Jim Jarmusch, o autor de filmes como “Stranger Than Paradise”, “Mystery Train”, “Night on Earth” ou “Broken Flowers”, veio ao Lisbon & Estoril Film Festival – do qual destaca a oportunidade de ter conhecido e falado com o actor Jean-Pierre Léaud – apresentar os dois filmes que assinou este ano: “Paterson”, centrado num condutor de autocarro que é poeta, e “Gimme Danger”, um documentário sobre os Stooges, a mítica banda proto-punk encabeçada por Iggy Pop. Isto além de estar envolvido, como produtor executivo, no documentário “Uncle Howard”, de Aaron Brookner, sobre o realizador (e tio de Aaron) Howard Brookner, com quem Jarmusch trabalhou, e “Porto”, de Gabe Klinger.

[o trailer de “Paterson”]

Numa conferência de imprensa, com o seu glorioso e sempre impecável cabelo – branco desde os 15 anos – e a frequente companhia que são os óculos de sol – mesmo dentro de portas –, começa a responder às perguntas dos jornalistas com a clarificação de que nunca trata os seus filmes de forma analítica, e falou das semelhanças entre o novo “Paterson” e filmes anteriores como “Ghost Dog” e em particular “Dead Man”: “São circulares e mostram um ciclo que se completa, uma metáfora para a vida, que é um círculo misterioso… mas não tenho nenhum conhecimento aprofundando sobre o que quer que seja de espiritual para além disso”.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

“Paterson” marca a primeira vez que o realizador trabalha com Method Man, outro rapper do grupo. “Se calhar quando me reformar de fazer filmes já terei tido todo o Wu-Tang Clan no meu trabalho”, diz — excetuando, claro, Ol’ Dirty Bastard, que morreu em 2004. “Na verdade, eu e o RZA queríamos fazer um filme com o ODB quando ele estava na prisão. Queríamos só filmá-lo e pô-lo a falar do que ele quisesse, sobre ser perseguido por discos voadores e a CIA, sobre a história da música funk, sobre o que fosse, tudo aquilo que ele amava e que o preocupava na vida, mas não tivemos permissão para o filmar na prisão e depois ele saiu e morreu pouco a seguir. Teria sido fantástico”, conta.

Ainda fala de outro projeto que tem com RZA, uma série de televisão que marca o regresso a um filme anterior, tal como o ex-colega de faculdade Spike Lee vai fazer com “She’s Gotta Have It” para a Netflix. No caso de Jarmusch, a ideia é pegar em Ghost Dog e tê-lo a ele, a RZA e a Forest Whitaker, o protagonista do filme, como produtores executivos. “Até temos um guião para o piloto que o RZA escreveu com outra pessoa e é fantástico. Eu adoro, não escrevi, só dei umas ideias. Adorava ter uma série baseada no filme com todos estes elementos da cultura hip-hop misturados com artes marciais e crime e ação. Espero que aconteça, mas não sei se vai acontecer”.

Sobre a paixão pelo grupo, explica que são “inovadores musicais, intelectuais que não são refinados pela academia, vêm das ruas de Staten Island e Brooklyn e têm mentes fantásticas, são pessoas incríveis e aprendi muito só por conhecer alguns deles. O Method Man é como a estrela de cinema do grupo, ou, como eles dizem, ‘o bonitão’, faz parte do filme e escreveu as próprias rimas a partir do guião. Estamos bastante orgulhosos”.

[o trailer de Gimme Danger]

https://www.youtube.com/watch?v=6fgiW_S2Hgk

Quanto a “Gimme Danger”, o documentário sobre os Stooges (que passou no festival e também vai passar no Porto/Post/Doc), levou Jarsmusch a falar de Iggy Pop:

“Conheço o Iggy há uns 25 anos e há para aí oito anos ele perguntou se eu faria um filme, não sobre ele, mas sobre os Stooges. Sou um fã enorme do Iggy Pop, mas particularmente um fã dos Stooges. Sisse logo que sim. É uma espécie de celebração deste grupo de rock’n’roll muito particular, incrivelmente inovador e importante particular. É como uma carta de amor, não é um filme analítico sobre todos os podres dos Stooges, conta a história deles, é sobre a música deles e o que eles significam culturalmente falando.”

Veio para falar de cinema e para ver e mostrar filmes, mas não falar da América e das eleições seria difícil: “É uma tragédia, é algo muito trágico e triste. Para o mundo, não só para os americanos. As pessoas têm de ser vigilantes quanto aos ciclos de tendências fascistas”, afirmou.