A quarta-feira europeia é um must. Vai daí, luzes, câmara, ação. Na primeira visita de um clube alemão a Alvalade (Carl Zeiss Jena em 1970), isso dá raia. À derrota na RDA por 2-1, o Sporting sai com a bola e acerta três vezes no poste. De repente, o insólito. O inesperado. A luz vai ao ar Literalmente. Um dos holofotes, o da bancada sul, apaga-se e o árbitro interrompe o jogo. Dois adeptos-electricistas entram então pelo relvado dentro para resolver o problema. Meia-hora depois, a luz volta e o Carl Zeiss Jena marca. Acaba 2-1 para os visitante.

Passam-se os anos, vira-se o século. A terça-feira europeia é agora um must. Vai daí, luzes, câmara, ação. Na última visita de um clube alemão, isso dá raia. O Sporting sai com a bola e, de repente, o inesperado. O insólito. A luz vai ao ar. Metaforicamente. Quase todos os holofotes do Sporting apagam-se, à excepção de Gelson. O miúdo acelera, trava, acelera outra vez, dribla e faz mais uma série de malabarismos. O Dortmund sofre aqui e ali, sem o conseguir parar. A Gelson, o único eléctrico em campo. De resto, é uma série de fantasmas, a começar em Markovic. O sérvio perde bolas e mais bolas, além de cair muito no contacto físico com qualquer adversário.

Sem Jesus (suspenso) nem Adrien (lesionado), o leão recolhe as unhas e falta-lhe agressividade (no bom sentido, claro está). Basta ver o número inverossímil de faltas durante a primeira parte – só duas, a primeira delas aos 39 minutos, por ocasião do golo anulado a Coates, por infracção de Bas Dost ao guarda-redes Bürki, no entender do árbitro esloveno Damir Skomina. Atenção, o Dortmund também tem uma palavra a dizer neste aspecto da falta de agressividade. Os alemães defendem muito à frente no campo e essa atitude atrapalha a saída de bola do Sporting. Se a isso acrescentarmos o factor Aubameyang.

O gabonês é um cubo rubik para a defesa do Sporting e isso é mais que evidente aos nove minutos, numa arrancada irresistível pela direita. Ruben tenta travá-lo, em vão. Aubameyang continua o seu caminho, impávido e sereno, até encontrar Patrício pelo caminho. Aí, pica-lhe a bola como uma delicadeza xxl. É o terceiro golo na actual edição da Liga dos Campeões: um em Varsóvia, outro ao Real Madrid, em Dortmund, e agora “isto” em Alvalade. O Sporting demora a recompor-se do golpe. Há um apagão geral. Lá está, salva-se Gelson. Aos 33′, Elias ganha uma bola na área e atira à baliza. Vale a defesa com o ombro de Bürki.

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O Dortmund reage de imediato, com dois lances de perigo: um cabeceamento de Aubameyang a tirar a tinta ao poste e um remate de você-sabe-muito-bem-quem para defesa sensacional de Patrício, no chão, junto à linha de golo. Às tantas, e mais uma vez de forma inesperada, o golo dos alemães. Weigl ganha o ressalto ao capitão William, esquiva-se a Elias e atira forte, à entrada da área. Patrício é batido sem apelo nem agravo. Ao intervalo, 0-2. Qual é a equipa internacional a marcar dois golos em Alvalade na primeira parte? O Atlético Madrid em 2010, bis de Agüero.

Na segunda parte, o Sporting cresce e incomoda Bürki aos 46′, com um pontapé artístico de Gelson. Durante um quarto de hora, o jogo não ata nem desata. Tudo em banho-maria. O Sporting defende melhor, o Dortmund está longe da área. Aos 65 minutos, um atraso de Bartra com o pé direito para Bürki é sancionada com livre indirecto dentro da área. Na ocasião, William pisa a bola e Bruno César atira para o golo. Temos jogo, finalmente. Acto contínuo, Bartra é substituído.

O Sporting aproveita então o momento para encostar o Dortmund. Aos 68′, um momento de frisson provocado pelo lateral Zeegelaar, cujo cruzamento perfeito para a cabeça de Bas Dost deixa Alvalade a suspirar. A bola sai tão tão tão perto do poste. Aos 76′, outra ocasião para o Sporting, com Schelotto a carregar a equipa às costas. Bürki, atento, segura a bola e impede-a que chegue a Bas Dost mais Campbell. O Dortmund acusa o golpe e reage, por Pulisic. A trave salva o Sporting e adia a sentença.

Já com André em campo, no lugar do apagado Bryan, é Campbell a dar nas vistas com roubo de bola mais desmarcação para Gelson. O cruzamento-remate passa a centímetros do poste, com André a chegar atrasado uns quantos milímetros (83′). No quadradinho seguinte (86′), Bürki afasta uma bola com os punhos, exactamente na direcção de Schelotto, cujo cabeceamento é desajeitado, para as mãos do guarda-redes, ainda deitado. Nos últimos dez minutos, cinco deles de descontos, o Sporting volta a recolher as unhas e o Dortmund celebra (e justamente) a segunda vitória em Portugal no ano de 2016, após o autogolo de Casillas no Dragão (1-0), em Fevereiro, para a Liga Europa. Já o Sporting europeu, perde pela primeira vez em casa por 2-1 desde 1988 (Real Sociedad). Se voltar a perder em Dortmund (e se o Real Madrid ganhar em Varsóvia), a equipa de Jesus (o homem volta ao banco daqui a 15 dias) é eliminada da Liga dos Campeões e começa a dedicar-se à Liga Europa.

Estádio José Alvalade, em Lisboa
Árbitro: Damir Skomina (Eslovénia)
SPORTING: Patrício; Schelotto, Coates, Ruben e Zeegelaar; Gelson, Elias (Bruno César, 60′), William e Bryan (André, 79′); Markovic (Campbell, 66′) e Bas Dost.
Trfeinador: Jorge Jesus (português)
DORTMUND: Burki; Passlack (Brunic, 90′), Bartra (Piszczek, 68′), Sokratis e Ginter (Rode, 70′); Weigl; Pulisic, Götze, Kagawa e Dembelé; Aubameyang.
Treinador: Thomas Tuchel (alemão)
Marcadores: 0-1, Aubameyang (9′); 0-2, Weigl (44′); 1-2, Bruno César (67′)