É incontornável a necessidade e, sobretudo, a urgência da transição para a mobilidade elétrica, mas é também indiscutível os vários passos positivos que Portugal tem vindo a dar nesse sentido, através da implementação de várias medidas sob a forma de investimentos e incentivos que visam acelerar a transição de carros a gasolina e gasóleo para veículos elétricos.

Um dos exemplos de incentivos é o programa de 10 milhões de euros lançado pelo Estado para a compra de veículos elétricos através do Fundo Ambiental, permitindo aos particulares receber um apoio de 4 mil euros e às empresas 6 mil euros na aquisição de um veículo ligeiro de passageiros ou de mercadorias elétricas. Importa salientar que, face à enorme procura dos portugueses, a dotação dos 10 milhões foi rapidamente superada e ultrapassou a barreira dos 16 milhões.

Este forte apetite dos portugueses pela compra de veículos elétricos não deverá ficar por aqui, até porque a Direção-Geral de Energia e Geologia (DGEG) prevê que Portugal passe dos 64 mil veículos elétricos em 2022 para 115 mil em 2024, atingindo a fasquia dos 550 mil em 2030. O cenário de evolução não se limita apenas a Portugal, uma vez que a Agência Internacional de Energia (IEA) estima que em 2030 existam 350 milhões de carros elétricos a circular nas estradas, face aos 16,5 milhões em 2021.

Com os incentivos à compra de carros elétricos a alimentar e a impulsionar o crescimento do número destes veículos ano após ano, torna-se por demais evidente a oferta insustentável atual que existe de rede de pontos de carregamento. É necessário e urgente que o crescimento da aquisição de veículos elétricos seja igualmente acompanhado em paralelo com a instalação de pontos de carregamento em todo o território nacional, para que exista uma democratização do acesso a pontos de carregamento em todo o país.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

É certo que o Estado implementou o Decreto-Lei n.º 101-D/2020 que determina a obrigatoriedade de criar pelo menos 2 pontos de carregamento para veículos elétricos em todos os edifícios de comércio e serviços com mais de 20 lugares de estacionamento, até 31 de dezembro de 2024. Contudo, na minha opinião, esta medida tem uma falha, uma vez que não diferencia estabelecimentos com 20 lugares daqueles com 200 lugares, e deveria estar escalonada.

Neste sentido, o foco deverá estar na infraestrutura — em paralelo ao incentivo à compra de veículos elétricos — ao apostar no crescimento da rede de pontos de carregamento em todo o país para que a transição para a mobilidade elétrica seja, de facto, real e acessível a todos. Esta aposta serve não só para quem já possui um veículo elétrico, que assim vê crescer o número de pontos de carregamento, mas serve sobretudo para os futuros potenciais compradores de veículos elétricos. O crescimento da rede precisa acompanhar o crescimento da frota de veículos elétricos existentes no nosso país, além do crescimento esperado para os próximos anos.

Na prática, é o efeito bola de neve. Um cidadão que tenha possibilidade e disponibilidade financeiras para comprar um veículo elétrico, mas que está na dúvida em fazê-lo, não necessita apenas de apoios ou incentivos à compra, precisa sobretudo que a aposta seja feita na infraestrutura, ou seja na rede de pontos de carregamento, para que fique convencido de que terá todas as condições necessárias para circular e avance com a aquisição. Para quem já possui um veículo elétrico, é a confirmação de que fez a escolha mais acertada e dispõe de uma rede ainda mais reforçada.

Se queremos assistir a uma segunda vaga de utilizadores de veículos elétricos – porque até agora foram muito provavelmente early-adopters – há dois ingredientes que são essenciais: veículos elétricos mais baratos e adequados ao uso urbano (que os fabricantes automóveis já estão ativamente a produzir e a vender) e uma rede de carregamento que permita a um utilizador de ICE (veículos com motor de combustão interna) ter a confiança na mudança para um veículo elétrico.

A somar a tudo isto, é igualmente essencial que a implementação de mais pontos de carregamento seja executada nos sítios e locais certos. Ou seja, que a implementação não se cinja apenas às grandes cidades, mas também às zonas denominadas de dormitórios onde existem, igualmente, espaços de retalho e edifícios de comércio e serviços. Isto, para que os condutores possam incluir o carregamento dos seus carros elétricos num ato tão simples do seu dia a dia, sem qualquer tipo de complexidade, da mesma forma que hoje em dia já carregamos o nosso smartphone sempre que necessário.

Acredito que o caminho para a transição e para a confirmação da mobilidade elétrica deve passar pelo foco na infraestrutura, em paralelo ao incentivo à compra de veículos elétricos e incluindo ainda parcerias entre o setor público e o privado, para que todos possamos contribuir ativamente para uma sociedade e um futuro mais sustentáveis.