Início de setembro é sinónimo de regresso às aulas. Mas há anos escolares mais especiais do que outros. A ida para a universidade é uma experiência importante para os jovens e para os pais, porque há muita coisa nova a acontecer e é preciso lidar com os receios sobre o que vão encontrar, o contacto com outras pessoas e a adaptação a outro método de estudo. O Observador conversou com Nuno Cristiano de Sousa, psicoterapeuta que acompanha vários estudantes universitários, sobre como lidar com a transformação. Como é que define a faculdade ideal? Há várias coisas importantes. O contacto com o conhecimento científico é um meio de começar a questionar várias coisas sobre a vida. Uma faculdade que esteja interessada em estimular o pensamento, em vez de impor conhecimento, vai por os alunos a questionar as coisas e a sentir que aquilo que eles têm para dizer é importante — e aí os professores têm um papel significativo. Essa é a faculdade ideal. As associações de estudantes devem promover a interação entre os alunos e disponibilizar atividades além dos estudos. Tem de haver espaço para saídas à noite, para chumbar, para passar no ano a seguir, para aprender coisas novas. Como gerir a diferença de método de ensino e de estudo? Quando transitam para o ensino universitário, que tem uma exigência muito maior, há muitos alunos que se confrontam com o choque de descida das notas. Às vezes não é por falta de competências, mas sim porque é difícil de entrar naquele registo diferente. É natural que a adaptação demore algum tempo. É necessário desenvolver essas competências pelo próprio processo universitário. Na universidade há um leque de cadeiras gigante, há uma quebra da linha de conhecimentos. Há um processo de adaptação cognitivo que tem de ser tolerado pelo jovem e pelos pais. No caso de sentirem que afinal aquele não é o curso certo, o que devem fazer? Os alunos não devem desistir à primeira frustração. Há casos em que confundem o não se estarem a adaptar à transição de um meio para o outro com o não se estarem a adaptar ao curso. Devem ter algum tempo para perceber o que os está a incomodar: se, de facto, é o curso que não corresponde às expectativas deles, se são eles que sentem que estão a falhar perante a família ou se estão a sentir dificuldades a adaptar-se a uma realidade nova. O primeiro semestre não é igual a tudo o que vem a seguir. Portanto, tentem falar com colegas mais velhos para perceber se aquilo que imaginam que vai ser o futuro deles no curso corresponde à experiência dos outros. Não no sentido de se compararem, mas de perceberem que tipo de experiências é que existiram. Se o jovem percebe que há algumas experiências dos anos seguintes que lhe interessam, se calhar vale a pena continuar. Se o aluno não quiser continuar, como é que pais e filhos devem gerir a frustração? Há muitas pessoas que ficam com medo de mudar, de “perder um ano de vida”. Se os jovens perceberem que querem mesmo mudar, mais útil do que estar a pensar no tempo perdido é agarrarem-se àquilo que conquistaram nesse ano. Mesmo que em termos curriculares ou profissionais não tenham atingido os objetivos que imaginavam, há outras vivências que valeram a pena. Experiência de vida nunca é perda de tempo. Mais vale mudar quando há essa perceção (não é mudança impulsiva), do que andar a atrasar três ou quatro anos e a pessoa não se sentir bem. Ponderar, fazer essa mudança e aceitar que faz parte. Quais são os medos que os jovens universitários enfrentam? É importante que os estudantes confiem na própria capacidade de adaptação, porque vão dar de caras com coisas muito diferentes. É na vivência deste novo mundo que eles próprios vão aprender a lidar de forma coerente com os próprios valores. É importante começar a sair com os amigos, perceber por que sítios é que não devem andar, que sítios é que gostam, que disciplinas é que não gostam tanto, quem é que os pode ajudar, quais são aqueles colegas com quem se calhar não convém fazer trabalhos de grupo. Não ter receio do que vão encontrar.
Como gerir o estudo com as outras distrações? Há um balanço entre o prazer e o dever. Quando saem da casa dos pais, aproveitam para ter a liberdade que não sentiam em casa e tendem a cometer alguns excessos. De certa forma é natural, desde que depois isso venha a ser integrado num processo construtivo. É natural os jovens terem brincadeiras que às vezes correm mal ou beberem uns copos a mais. Isso faz parte do processo de integração com os colegas. Há casos de universitários que saem muito à noite mas são alunos com rendimento e os colegas com quem saem à noite são colegas com quem fazem grupos de estudo. Conseguem integrar o dever e o prazer. Há pais que começam a ficar com muito receio que os filhos comecem a descarrilar. Como a cultura agora é mais permissiva do que era no tempo deles, os pais ficam com medo do desconhecido.
“A faculdade ideal estimula o pensamento”