Um projeto que junta mais de 100 investigadores identificou duas regiões no material genético associadas com transtornos mentais graves (major depressive disorder, MDD) em mulheres chinesas, especificamente do grupo nativo Han. O artigo foi publicado esta quarta-feira na revista Nature, mas os investigadores alertam que não conseguiram comparar os resultados com os do mega-estudo europeu Psychiatric Genomics Consortium (PGC).

Uma das regiões identificadas pode estar relacionada com o funcionamento das mitocôndrias – que tem um papel importante nas reações energéticas das células -, mas mais estudos têm de ser feitos neste sentido.

Apesar de admitir que este é um bom início para a identificação de potenciais alvos para o tratamento dos transtornos mentais graves, Patrick Sullivan, do Departamento de Genética e Psiquiatria da Universidade da Carolina do Norte, num comentário também publicado na Nature, considera que algumas questões não foram respondidas: se esta amostra era mais homogénea que as anteriores ou se a hereditariedade era maior do que a média, por exemplo.

A heterogeneidade de causas e manifestações levou os investigadores do consórcio Converge (China Oxford and VCU Experimental Research on Genetic Epidemiology) a estudarem o genoma de um grupo bem definido de pessoas – 5.303 mulheres chinesas Han que tenham tido dois ou mais episódios de MDD, mais 5.337 usadas como grupo de controlo -, em vez de um grupo mais generalizado como normalmente é feito.

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No comentário, Patrick Sullivan acrescenta ainda que, por não haver associação entre as regiões identificadas e os estudos efetuados com europeus (Psychiatric Genomics Consortium), estas regiões serão provavelmente específicas de mulheres Han que tiveram episódios severos.

O consórcio Converge junta cientistas da Universidade de Oxford (no Reino Unido), do Hospital Hua Shan da Universidade Fudan (na China) e da Universidade Virginia Commonwealth (nos Estados Unidos). O projeto de cinco anos foi financiado pelo Welcome Trust em 1,4 milhões de libras (cerca de 1,99 milhões de euros).

20% da população portuguesa sofre de depressão

Para além da genética, a depressão e os transtornos mentais em geral podem ser causados por diversos fatores, como a perda de alguém próximo, problemas no trabalho ou com a família, uma catástrofe, stress ou ansiedade, e podem manifestar-se de formas muito distintas, o que não tem facilitado o trabalho dos investigadores na identificação dos genes associados a este tipo de doenças.

Combater a depressão vai, no entanto, além da identificação dos genes que lhe podem estar associados, já que a própria definição de transtorno mental grave é complicada, lembra Patrick Sullivan. A tristeza não é sinónimo de depressão e é até normal sentirmo-nos tristes em determinados momentos da nossa vida. Mas quando a isso se juntam problemas em dormir, falta de apetite ou tendências suicidas, a situação é mais grave. A verdade é que não existe nenhum teste de laboratório altamente preciso que nos permita distinguir a depressão profunda do estado de tristeza, ou seja, quando se identificarem os marcadores genéticos, a doença poderá ser mais facilmente diagnosticada.

Em Portugal, segundo o Portal da Saúde, 20% da população sofre de depressão, sendo “a principal causa de incapacidades e a segunda causa de perda de anos de vida saudáveis entre as 107 doenças e problemas de saúde mais relevantes”. A depressão é um dos principais problemas de saúde pública em Portugal e os dados no mundo também não são mais animadores – “uma em cada quatro pessoas em todo o mundo sofre, sofreu ou vai sofrer de depressão“, refere a mesma fonte.

Artigo atualizado às 11 horas de dia 16 de julho.