As palavras costumam custar a entrar na cabeça do adepto. Parecem balelas, desculpas para uma equipa que não engata e tarda em funcionar como deve ser. “Precisamos de tempo”, diz o treinador, enquanto explica que estas coisas demoram, que uma equipa não se faz de um dia para o outro e que é preciso treino para os jogadores aprenderem a render juntos. Isto tanto pode ser verdade como mentira, pois se acontecesse sempre, então não haveria equipas a arrancarem a abrir e a jogarem bem à bola logo no início da época. Isto varia, como tudo na vida. O que não parece variar muito é o desfecho das visitas que, de vez em quando, o Benfica tem de fazer a casa do FC Porto logo durante o primeiro mês de campeonato — porque, nas últimas 10, apenas conseguiu uma vitória.

Ir ao Estádio do Dragão bem cedo na temporada não é pêra doce, mas para os encarnados costuma ser bem amarga. O calendário mandou o clube da Luz lá ir este domingo (19h15), à quinta jornada, para dar uma injeção de emoções logo no arranque do campeonato. Além de ser um clássico matutino na época, também ajuda o facto de os rivais estarem separados por apenas um ponto e de terem o Sporting à perna — os leões têm 10 pontos, como o FC Porto, e vão jogar contra o Nacional da Madeira (segunda-feira, às 21h) sabendo já o resultado do clássico jogado no Dragão. Nunca se pode confiar em palpites, mas, olhando para a história que os números contam, não é nada costume o Benfica visitar o FC Porto tão cedo e voltar de lá a sorrir.

Nos últimos 50 anos isso apenas aconteceu uma vez. Foi em 1971/72, no tempo em que Eusébio ainda era o pau para toda a obra no Benfica e marcou dois golos para os encarnados saírem do Dragão a ganhar 3-1 (o outro foi de Artur Jorge). Era a primeira jornada do campeonato, o treinador chamava-se Jimmy Hagan e o clube arrancava aí para o segundo de três títulos conquistados com o inglês a dar ordens (em 1972/73, aliás, foi o primeiro a fechar um campeonato sem derrotas). Esta partida será saudosa para os lados da Luz, já que nas outras nove épocas em que a equipa foi ao Dragão nas primeiras cinco jornadas, nunca conseguiu vencer.

(O golo de José Alberto Costa que marcou o 1-0 com que o FC Porto bateu o Benfica, à segunda jornada, em 1978/79. Com direito a reportagem e tudo.)

Antes, em 1965/66, a terceira jornada do campeonato levou o Benfica ao Dragão e tirou-o de lá com uma derrota por 2-0, por culpa dos golos de Nóbrega e Naftal. Não fazer um golo e ver os dragões marcarem-lhe dois é o resultado que mais se repetiu — a partir daí aconteceu mais quatro vezes. Mas não em 1978/79, quando bastou um golo de José Alberto Costa para os dragões vencerem (1-0) quando ainda obedeciam ao que José Maria Pedroto gritava no banco de suplentes. No Benfica, era tempo da primeira passagem do inglês John Mortimore pelo clube.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Volvidas duas temporadas, em 1981/82, o calendário ditou que os encarnados abrissem o campeonato no Estádio das Antas e voltou a não lhes correr bem: o golo de Zoran Filipovic foi pouco para contrariar os de Romeu e Jaime Pacheco. O 2-1 deixou deu um sorriso a Hermann Stessl e uma cara triste a Lajos Baróti, os treinadores. Depois vieram três épocas seguidas em que os rivais se defrontaram logo no arranque da liga — e apareceram os tais 2-0. Em 1984/85, o bibota (alcunha que ganhou por ser o melhor marcador europeu por duas vezes) Fernando Gomes fez os dois golos da vitória do FC Porto à terceira jornada. Logo na época seguinte (1985/86), o português marcaria um e Juary outro para os dragões de Artur Jorge vencerem o clássico logo à primeira jornada.

(Vinha e Paulo Pereira, duas vezes, marcaram para o FC Porto empatar com o Benfica, em 1993/1994. Isaías, também duas vezes, e Rui Águas fizeram os golos encarnados.)

Fernando Gomes não ficou por aqui e até conseguiu marcar em três clássicos destes. Em 1986/87 o Benfica voltou às Antas na primeira jornada, mas desta vez não perdeu: o jogo acabou num 2-2, porque Rui Águas e Chiquinho Carlos responderam aos golos de Fernando Gomes e Juary. Estes encontros no jogo inaugural do campeonato tornaram-se um hábito em 1993/94, quando houve outro empate (3-3) na casa portista e os treinadores eram Tomislav Ivic, de azul e branco, e Toni, de encarnado. Depois, em 2000/2001, voltou-se aos 2-0 por vontade de Dmitri Alenichev e Jorge Costa — outro clássico jogado à primeira jornada –, que deram a primeira vitória a um Fernando Santos que, na altura, já era o engenheiro do penta.

Assim chega-se a 2003/2004, última época em que José Mourinho ordenou no FC Porto. Aí, à quinta jornada, houve um golo de Derlei na baliza certa e um de Argel na errada que deram um 2-0 para os dragões — o Benfica era treinado por José Antonio Camacho e, nessa época, vingou-se no Jamor, quando ganhou a Taça de Portugal ao rival.

O resumo da estatística dada, portanto, conta que, nos últimos 50 anos e em 10 visitas ao estádio portista, o Benfica só saiu de lá a ganhar uma vez. Mas diz mais: nas três épocas em que não perdeu em casa do FC Porto, os encarnados acabaram por chegar ao final da temporada como campeões nacionais. Ou seja, em 1971/72, em 1986/87 e em 1993/94. Mas não se pode dizer que os dragões tenham fechado assim as sete épocas em que receberam o Benfica e marcaram mais golos que o rival: em 1965/66 e 2000/2001, os campeões foram o Sporting e o Boavista. No domingo, portanto, não vamos descobrir quem vai terminar esta temporada a rebentar garrafas de champanhe. Mas já vamos ficar com uma pista.