Conversa de chacha. Os jogadores, o presidente, os adeptos, o cão e até o piriquito lá de casa, todos pensarão o mesmo quando ouvem um treinador dizer algo como isto: “Vamos para ganhar, seja com que jogadores forem. Temos um plantel com mais de vinte jogadores para isso mesmo”. Nada de mal com a primeira parte da frase, pois não há equipa que jogue futebol para perder ou empatar, mas a segunda, a da ideia de que todos os jogadores são bons e não importam os que não podem jogar, não é bem assim. Porque se Luisão, Jonas e Samaris não fossem melhores que Lisandro, Mitroglou e Renato Sanches, os primeiros não teriam a esta altura do campeonato bem mais minutos nas pernas do que os segundos.

Mas os melhores nem sempre podem jogar e depois vem a outra parte do discurso de Rui Vitória que faz sentido — o Benfica ia a Braga “para ganhar com que jogadores” fossem. E o azar que um braço partido, um amarelo a mais e uma opção do treinador deram a uns (leia-se, a Luisão, a Jonas e a Samaris) foi a sorte de outros. E bom para os encarnados foi que isto acabou por dar sorte à equipa inteira. Rui Vitória é sabichão e sabia que os minhotos gostam de trocar passes e tentar tabelas pelo centro do campo, colocando Rafa e Alan a fingirem nas alas para que de lá partam rumo ao meio e acelerem a bola depois de ela passar, com calma, a linha do campo, com calma.

Sorte para o Benfica que, sem Jonas, fosse Nico Gaitán a andar atrás do avançado. Porque o argentino fartou-se de fazer o que o Braga não esperava e, com Mitroglou, pressionou à maluca os centrais minhotos quando estes queriam sair a jogar. Resultado: bola recuperada aos três minutos, o grego tratou-a com pantufas na área e deu-a de calcanhar em Pizzi, que rematou de pé esquerdo para Kritsyuk confirmar que ela entrava na própria baliza. Os bracarenses erravam muitos passes lá atrás com a pressão que os encarnados faziam lá à frente, porque Gonçalo Guedes e Pizzi também encostavam nos laterais. Nenhuma equipa, até aqui, jogara assim em Braga.

Benfica's Argentinian defender Lisandro Lopez (R) celebrates after scoring a goal during the Portuguese league football match Sporting Braga vs SL Benfica at the Municipal stadium of Braga on November 30, 2015. AFP PHOTO/ MIGUEL RIOPA / AFP / MIGUEL RIOPA (Photo credit should read MIGUEL RIOPA/AFP/Getty Images)

O central argentino foi o quarto defesa do Benfica a marcar esta época, depois de Luisão, Jardel e Nélson Semedo. Foto: MIGUEL RIOPA/AFP/Getty Images

A sorte do Benfica continuou, porque sem Luisão houve espaço para Lisandro López estar em campo e, aos 11’, receber uma bola que Jardel insistiu em devolver à área, após um canto. O argentino aproveitou a desatenção alheia (a defesa do Braga julgou-o em fora-de-jogo) e teve tempo para dominar de peito e rematar para o 2-0. Os encarnados mantiveram-se sortudos nos 79 minutos que se seguiram, porque rara foi a bola que o central argentino não cortasse ou parasse na área do Benfica. Não conseguiu foi tocar na que Hassan cabeceou à barra antes do intervalo, no único remate em que o anfitrião conseguiu assustar o visitante. Depois, na segunda parte, houve um miúdo a dizer que a sua sorte é bem capaz de ser a sorte de todos.

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Os encarnados conseguiram passar 45 minutos a anularem o tal jogo interior do Braga e isso deveu-se muito à forma como Renato Sanches se portou. O miúdo, que passou a semana a ver os jornais falarem do bairro pobre de onde veio e a preverem para onde ele vai, foi quem mais calma teve a jogar. Quem mais passes fez para o pé dos outros. Quem mais passes intercetou e bolas fez sair dos cercos de pressão que o Sporting de Braga montava à volta dos encarnados, quando perdiam a bola. O Benfica passou a querer jogar sem pressas e conseguiu-o porque os 18 anos do rapaz com tranças teve sempre calma a dar o primeiro passe após a bola ser recuperada. Tanta que a equipa não arrancou em contra-ataques quando podia, mas sem que fosse demasiada para evitar que o Benfica, de vez em quando, chegasse à baliza de Kritsyuk.

É verdade que o Braga de Paulo Fonseca teve mais a companhia da bola (65%) e que rematou a bola duas vezes aos ferros (uma num livre de Felipe Augusto, que ficou demasiado tempo no banco de suplentes). O treinador minhoto também não mentiu quando disse que o Benfica se montou para anular um ponto forte da sua equipa — Pizzi e Gonçalo Guedes defenderam mais do que atacaram. Mas esqueceu-se de dizer que, a ter que inventar jogadas pelas alas, o Braga fez éne cruzamentos que em nada deram e nunca conseguiu evitar que os encarnados lançassem contra-ataques sempre que aceleravam as trocas de bola. E só deixaram de o fazer quando Rui Vitória lançou Jonas, desviou-o Gaitán para extremo e mostrou como, se calhar, o brasileiro limita mais do que liberta o jogo da equipa. Porque no jogo de “passe e desmarca” que o treinador falou após a partida, Jonas gosta mais de estar na parte de passar a bola do que na de correr atrás dela.

Quem fez ambas e igualmente bem foi Renato Sanches. Por isso é que o azar de Samaris foi a sorte do miúdo das tranças. E do Benfica, que já não vencia três jogos seguidos no campeonato desde abril.