30 das obras da Coleção da Secretaria de Estado da Cultura (SEC) que estão em depósito no Museu de Serralves mostram-se, a partir deste sábado, no Museu de Arte Contemporânea Nadir Afonso, em Chaves. “Corpo, Abstração e Linguagem na Arte Portuguesa” é a primeira exposição temporária que o novo museu recebe e junta nomes fundamentais como Paula Rego, José de Guimarães, Julião Sarmento, Graça Morais e Júlio Pomar. O ministro da Cultura elogia a parceria com Serralves, mas considera ainda “prematuro” falar, quer da renovação do protocolo, quer de uma tutela única para toda a Coleção, espalhada pelo país.

“Mapa-Mundo”, uma longa tela que Nikias Skapinakis pintou em carvão sobre papel, em 1986, é o ponto de partida para as duas salas que compõem a exposição. Um “símbolo da abertura da Coleção SEC para o mundo”, explica Marta Moreira de Almeida, que com Ricardo Nicolau fez a curadoria da mostra. Por norma, as cerca de 500 peças que estão em depósito em Serralves vão sendo mostradas ao público em exposições compostas por peças da coleção própria do museu portuense, ou de outras. Esta é uma das raras vezes em que Serralves olhou só para a Coleção SEC que está sob sua responsabilidade e construiu uma narrativa.

Escultura de António Campos Rosado, em primeiro plano. © Rui Manuel Ferreira

Essa narrativa tem como objetivo “mostrar a abrangência desta coleção”, continua Marta, a duas horas da inauguração, que aconteceu na sexta-feira ao final da tarde, no museu com o qual Nadir Afonso sonhou e que Siza Vieira projetou. Todas as obras foram feitas entre 1964 e 1988, três décadas chave na produção artística portuguesa, pela ousadia dos artistas de romperem com o estabelecido, fruto da influência do que se fazia na Europa e nos Estados Unidos.

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Está lá “A Grande Seca”, de Paula Rego, “O Desejo do Eterno”, de Pedro Cabrita Reis”, um tríptico (sem nome) de António Palolo, a Inês de Castro que José de Guimarães fez em tinta acrílica sobre pasta de papel. Ao centro de uma das salas está uma pintura de Fernando Lanhas, pioneiro na abstração em Portugal. Ao todo, 30 obras de 28 artistas “representativos da nossa história da arte portuguesa“, resume a curadora de Serralves.

(Da esquerda para a direita) Ana Pinho, Luís Filipe Castro Mendes e Marta Moreira de Almeida diante da pintura “Labirinto”, de Jorge Martins. © Rui Manuel Ferreira / Global Imagens

Uma coleção com o rumo por definir

“Corpo, Abstração e Linguagem na Arte Portuguesa” fica em Chaves até ao dia 15 de outubro e, em 2018, seguirá para outras cidades portuguesas, numa lógica de descentralização que tem pautado a programação recente de Serralves. A ideia, repete-se aqui e ali, é que a exposição sirva para salientar a importância da Coleção SEC, embora Marta e os outros curadores de Serralves vejam a coleção SEC ali em depósito e a coleção que Serralves foi adquirindo “como um todo”.

Até 2027 vigora um protocolo que garante que as cerca de 500 obras da Secretaria de Estado da Cultura estão sob tutela do museu portuense. Com 10 anos ainda pela frente, Castro Mendes considera “prematuro” falar agora do futuro a dar a essas obras. Mas elogia “a ótima parceria com Serralves”.

Castro Mendes também não adianta em que fase está a análise à Coleção no seu todo. Em 2014, Jorge Barreto Xavier, à época Secretário de Estado da Cultura, decidiu que a Coleção ficaria sob tutela da Direção-Geral do Património Cultural (DGPC), e que esta seria incorporada no Museu do Chiado, em Lisboa. No entanto, devido a um diferendo entre Serralves e o Museu do Chiado, revogou o despacho em junho de 2015.

Entre vaias e aplausos, já há novo Museu do Chiado

“Esta coleção tem andado sem dono desde 1976, de tal forma que ninguém sabe onde está metade dos quadros”, queixou-se na altura a historiadora de arte Raquel Henriques da Silva, que defende que a coleção tem de ter uma tutela. Em 2015, o Governo PSD-CDS lançou novo despacho para que as direções-gerais das Artes e do Património Cultural, com outras entidades, apresentassem uma proposta para a inserção das obras da “Coleção SEC” na política museológica, um reconhecimento de que a falta de tutela da Coleção carece de melhorias.

Contudo, desde essa altura que não mais se voltou a tocar no assunto. Questionado, Castro Mendes não se alonga no tema. “Há uma reflexão que estamos a fazer e seu tempo diremos alguma coisa”, sublinha.