O tema “Grécia” voltou em peso ao plenário do Parlamento esta quarta-feira, com o PSD e o PS a escolherem as questões europeias para marcar as suas declarações políticas. Mas se o PSD pegou no “caso grego” para, por comparação, lembrar como Portugal é um bom exemplo de saída da crise, o PS, através de uma intervenção peculiar do deputado Sérgio Sousa Pinto, defendeu que a Alemanha está a “humilhar” a Grécia por falta de obediência e procurou dirigir-se aos “caros amigos gregos” para mostrar como Portugal “andou mais de 20 anos para trás”. Ou seja, para dizer que não, não é um bom exemplo.

Acusando o Governo português de ter sido mobilizado pelos “atuais donos da Europa” para fazer “o trabalho sujo” de tentar humilhar e encurralar a Grécia no último Eurogrupo, o deputado e coordenador dos socialistas para os Negócios Estrangeiros, tomou a palavra no Parlamento para dar início a um aceso debate sobre a postura de Portugal face à situação da Grécia.

“O Syriza não é obviamente o meu partido, mas respeito a dignidade e o orgulho de quem não se concebe a si próprio como governador de um protetorado: os gregos nunca ouvirão de Varoufakis o que os portugueses já tiveram de ouvir, incrédulos, do ministro Paulo Portas“, começou por atirar o socialista Sérgio Sousa Pinto, entre fortes aplausos da bancada socialistas, para depois dirigir algumas palavras ao próprio povo grego, caso o estivesse a ouvir. Disse Sousa Pinto que, se pudesse falar aos gregos do “sucesso português que o ministro alemão Wolfgang Schauble tanto invoca com o objetivo de os humilhar e isolar”, diria algo como: Portugal não está melhor, andou décadas para trás em valores do PIB, do emprego, do investimento, da emigração e da dívida pública. Por outras palavras, que a austeridade não resultou e que a “austeridade expansionista é coisa que não existe”.

Para Sérgio Sousa Pinto, o reconhecimento das instituições europeias de que o problema grego é “parte de um problema europeu mais vasto”, dado nomeadamente pelas recentes declarações de Jean-Claude Juncker, é uma “péssima notícia para o Governo Passos/Portas” por ser o “reconhecimento da estupidez intrínseca da austeridade fanática e descontrolada, que é indiferente aos seus efeitos contraproducentes”.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Os vencidos, segundo os socialistas, são por isso os portugueses e os povos que estiveram sob resgate financeiro da troika; os humilhados estão a ser os gregos, por não obedecerem à Alemanha; e o vencedor deverá ser a Europa e “o seu ideal de paz, justiça e prosperidade partilhada”. “A direita não percebe que fazer ajoelhar a Grécia é um crime contra a ideia europeia e ofende a nossa dignidade nacional portuguesa”, rematou Sousa Pinto.

A intervenção do deputado socialista, “enfática e retórica” como classificou o centrista Telmo Correia, no entanto, não caiu bem às bancadas à direita. Para o deputado do CDS, a postura do PS face aos acontecimentos recentes na Grécia e no Eurogrupo, baralha os rótulos: “O senhor deputado parece meio baralhado, afinal está do lado do Syriza ou do Pasok [Partido Socialista grego]?”, começou por perguntar Telmo Correia, lembrando o comunicado de ontem dos socialistas gregos que falava de “desilusão” e de caminho da Grécia para um terceiro resgate. “Sem gravata e com as fraldas de fora o senhor deputado dava um Syriza razoável”, atirou o deputado centrista, enfurecendo a bancada do PS.

A resposta não tardou, e fez subir o tom. Depois de já ter classificado o Bloco de Esquerda de “primo afastado do Syriza” e os partidos da maioria de “vassalos portugueses da Alemanha”, Sérgio Sousa Pinto afirmou que o PS “sabe onde está”, que se mantém “profundamente europeísta”, mas que o mesmo não se pode dizer do CDS. “O CDS só sabe estar no poder, onde sempre esteve, seja ele qual for”, atirou o socialista, acrescentando que, “ainda por cima”, o PSD “desrespeita e mal trata [o parceiro de coligação] em todas as oportunidades”.

“Os portugueses venceram a crise”

Antes, já a deputada do PSD Carla Marques Mendes tinha levado a Grécia para o debate, para sublinhar o “agrado” com que a maioria encarou o acordo alcançado no Eurogrupo. Para o PSD, o compromisso assinado pela Grécia para continuar a receber o apoio financeiro da troika mostra que os gregos “propõem-se a fazer hoje aquilo que Portugal já fez nos últimos anos”. Ou seja, que o caso grego “reforça e valoriza o exemplo notável de Portugal e dos portugueses”.

E para mostrar que o exemplo português é um caso de sucesso, a deputada social-democrata sublinhou um conjunto de “factos” que provam que Portugal está hoje melhor do que estava no pré-troika: desemprego a reduzir, salários recuperados, rendimentos e pensões repostas, empréstimos reembolsados, exportações a subir, disse. “Invocar o caso da Grécia e esquecer o exemplo português é uma falta de respeito pelo esforço e pelo mérito dos portugueses”, afirmou Carla Marques Mendes, sublinhando que, ao contrário da Grécia, os “portugueses venceram a crise”.

Ora, para o PSD, os vencedores são por isso os portugueses; enquanto os vencidos são, neste caso, os gregos, que “já vão no segundo resgate, têm os juros da dívida a subir e ninguém sabe o que o futuro lhes reserva”.

Quem são os humilhados? Para o PSD, não há nesta história qualquer povo humilhado. Personagem que o PS, no entanto, se apressou a acrescentar. Na resposta à intervenção da deputada Carla Marques Mendes, o deputado Eduardo Cabrita apressou-se a apontar o dedo à “imagem de um país humilhado” que, segundo o PS, tem sido transmitida nas negociações do Eurogrupo e tem sido repercutida na imprensa internacional ao longo da última semana, nomeadamente através da figura da ministra das Finanças – “exibida lá fora como uma mascote” -, ou da figura do Governo – “representado com um verdadeiro talibã da austeridade”.