A mobilidade suave – deslocações diárias em bicicleta e bicicleta elétrica – ainda diz pouco aos portugueses, com cerca de 1% dos portugueses a utilizar estes veículos para se deslocar diariamente, mas o Governo quer mudar estes números. Para isso, o Ministério do Ambiente vai começar pelas universidades, emprestando bicicletas a alunos do ensino superior que as devem utilizar como principal meio de deslocação para estudar, mas também para o resto do seu dia-a-dia.
O projeto, que já está a ser preparado pelo Ministério do Ambiente desde o ano passado – e que ainda foi lançado pelo anterior Governo -, chama-se U Bike, conta com a participação de 17 universidades de Norte a Sul do país e vai ainda englobar a criação de estacionamento só para bicicletas nas instituições de ensino superior. “Com este projeto pretendemos abranger mais de 200 mil alunos e é uma ação emblemática, de forma a ir de encontro à comunidade mais jovem“, diz José Mendes, secretário de Estado Adjunto e do Ambiente, ao Observador. A ideia é distribuir mais de três mil bicicletas – mais de mil serão elétricas – entre a população universitária de modo a promover a utilização deste veículo como meio de transporte principal, esperando que este hábito se mantenha durante a vida ativa.
A Universidade de Aveiro, uma das instituições que vai participar neste projeto, quer “dar resposta a um desígnio” da instituição que é a criação de um Low Carbon Campus, que contribua para uma descarbonização sustentada dos padrões de deslocação em toda a região de Aveiro, segundo resposta enviada por esta universidade ao Observador. Assim, em Aveiro haverá 239 bicicletas para emprestar aos alunos, das quais 142 serão convencionais e 97 elétricas. As bicicletas vão ser atribuídas em regime de aluguer de longa-duração e coordenados pelos serviços de Ação Social da universidade. Para além das bicicletas, este programa vai englobar ainda a construção de 300 novos lugares de estacionamento de bicicleta – a universidade já tem 300 – e dois parques de estacionamento fechados.
Com experiência nesta matéria devido à tradição e às apostas do município na mobilidade suave, José Ribau Esteves, presidente da Câmara de Aveiro, considera que este projeto é importante, mas critica dois aspetos chave: o tempo do empréstimo e a obrigatoriedade de incluir 40% de bicicletas elétricas. “A ideia de emprestar uma bicicleta durante nove ou dez meses não faz muito sentido. A utilização partilhada poderia ser mais eficaz e até é normal que um jovem queira ter a sua própria bicicleta quando começa a gostar deste meio de deslocação”, afirmou o autarca ao Observador. Sobre as bicicletas urbanas, o social-democrata afirma que têm mais custos de manutenção e que não deveriam ultrapassar os 20% da aposta deste projeto.
A verba para financiar o projeto nas 17 instituições de ensino superior que aceitaram o desafio do Ministério do Ambiente vem do PO SEUR (Programa Operacional Sustentabilidade e Eficiência no Uso de Recursos), um dos 16 programas criados para a operacionalização da Estratégia Portugal 2020 e o projeto está orçamentado em cerca de 6,4 milhões de euros. A coordenação do projeto está a cargo do IMT e o período de candidatura das universidades terminou em março de 2016. Ainda não há data prevista para a implementação deste projeto.
Bicicletas: mudar comportamentos e mentalidades
Mas não só os hábitos dos mais jovens que o Governo pretende mudar. 70% das emissões de gases de estufa devem-se aos sistemas de mobilidade nas cidades e José Mendes disse ao Observador que é objetivo deste executivo “um forte relance da mobilidade suave”. Para além de programas como o U Bike, junto dos municípios, o Governo vai promover a mobilidade em bicicleta nos Planos Estratégicos de Desenvolvimento Urbano (PEDU) e Planos de Ação de Mobilidade Urbana Sustentável (PAMUS), assim como a revisão do plano Ciclando, que foi implementado em 2012 e visa a promoção da utilização da bicicleta.
“Valoriza-se muito o automóvel em termos de estatuto social. O principal problema na utilização da bicicleta é cultural. A ideia é que os universitários comecem a utilizar este meio com mais frequência e que esse pensamento se vá alargando às gerações mais velhas”, afirmou o secretário de Estado Adjunto e do Ambiente, afirmando que a meta do Governo para a utilização da bicicleta daqui a cinco anos é que seja utilizada pelo menos por 5% da população para as suas deslocações entre casa e o trabalho – a média europeia é de 7%. Atualmente, segundo o Eurobarómetro de dezembro de 2014 sobre a qualidade do transporte, Portugal é um dos países com menos utilização de bicicleta, ficando ao nível de Chipre (também com 1%) e só à frente de Malta (0%).
O próprio secretário de Estado tem duas bicicletas e antes de entrar em funções no Governo e ficar com uma agenda que o obriga a várias deslocações longas durante o dia, disse ao Observador que utilizava este meio de transporte para se deslocar para o trabalho.
Também Ribau Esteves diz que é preciso mudar a cultura, mas lembra que no município de Aveiro há uma componente importante que tem a ver com a tradição da mobilidade em bicicleta. Dois dos municípios da região, Ílhavo e Murtosa, têm os índices mais elevados de utilização de bicicleta em Portugal com 12% e 13% dos seus habitantes, respetivamente, a utilizarem este meio para as deslocações entre casa e o trabalho. Há 15 anos, Aveiro inaugurou um sistema de partilha de bicicletas apelidado Buga e a Câmara Municipal quer agora reabilitar o projeto. “Sobraram 30 bicicletas que estão velhas e queremos arrancar com um novo sistema. Aveiro conta com 150 km de ciclovias e a cidade quer assumir-se como a capital da bicicleta”, indica o autarca. Para aumentar a utilização da bicicleta entre os mais jovens, Ribau Esteves indica ainda que esta utilização devia estar prevista no seguro escolar, de modo a incentivar os mais novos a deslocaram-se com mais frequência para a escola neste meio de transporte.