É, muito provavelmente, a compra do ano. Ou melhor, da década. A Aliança Renault-Nissan, através da marca japonesa para não ferir susceptibilidades – os japoneses são muito sensíveis em relação a serem controlados pelos estrangeiros e ainda estão a digerir o facto de a Renault dominar a Nissan (possui 43,4%) –, adquiriu 34% da Mitsubishi Motors. E o negócio, depois de longo escrutínio, foi finalmente aprovado pela Comissão Europeia.

Por uns meros 2,02 mil milhões de euros, a Nissan adquire uma percentagem da sua conterrânea e concorrente, de modo a ter o direito de nomear a administração e de controlar o seu futuro. Não é de estranhar, pois até aqui quem presidia à Mitsubishi acumulou erros sobre erros, durante anos, até a empurrar para a quase falência. A avaliar pelo crescimento verificado na Renault e na Nissan desde que estão juntas, para a Mitsubishi esta compra pode muito bem ser o melhor que lhe podia acontecer.

Apanhada a mentir sobre os consumos dos seus modelos, o que implica igualmente enganar os consumidores e os Estados em relação às emissões tóxicas declaradas – e a correspondente fuga aos impostos, tanto mais grave quanto se percebeu durante a investigação que era uma prática com mais de 25 anos –, a Mitsubishi não tinha uma forma airosa de sair do imbróglio em que se meteu. E este foi apenas o último de uma sucessão de erros, pois há anos que andava a vender os anéis e, em alguns casos, até os dedos.

Esta marca japonesa já foi maior em termos de vendas, mas há que não descurar o seu potencial tecnológico, em que dá cartas numa série de áreas. Mas os problemas financeiros, devido a um misto de falta de visão e má gestão, expuseram-na a contínuas reduções de gama, que apenas serviram para potenciar uma crescente diminuição das vendas. Cessou a produção de veículos em 2008 na Austrália, a que se seguiu a Europa, em 2012 e, três anos depois, nos EUA, isto depois de terem alienado o sector de camiões à então Daimler-Chrysler, em 2003, uma das divisões com maior potencial económico da Mitsubishi Motors.

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Agora com acesso a fundos – os mesmos que permitiram recuperar a Nissan num tempo recorde e fazer crescer a Renault em simultâneo –, vai ser interessante seguir a evolução do construtor, que continua com excelente imagem em diversos continentes e países, a começar pelo nosso. Isto apesar de não apresentar um novo veículo, digno desse nome, há muitos anos.

Os especialistas do sector apostam que, de repente, este fabricante vai voltar a estar representado em cada um dos subsegmentos do mercado automóvel, recorrendo às plataformas e mecânicas da Aliança, reformulando igualmente, por completo, a sua actual gama de SUV e jipes, onde é uma das referências do mercado. E, sob o ponto de vista tecnológico, este construtor nipónico – hoje pelas ruas da amargura, financeiramente – continua a ser um potentado. Há quase uma dezena de anos que, não só fabrica automóveis eléctricos, como os vende à concorrência – o Peugeot Ion e Citroën C-Zero não são mais do que o Mitsubishi MiEV com outra grelha –, muito antes da maioria dos rivais.

E, em termos de competição, é impossível não recordar os sucessos no Campeonato do Mundo de Ralis, quando o Mitsubishi Lancer Evolution venceu quatro títulos de campeão consecutivos entre 1996 e 1999, com Tommi Mäkinen. Ou mesmo os feitos alcançados no mítico Dakar, competição maratona que este construtor venceu, com diversas versões do Pajero, em 12 ocasiões distintas entre 1985 e 2007. Para se ter uma ideia do domínio exercido, nas 11 edições disputadas entre 1997 e 2007, a Mitsubishi triunfou por nove vezes, sete das quais de forma consecutiva (entre 2000 e 2007).