1 Mamadou Ba decidiu numa intervenção recente parafrasear Franz Fanon e apelar à morte do homem branco, colonialista e racista. Mesmo os regimes mais comprometidos com a liberdade de expressão estabelecem alguns limites, e um deles é o da apologia da violência. Isto é ainda mais assim nos tempos que correm, em que extremistas de extrema-direita ou jihadistas se têm encarregado de traduzir palavras radicais em atos violentos. Basta pensar que há poucas semanas um professor francês (e homem branco) foi assassinado por dar uma aula sobre a liberdade de expressão. Mamadou Ba e os seus seguidores defendem que falar de “matar o homem branco” é só uma metáfora, uma inocente citação. Isto é tanto mais paradoxal quando – independentemente do que defendeu Fanon na prática – eles têm sido os grandes defensores de que as palavras são factos políticos, de que a violência verbal é uma forma inaceitável de violência real que não pode ser tolerada com o argumento da liberdade de expressão. Se esta frase não encaixa perfeitamente na linguagem de ódio racial que denunciam, não vejo o que encaixe.
O segundo problema com este argumento, é que Mamadou Ba é essencialmente um ativista. É, portanto, normal, ler, nas suas palavras, por regra, um apelo à ação. E, portanto, perfeitamente compreensível haver quem tenha vindo, no espaço público, pedir a Mamadou Ba explicações. Os seus defensores argumentam que basta olhar para o contexto. E eu, como historiador, sou sensível por formação profissional ao argumento da importância do contexto.
O que dizer, então, destes dizeres, tendo em conta o seu contexto? Mamadou Ba parece ter visto na citação de Franz Fanon a melhor forma de atacar radicalmente o grande mal do eurocentrismo. Ora, se era esse o seu objetivo, falhou duplamente. Falhou, desde logo, porque uma frase tão chocante apagou, naturalmente, tudo o resto que disse. (E custa a crer que um ator mediático tão experiente ignorasse a polémica previsível.) Mas, sobretudo, falhou porque a ideologia do antirracismo transfigurado em antiocidentalismo radical propagada por Mamadou Ba, de que essa citação de Fanon é uma perfeita expressão, é ela própria um exemplo acabado de eurocentrismo. Esta teoria reduz todos os males do mundo, nomeadamente o racismo, ao, aparentemente, omnipotente e omnipresente, colonialismo europeu. Mais eurocentrismo do que isso é impossível.
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