790kWh poupados com a
i

A opção Dark Mode permite-lhe poupar até 30% de bateria.

Reduza a sua pegada ecológica.
Saiba mais

i

AFP/Getty Images

AFP/Getty Images

Os bastidores do sorteio do Mundial: as bolas quentes e frias, as reuniões e os (muitos) ensaios

Potes, bolas, papéis e está feito? Nada disso. O sorteio do Mundial é bem mais complexo e todos os pormenores contam neste evento que, há quatro anos, foi boicotado no Irão por causa de um decote.

O que pode correr mal num sorteio? Se pensarmos rapidamente na questão, muita coisa. Mas se refletirmos sobre os cuidados de preparação que a cerimónia envolve, quase nada. Quase, claro. Há sempre aquela exceção e o Mundial de 1982 é o exemplo paradigmático: no Palácio de Congressos de Madrid, a aposta nas máquinas correu tão mal que durante alguns minutos houve jogos que nunca chegaram na realidade a acontecer.

Com Joseph Blatter (com bem mais cabelo do que agora) e Hermann Neuberger no comando das operações, aconteceu um momento que a FIFA recorda hoje como um dos mais baixos de sempre. Vamos tentar explicar: havia três potes com seis equipas, obedecendo aos critérios da altura, e daí saía cada seleção, recebendo depois um número a nível de posicionamento de grupo. Única regra: as formações sul-americanas teriam de ficar separadas. Assim, no pote B, que tinha Chile e Peru, seriam primeiro sorteadas as quatro equipas europeias, que ficariam no grupo 3 (Argentina) e 6 (Brasil), e só depois as restantes. Percebeu? Os responsáveis nem por isso.

“E é a Escócia! A Escócia foi sorteada com os favoritos Brasil no grupo em Málaga e Sevilha. Perdão, afinal é em Alicante e vai jogar com a Argentina… A informação demorou a chegar, pedimos desculpa por isso. Mas é algo que me está a ultrapassar… Acho que está a haver uma confusão aqui, não era esta a informação…”, dizia o comentador inglês que acompanhava a transmissão. O próprio Blatter explicou o lapso – a Bélgica devia estar com a Argentina no grupo 3 e a Escócia com o Brasil no grupo 6, mas como os belgas foram colocados erradamente com a Itália no grupo 1, ficou tudo trocado. “Misturaram tudo! Quem diria que o Campeonato do Mundo começaria com um erro destes…”. E a antiga estrela Kevin Keegan, que estava na emissão, já não disfarçava o gozo.

Num trabalho de lançamento para o sorteio de 2018, a FIFA incluiu a gaffe entre os momentos mais marcantes de 88 anos deste evento. E revelou algumas curiosidades que o tempo fez cair no esquecimento.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Ora vejamos alguns deles: em 1930, o sorteio foi feito três dias antes do início da competição; em 1938, em Paris, foi o neto do presidente da FIFA, Jules Rimet, que tirou as bolas de um vaso onde só cabia mesmo a mão de uma criança; em 1966, a cerimónia no Royal Garden Hotel de Londres teve pela primeira vez transmissão televisiva em direto; em 1990, Roma acolheu o grande desfile inicial de estrelas do futebol (Pelé, Rummenigge e Bobby Moore) e não só (Luciano Pavarotti e Sophia Loren); em 1998, o evento decorreu no Vélodrome, estádio do Marselha; em 2006, o sorteio na Alemanha foi visto por 300 milhões em 150 países.

As presenças de Pavarotti e Sophia Loren no sorteio de 1990 começaram a mudar o conceito do sorteio do Campeonato do Mundo, mas foi nos Estados Unidos, quatro anos depois, que a cerimónia passou em definitivo a linha da mera escolha de grupos para um verdadeiro espetáculo de entretenimento. E por culpa de quem? Do ator Robin Williams, que abrilhantou em Las Vegas um evento que contou com Franz Beckenbauer e Evander Holyfield, num choque entre o futebol mais puro e o desporto mais “mediático”.

Por isso, todos os pormenores foram pensados, repensados e pensados novamente para que tudo corra de forma perfeita. Quase como um jogo de futebol ou um filme – antes daquelas duas horas que nos entram pelos olhos houve dezenas e dezenas de horas de trabalho a que ninguém assistiu. E assim se podem evitar polémicas como as que envolveram a atriz e modelo Fernanda Lima, em 2014: como recorda o The Guardian, o vestido demasiado curto que utilizou no evento em Salvador deixou algumas emissoras indignadas, tanto que a transmissão foi mesmo cortada na televisão estatal do Irão de Carlos Queiroz.

Fernanda Lima com o líder da FIFA em 2014, Joseph Blatter, e Dilma Rousseff, presidente do Brasil

Getty Images

Hoje, em Moscovo, há três grandes diferenças em relação aos sorteios de 2013 e 2017: 1) do calor com temperaturas acima dos 25 graus da Costa do Sauípe, em Salvador, vamos passar para o frio de Moscovo, onde há previsão de temperaturas negativas; 2) do regime moderado de segurança do Brasil vamos entrar num sistema apertado que contará com muito mais do que detetores de metais à entrada do complexo onde se realiza a cerimónia; 3) em vez daqueles simpáticos autocarros que podemos encontrar nos resorts de férias que vão passando de cinco em cinco minutos, muitas das delegações demoram menos ainda em deslocações para estarem no centro das operações. Em termos de logística, muita coisa será diferente. Mas também encontramos alguns pontos em comum.

Construído em 1961 por iniciativa de Nikita Khrushchev para que as grandes reuniões do Partido Comunista tivessem um espaço mais moderno, o Palácio do Kremlin tornou-se com o tempo num dos locais mais procurados para grandes eventos, nomeadamente concertos (por lá passaram nomes como Luciano Pavarotti, Eric Clapton, Tina Turner, Elton John, Cher, Whitney Houston, Sting ou Mariah Carey), teatros ou eventos desportivos como o Campeonato do Mundo de xadrez. É no salão nobre do espaço que irá realizar-se o sorteio.

A escolha não é por acaso: existe essa vontade em dar um cunho político a este momento e a presença de Vladimir Putin já foi confirmada. Como sublinhou à BBC Alexei Sorokin, responsável máximo da organização do evento, “existe uma enorme ambição de mostrar uma nova Rússia, uma democrática Rússia”, mas os dias que antecedem o sorteio têm sido fundamentalmente marcados por notícias “negativas”: por um lado, o receio de atos de racismo (a esse propósito, a FIFA confirmou que os árbitros têm ordem para interromper os jogos em qualquer estádio), de hooliganismo ou de homofobia; por outro, o alegado esquema de doping que pode tirar o país dos Jogos Olímpicos de Inverno de 2018. “Estamos a investir para o desenvolvimento do futebol, mas só sabem falar em corrupção e afins”, atirou mesmo Vitaly Mutko, vice-primeiro-ministro do país.

Vitaly Mutko (segundo a contar da direita), vice-primeiro-ministro, entre responsáveis da FIFA numa conferência

AFP/Getty Images

Como se percebe, a “ação” em Moscovo já começou e, numa das habituais conferências de imprensa que se vão fazendo na antecâmara do sorteio para jornalistas, houve mesmo uma pergunta que parou a sala: é ou não verdade que existem bolas quentes e frias no sorteio, como Joseph Blatter insinuou há cerca de um ano (não em relação a sorteios da FIFA mas a um nível europeu, sem especificar qual)? “Não há nada de verdade nisso: são todas iguais, não sinto nenhuma diferença, não vejo nenhuma diferença”, esclareceu Chris Unger, diretor de competições da FIFA. “A escolha dos grupos em qualquer sorteio é completamente aleatória”, garantiu.

Os ensaios decorrem desde quarta-feira, dia em que chegou o troféu de campeão mundial ao Kremlin (e uma réplica do mesmo a Moscovo, para adeptos tirarem fotografias). No vídeo explicativo de como será o sorteio a nível de potes, Portugal encontrava a “fava” Espanha, a Coreia do Sul e o Senegal — em 2014, no Brasil, tocou-nos a Alemanha no ensaio e na realidade; nesse primeiro dia em palco, a escolha foi mais “simpática” para o conjunto comandado por Fernando Santos (Peru, Irão e Sérvia) mas juntava Argentina e Espanha, Brasil e Inglaterra e Alemanha e Uruguai, além de ter um grupo interessante (pelo menos para quem gosta de imprevisibilidade e bom futebol) com Polónia, Suécia, Nigéria e Colômbia. E houve um outro exercício, que até foi partilhado pelo espanhol Puyol nas redes sociais, que juntava Brasil, Espanha, Suécia e Japão. Mas, por ora, o que interessa mesmo é garantir que tudo funciona sem erros como aquele de 1982.

Adepta russa aproveita para tirar fotografias com a réplica da taça entregue ao campeão do mundo

AFP/Getty Images

As delegações das seleções começaram a chegar na quarta-feira à noite. No caso de Portugal, viajaram para a Rússia Fernando Gomes, presidente da Federação; Fernando Santos, selecionador nacional; João Vieira Pinto, diretor da Federação; Tiago Craveiro, diretor-geral da Federação; e Carlos Godinho, team manager da equipa. À chegada, são entregues as credenciais (e quem não tiver não entra, nem que seja o Maradona ou o Pelé) e o programa para os dois dias (quinta e sexta-feira) por responsáveis da organização. Cada delegação tem duas pessoas encarregues de ajudarem em todos os detalhes, outro dos sinais do investimento russo para que nada falhe.

Esta quinta-feira, houve uma reunião com representantes de todas as seleções que acabou por ser uma espécie de briefing não só para o sorteio mas também para a fase final: foram tratados assuntos logísticos, organizativos e de segurança, além da explicação das condicionantes para o momento que todos esperam, como o facto de poder haver apenas uma seleção por continente em cada grupo à exceção das europeias. À noite, como também é habitual, haverá lugar a um jantar de receção que juntará todos os presentes.

A zona dedicada às bancas de promoção de cada uma das cidades que irá receber jogos do Mundial

AFP/Getty Images

Ali, o ambiente é bom. Bom não, excelente. As pessoas do futebol cruzam-se nos corredores e no lobby dos dois hotéis onde se encontram todas as delegações, ficam na conversa, trocam números de telefone. Mas também na própria cidade de Moscovo se consegue ver o cuidado de deixar uma boa imagem: ruas limpas, muita luz, centenas de cartazes do Mundial de 2018 (o oficial também foi apresentado esta semana). Difícil mesmo é, para os jornalistas, entrarem no Kremlin: entre detetores de metais, passaportes, levantamentos de credenciais (há mais do que uma, para acesso ao local, entrada na sala do sorteio e ida para a zona mista), demora-se algum tempo; passada esta parte, está tudo tranquilo. E além da área enorme para imprensa no local, existem também pequenas bancas nos acessos tal como em 2014 onde estão representadas todas as cidades que receberão jogos.

Também nos ensaios o ambiente tem sido elogiado (que teve também as caras dos selecionadores e o respetivo posicionamento que vão ocupar na sala, com a delegação portuguesa a ficar junto à do Brasil), com uma surpresa à mistura: Gary Lineker, o antigo goleador de Leicester, Everton, Barcelona e Tottenham (além da seleção inglesa) que será um dos apresentadores do sorteio, fez esta quinta-feira 57 anos e teve direito a surpresa com bolo e tudo. E quem lhe cantou os parabéns? Entre os vários elementos da organização e da produção do espetáculo, as também antigas estrelas Cafu (Brasil), Puyol (Espanha), Cannavaro (Itália), Blanc (França), Forlán (Uruguai) e Gordon Banks (Inglaterra), representantes dos oito campeões do mundo que marcarão presença no sorteio e que chegaram também mais cedo a Moscovo, a que se juntarão Maradona (Argentina) e Miroslav Klose (Alemanha).

Imagem do ensaio geral do sorteio, onde estiveram nomes como Cafu, Blanc, Banks, Cannavaro, Forlán ou Puyol

Getty Images

Além de Lineker, a apresentação estará também entregue a Maria Komandnaya, jornalista russa que costuma acompanhar as grandes competições desportivas e que acompanha de perto o fenómeno futebolístico, como se viu na forma efusiva como destacou o primeiro jogo da árbitra Bibiana Steinhaus na Bundesliga. Curiosamente, depois de ter colocado na sua conta oficial do Twitter a informação de que estaria na condução do sorteio, recebeu o seguinte comentário: “Sou iraniano. Os responsáveis da nossa TV são muito restritos. Se for possível, será que pode escolher um vestido para a cerimónia que nos permita ver o sorteio?”. Como se vê, todos os pormenores contam.

Assine por 19,74€

Não é só para chegar ao fim deste artigo:

  • Leitura sem limites, em qualquer dispositivo
  • Menos publicidade
  • Desconto na Academia Observador
  • Desconto na revista best-of
  • Newsletter exclusiva
  • Conversas com jornalistas exclusivas
  • Oferta de artigos
  • Participação nos comentários

Apoie agora o jornalismo independente

Ver planos

Oferta limitada

Apoio ao cliente | Já é assinante? Faça logout e inicie sessão na conta com a qual tem uma assinatura

Ofereça este artigo a um amigo

Enquanto assinante, tem para partilhar este mês.

A enviar artigo...

Artigo oferecido com sucesso

Ainda tem para partilhar este mês.

O seu amigo vai receber, nos próximos minutos, um e-mail com uma ligação para ler este artigo gratuitamente.

Ofereça artigos por mês ao ser assinante do Observador

Partilhe os seus artigos preferidos com os seus amigos.
Quem recebe só precisa de iniciar a sessão na conta Observador e poderá ler o artigo, mesmo que não seja assinante.

Este artigo foi-lhe oferecido pelo nosso assinante . Assine o Observador hoje, e tenha acesso ilimitado a todo o nosso conteúdo. Veja aqui as suas opções.

Atingiu o limite de artigos que pode oferecer

Já ofereceu artigos este mês.
A partir de 1 de poderá oferecer mais artigos aos seus amigos.

Aconteceu um erro

Por favor tente mais tarde.

Atenção

Para ler este artigo grátis, registe-se gratuitamente no Observador com o mesmo email com o qual recebeu esta oferta.

Caso já tenha uma conta, faça login aqui.

Assine por 19,74€

Apoie o jornalismo independente

Assinar agora