O primeiro-ministro britânico, David Cameron, alvo de inúmeros pedidos de demissão, admitiu hoje que deveria ter gerido melhor o caso dos “Papéis do Panamá”, ao evocar a sociedade “offshore” liderada pelo seu próprio pai.

Em Londres, apesar dos encorajamentos de Edward Snowden no Twitter, os que defendem a demissão de Cameron estão, porém, a ter dificuldades em mobilizar mais pessoas nesse sentido, havendo mesmo poucas vozes na oposição trabalhista que os apoiam.

Defronte do “número 10 de Downing Street, sede do governo britânico, várias centenas de manifestantes exigiram hoje de manhã a demissão do primeiro-ministro britânico, alguns empunhando cartazes com frases como “Cameron deve partir” e outros trajando panamás (chapéus).

Pouco depois, dirigiram-se para uma unidade hoteleira de Londres a pouco mais de dois quilómetros da sede do Governo britânico, onde Cameron discursava perante os delegados do Partido Conservador, reunido em congresso para preparar as eleições locais de maio próximo.

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“Tem sido uma semana em grande”, começou por dizer Cameron, passando de imediato para uma referência à revelação de que o pai, Ian Camerpon, que faleceu em 2010, dirigiu um fundo de investimentos nas Bahamas do qual, como admitiu tardiamente, tirou benefícios.

“Nada de ilegal”, insistiu David Cameron.

“Sei que deveria ter gerido melhor o caso e não culpem os meus conselheiros. O erro é meu e aprendi a lição”, acrescentou, renovando a promessa de publicar, “em breve”, as declarações de impostos dos últimos anos, o que, a acontecer, será inédito com um primeiro-ministro do Reino Unido.

O líder da oposição trabalhista, Jeremy Corbyn, que afirmou sexta-feira à noite que o primeiro-ministro “perdeu a confiança dos britânicos”, comentou já que as declarações de Cameron, considerando que a ‘mea culpa’ vem “tarde demais”.

Neste quadro, na reunião dos conservadores de hoje, Cameron, que se bate por convencer os britânicos a votar pela manutenção do Reino Unido na União Europeia (UE), apenas fez uma ligeira alusão ao referendo de 23 de junho.

Sexta-feira, uma sondagem oficial demonstrou que a popularidade de Cameron caiu para o valor mais baixo desde julho de 2013, com 58% de opiniões desfavoráveis.

Como pano de fundo da contestação da oposição, está também a demissão do primeiro-ministro islandês, Sigmund Gunnlaugsson, anunciada há três dias, que os britânicos querem ver replicada no Reino Unido.

Segundo o Consórcio Internacional de Jornalistas de Investigação (ICIJ, na sigla inglesa), com sede em Washington, que reuniu para este trabalho 370 jornalistas de mais de 70 países, mais de 214.000 entidades ‘offshore’ estão envolvidas em operações financeiras em mais de 200 países e territórios em todo o mundo.

O semanário Expresso e a TVI, que integram em Portugal este consórcio, noticiaram que há mais de 240 portugueses nas ‘offshores’ do Panamá, entre os quais os nomes mais conhecidos são Luís Portela, Manuel Vilarinho e Ilídio Pinho.

A investigação resulta de uma fuga de informação e juntou cerca de 11,5 milhões de documentos ligados a quase quatro décadas de atividade da empresa panamiana Mossack Fonseca, especializada na gestão de capitais e de património, com informações sobre mais de 214 mil empresas “offshore” em mais de 200 países e territórios.

A partir dos Papéis do Panamá (Panama Papers, em inglês) como já são conhecidos, a investigação refere que milhares de empresas foram criadas em “offshores” e paraísos fiscais para centenas de pessoas administrarem o seu património, entre eles rei da Arábia Saudita, elementos próximos do Presidente russo Vladimir Putin, o presidente da UEFA, Michel Platini, e a irmã do rei Juan Carlos e tia do rei Felipe VI de Espanha, Pilar de Borbón.

A informação está disponibilizada num mapa-mundo, no sítio deste jornal, em http://www.irishtimes.com/business/panama-papers.