um modo para as pessoas com quem se gastou tanto dinheiro não se sentirem tentadas por outras latitudes. Foi alvitrada a ideia de devolver a quem tanto aprendeu o dinheiro que pagou por esse privilégio. O incentivo porém não pareceu a outros promissor, por razões técnicas: como quem pagou pagou muito pouco daquilo que a sua aprendizagem realmente custou, receberá muito pouco; e por isso o voltar a encontrar-se com o seu anterior dinheiro não constituirá uma tentação capaz.

A solução só pode ser penal. O quadro internacional em que nos movemos impede porém que se confisquem certos passaportes ou introduzam controles fronteiriços de modo permanente. Não é difícil imaginar os custos reputacionais que sobreviriam se pensássemos em impedir os nossos jovens de mudar de país; e sem falar nas dificuldades logísticas. Um diplomado é virtualmente indistinguível de um iletrado, pelo menos na perspectiva de um guarda fronteiriço; e dada a necessidade de o demonstrar, os instruídos agiriam sem dificuldade durante as inspecções como perfeitos iletrados.

Devemos assim pensar noutros sistemas de fixação. Um, que provou já noutros países, consiste em requerer um passe especial para se sair da freguesia de nascimento. Teria enormes vantagens; e inclinaria as pessoas a habituar-se aos vizinhos e aos parentes. Mas o sistema iria custar muito dinheiro. Uma alternativa menos onerosa seria amarrar as pessoas, com cordas, a um sítio qualquer. No entanto, quem é letrado também terá aprendido na escola a lidar com nós. Para cada Górdio haveria decerto um Alexandre escolarizado, que se conseguiria desenvencilhar. Amarrar as pessoas com cordas não é uma boa alternativa.

Resta uma forma de fixação mais drástica, embora obsoleta. Referimo-nos à crucifixão, que tanta reputação teve na Antiguidade tardia. Naturalmente está fora de questão crucificar todos aqueles que exprimissem vontade de sair de Portugal. O processo requereria quantidades de madeira cuja obtenção poderia pôr em risco o décimo-terceiro objectivo para o desenvolvimento sustentável das Nações Unidas. Como os efeitos dissuasores da pena provaram relativamente bem no passado, bastaria no entanto crucificar, e desse modo fixar em Portugal aos olhos de todos, uma quantidade pequena de pessoas (por exemplo uma por aeroporto ou por estação de camionetas).

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