O realizador português Alberto Seixas Santos, que morreu este sábado em Lisboa, aos 80 anos, deixa uma obra cinematográfica essencialmente marcada pela eclosão do 25 de Abril, pela breve mas intensa vertigem revolucionária que se lhe seguiu e pela desilusão com o seu desaparecimento.

O seu filme mais significativo é “Brandos Costumes” (iniciado em 1972 e estreado em 1975), escrito com Luiza Neto Jorge e Nuno Júdice, no qual a vida de uma típica família da média burguesia serve de correlativo ao antigo regime, desde a ascensão e apogeu até à decadência e ao anúncio do seu fim. Seguem-se-lhe dois filmes colectivos típicos do cinema “revolucionário e de massas” do pós-25 de Abril, “As Armas e o Povo” (1975), e “A Lei da Terra” (1977), este co-assinado por Seixas Santos e Solveig Nordlund e produzido pela cooperativa Grupo Zero, de que foi um dos fundadores e a que pertenceram nomes como João César Monteiro, Margarida Gil ou o diretor de fotografia Acácio de Almeida.

Em 1982, Seixas Santos rodou “Gestos e Fragmentos”, um “ensaio” sobre os militares e o poder em Portugal. Contando com participações de Eduardo Lourenço, do cineasta americano de extrema-esquerda Robert Kramer, grande entusiasta do 25 de Abril e que rodou cá “Cenas da Luta de Classes em Portugal” (1977), e sobretudo de Otelo Saraiva de Carvalho, ao qual é dado longo tempo de antena, “Gestos e Fragmentos” é, para todos os efeitos, um filme dos derrotados do 25 de Novembro, que se resignaram à normalização democrática, refletindo ainda o fascínio de um certo meio intelectual e artístico esquerdista português pela figura de Otelo.

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Seixas Santos dedicar-se-ia depois, e até 2002, ao ensino na Escola de Cinema do Conservatório Nacional e na sua sucessora, a Escola Superior de Teatro e Cinema do Instituto Politécnico de Lisboa, tendo sido também diretor de programas da RTP em 1985. Realizaria ainda mais três longas-metragens de ficção, “Paraíso Perdido” (1995), “Mal”, (1999), um retrato pessimista e desencantado do Portugal do final do século XX e, por extensão, da sociedade ocidental, e “E o Tempo Passa” (2011), bem como uma curta-metragem, “A Rapariga da Mão Morta” (2005).

Nascido em Lisboa, em 1936, Alberto Seixas Santos frequentou o curso de Histórico-Filosóficas da Faculdade de Letras de Lisboa. Estudou cinema em Paris e Londres, foi crítico de cinema e dirigente cineclubista, tendo sido muito influenciado pelo neo-realismo italiano e pela Nouvelle Vague. Mas também por um cinema de autor mais radical, na forma e no discurso politizado, de que foi um intransigente defensor, no que escreveu, na forma como filmou, nos cargos institucionais que exerceu e na influência deles decorrente, e na sua atividade docente.

Pertencente à geração do Novo Cinema português, de que é considerado como o principal teórico, foi um dos fundadores do Centro Português de Cinema, em 1970, apoiado pela Fundação Gulbenkian, a que se deve, nomeadamente o relançamento da carreira de Manoel de Oliveira, com “O Passado e o Presente” (1971), bem como filmes de realizadores como António-Pedro Vasconcelos, César Monteiro, Alfredo Tropa, António de Macedo ou Fernando Matos Silva.

Em 1977, Seixas Santos foi nomeado presidente do IPC-Instituto Português de Cinema, onde se manteve durante alguns anos. Durante a sua vigência no cargo, dizia-se que em Portugal só filmava quem ele quisesse. A Cinemateca dedicou-lhe uma retrospetiva, e em 2014, foi objeto de um documentário, “Refúgio e Evasão”, de Luís Alves de Matos, apresentado no IndieLisboa.