O Prémio Nobel da Economia e ex-assessor do presidente norte-americano Bill Clinton não tem dúvidas: “Na minha cabeça, talvez seja necessário deixar morrer o euro para salvar o projeto europeu, que é muito mais importante”. Joseph Stiglitz falou com o El Mundo e com o El País antes do lançamento europeu do seu último livro Euro. Como uma moeda comum ameaça o futuro da Europa, que em Portugal é editado pela Bertrand e tem pré-lançamento marcado para 23 de setembro.

“Terminamos o projeto e avançamos rápido com um seguro de depósitos comum, obrigações europeias e estabelecemos a regra em que um país com superavit tem de estimular a economia, entre outras medidas. Infelizmente, a Alemanha continua a afirmar que não somos uma união de transferências, o que significa que não quer que estas instituições representem uma comunidade entre os países europeus. Não há alternativa: ou tens mais Europa ou menos Europa”, afirmou em entrevista ao El Mundo.

Assegurando que uma das coisas que mais preocupa as pessoas na democracia é a economia, Stiglitz dá os exemplos da Grécia, Espanha e Portugal, países em que 62% do eleitorado votou em partidos anti-austeridade. “No entanto, a Alemanha e a Comissão Europeia dizem que não, que não há escolha. Votam, mas já não têm o direito de determinar o seu futuro. É muito mau para a democracia quando as pessoas dizem ‘Pensávamos que vivíamos numa democracia’ e eles respondem ‘Não, nunca mais [viverás] nas coisas que importam, porque abandonaste esse direito”.

Sobre a crise política em Espanha, o Prémio Nobel da Economia afirmou que Mariano Rajoy “está claramente enganado quando disse que a sua política funcionou, mas não funcionou, foi um desastre”. Para o especialista, “a austeridade quase nunca funcionou”: “Não é uma surpresa. O presidente festeja a recuperação porque a taxa de desemprego é de 20%. Mas para qualquer pessoa que esteja fora de Espanha, quando vê esta taxa, pensa que ele devia estar a abrir um buraco e a enfiar lá a cabeça, quando tem um desemprego juvenil de 50%”, afirmou.

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Na entrevista que deu ao El Mundo, Stiglitz não poupou críticas aos alemães. Afirmou que, se a Alemanha tivesse seguido uma política diferente, poderia ter feito com que o projeto europeu funcionasse.

“Se tivessem subido o salário mínimo – que antes não tinham – teriam ajudado a base do seu país e produzido um ajuste que teria sido bom para os alemães, para os espanhóis e para o euro. Uma das coisas que digo é que deveria haver uma regra que faça com que um país com superavit tenha de agir desta forma”, afirmou.

“Apple e Irlanda roubaram receitas fiscais” à Europa

Sobre as eleições norte-americanas, Stiglitz não hesita em afirmar que Donald Trump é “muito perigoso” e que os EUA nunca tiveram um candidato presidencial “tão pouco qualificado”. “Nunca trabalhou no serviço público ou no setor privado. O seu sucesso baseou-se em enganar as outras pessoas”, afirmou, acrescentando que a possibilidade de Hillary Clinton não vencer o preocupa.

Ao El País, o Prémio Nobel da Economia acrescentou que Donald Trump e o fenómeno da ala direita é a afirmação de que “os partidos centristas aprovaram uma série de políticas durante um terço do século que aumentaram a desigualdade e que deixaram para trás muitas frações da sociedade”.

Na questão do Brexit, voltou a não poupar criticas aos alemães e afirmou que a Zona Euro foi tão “mal gerida” que tornou a União Europeia “menos atrativa”. “O Reino Unido sempre teve um sentimento forte de identidade, de não ser como o resto das pessoas, mas creio que os problemas do euro foram cruciais para o Brexit”, disse.

Criticando Jean Claude Juncker, acrescentou que a saída do Reino Unido deve ser um incentivo para que a União Europeia funcione melhor e que um “exemplo muito bom disso” foi a decisão da comissária europeia Margrethe Vestager, que optou por multar a Apple e afirmar que quer a tecnológica quer a Irlanda estavam a maquilhar e a “roubar receitas fiscais”.