Portugal realizou “progressos notáveis em termos de consolidação orçamental, ajustamento das contas externas, acesso ao mercado, estabilidade financeira e reformas estruturais“. Esta é a opinião de Carlo Cottarelli, diretor-executivo do FMI que supervisiona a monitorização pós-troika de Portugal, que tece algumas críticas ao trabalho dos técnicos do FMI que elaboraram o relatório anual (Artigo IV) por estes não estarem a ter a paciência devida a esperar pelos resultados das reformas.

O relatório de acompanhamento de Portugal divulgado no início de maio, e cujos detalhes vêm a público esta segunda-feira, “centrou-se muito nos desequilíbrios de stock [acumulados] que persistem” e presta uma “atenção relativamente limitada” aos “progressos notáveis” realizados nas áreas já citadas, defendem Carlo Cottarelli e Inês Lopes, sua conselheira, numa carta que acompanha o relatório. O diretor executivo do fundo transmite a posição do país e não do FMI.

Além disso, Cottarelli diz que as propostas dos técnicos – que vêm na linha recente do FMI de exigir mais reformas e mais medidas de consolidação orçamental – “teriam beneficiado de uma discussão mais aprofundada acerca das reformas aplicadas em 2013-2014, bem como acerca dos desafios que a sua implementação enfrentou”.

Salientando que “as autoridades [nacionais] reconhecem que, tendo em conta a magnitude dos desequilíbrios acumulados desde meados da década de 90, nomeadamente no que diz respeito ao endividamento, o processo de ajustamento terá de continuar”, Carlo Cottarelli defende que “reduzir os desequilíbrios acumulados irá levar tempo, algo que o próprio Fundo já reconheceu”.

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Daí que “a redução gradual dos desequilíbrios acumulados [stock], existindo um ajustamento mais rápido das tendências [fluxo], não deve ser confundido com ausência de esforços de ajustamento”, salienta Carlo Cottarelli, deixando implícita mais uma crítica à forma como têm decorrido os trabalhos da missão do FMI quando esta se desloca a Lisboa.

Tanto que Carlo Cottarelli diz ter ficado “algo surpreendido” por ver que no relatório “apenas se tenha olhado, para aferir dos progressos na obtenção de sustentabilidade orçamental, para a evolução do rácio de dívida pública face ao PIB”. Ou seja, “os progressos notáveis nas contas públicas, saldo primário [diferença entre receitas e despesas, excluindo juros] e balança estrutural não foram tidos em conta de maneira alguma”.

“Ainda que os frutos destas reformas já estejam a ser evidentes e efetivos, os benefícios de outras reformas – e outras reformas – levam mais tempo a materializar-se”, conclui Carlo Corratelli, repetindo que “isso não deve ser considerado um falhanço ou uma insuficiência de reformas, mas, sim, um reflexo de que existe um efeito de atraso [time lag] na verificação da eficácia plena das reformas”.

Restaurar equilíbrio interno sem minar posição externa” é o desafio

A análise da Comissão Executiva do FMI ao relatório entregue no início de maio vai no sentido de elogiar as medidas tomadas nos últimos anos e os seus resultados. Mas “os diretores observam, contudo, que a recuperação ainda é demasiado modesta para trazer a produção e o emprego para os níveis anteriores à crise”.

No curto prazo, as perspetivas são positivas graças às taxas de juro baixas, à descida do euro e dos preços do petróleo. “Mas à medida que o impulso dado por estes fatores de curto prazo desvanece, o crescimento deverá moderar no médio prazo, já que Portugal continua atrás de vários pares em alguns indicadores estruturais chave”, alerta o relatório do FMI.

Neste contexto, “restaurar o equilíbrio interno sem minar a posição externa conseguida continua a ser a prioridade de políticas mais importante”, defende o organismo liderado por Christine Lagarde.

“Os diretores concordaram que, ainda que as perspetivas de curto prazo tenham melhorado significativamente, as perspetivas de médio prazo continuam a enubladas pelos problemas antigos – investimento baixo, elevados níveis acumulados de dívida pública e privada, empresas demasiado endividadas e fragilidade do mercado de trabalho”.

A retoma vai depender, acredita o FMI, da capacidade das autoridades de “resolver o problema do crédito malparado e da dívida empresarial acumulada de uma forma oportuna e sistemática”. É preciso assegurar que “os bancos mantêm níveis de capital adequados e provisões” e seria importante, também, “acelerar os processos de reconhecimento de imparidades em crédito malparado [debt write-off]”.

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