A Medicina não é mágica nem funciona por intuição, e o dr. House é genial mas é uma personagem de ficção. Estas são algumas das conclusões a retirar desta conversa com Francisco Teixeira Mota. Advogado, conhecido pelas suas intervenções sobre liberdade de expressão, trabalha há vários anos no que designa como responsabilidade médica.

Partos, exames que correm mal, problemas de diagnóstico e infecções hospitalares estão na origem de muitos dos casos que levam os portugueses a queixar-se da forma como foram atendidos nos serviços de saúde.

Francisco Teixeira da Mota discorda da visão, largamente difundida, de que, a não ser nos casos da pinça e do dreno esquecidos dentro do corpo do paciente, é quase impossível a um cidadão comum provar um caso de erro médico. E explica porquê:

“Hoje em dia é possível saber-se o que se devia ter feito. Não é uma coisa mágica. Nem é uma intuição. Há um corpo de conhecimentos que diz em relação a cada situação o que se deve fazer. Há protocolos. Há guidelines internacionais.”

Para aquilo que define como “grande evolução” na forma como os tribunais encaram as queixas na área da saúde muito terão contribuído, na opinião deste advogado, as perícias efectuadas pelo Instituto de Medicina Legal: “Nem os juízes nem os advogados são especialistas de questões tão complexas e às vezes tão especializadas como são as questões médicas. Nomeadamente quando se está a apreciar se aquilo que foi feito era aquilo que devia ser feito.” Estas perícias, que não sendo vinculativas são geralmente seguidas pelo tribunal, permitiram ultrapassar a velha dificuldade inerente a arranjar um médico que aceitasse ir a um tribunal fazer uma apreciação negativa do trabalho de um colega.

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Mas, como tudo na área da saúde, também as perícias têm as suas contra-indicações. No caso chama-se morosidade. A demora na obtenção das perícias dilata o tempo destes processos já de si longos. O outro aspecto a ter em conta quando se fala de erro médico e tribunais está resumido na expressão “medicina defensiva”. O receio dos processos e das acusações está ou não a levar a uma medicina defensiva?

“É um facto. É inevitável. Os meios complementares de diagnóstico tornaram-se a forma de os médicos se defenderem o melhor possível. Às vezes também servem para o contrário porque estão lá os sinais e o médico não os soube ver. Mais do que o saber do médico são os direitos do utente que estão em causa e portanto o médico tem de ter em conta os direitos do utente.”

Mais ou menos imutável mantém-se em Portugal a cultura dos técnicos e serviços hospitalares de não reportarem o erro. Por contraste Francisco Teixeira da Mota refere a prática norte-americana em que “se alguma coisa corre mal é imediatamente o hospital e o médico que se dirigem aos familiares ou aos doentes”.

E duma conversa que nos levou à pressão para baixar o número de cesarianas, à responsabilização criminal de psiquiatras pelas agressões cometidas pelos seus pacientes e às diferentes formas como reagimos à morte caso elas ocorram em casa ou em ambiente hospitalar, ficou uma constatação: “A Medicina não é uma ciência exacta.” E um esclarecimento:

“As obrigações do contrato médico não são obrigações de resultados mas de meios. O médico ou o hospital obrigam-se a colocar ao dispor do doente todos os seus conhecimentos, sendo certo que os seus conhecimentos devem ser actualizados. Obrigam-se a colocar ao dispor do doente os meios e os melhores meios possíveis, dentro da realidade, mas não se obriga a curar.”