Cavaco Silva vai voltar a participar num evento relevante do PSD 22 anos depois. Desde o “Congresso dos Congressos” — no Coliseu dos Recreios, em 1995, que marcou o fim do cavaquismo — que o antigo líder não ia a nenhum evento, fosse um comício ou um mero colóquio. Isso vai mudar. O “professor Cavaco Silva” — como prefere ser referido — vai dar uma aula aos alunos da Universidade de Verão do PSD, no dia 30. O tema será “Os jovens e a Política.”

A Universidade de Verão é autónoma do partido e está longe de ser um evento partidário puro, mas marca a ‘reentré’ do PSD (que é feita a dois tempos, com a Festa do Pontal a meio de agosto, neste ano já este domingo dia 13). Não deixa, por isso, de ser significativa a presença do antigo primeiro-ministro e ex-Presidente da República, que nunca tinha participado em nenhuma universidade de verão (que existe desde 2004) nem em qualquer outro evento ‘patrocinado’ pelo partido. A única exceção foi a universidade de verão do Partido Popular Europeu — família europeia do PSD — em 2005, em Lisboa, mas que não fazia parte da agenda política interna do partido.

O vice-presidente do Instituto Sá Carneiro, Duarte Marques, confirma o ao Observador o convite a Cavaco Silva, destacando que é feito “não só pela experiência que tem para transmitir aos jovens, numa intervenção em que falará de política, mas também é uma forma de homenagear o legado que deixou com primeiro-ministro e Presidente da República“.

A ida à Universidade de Verão — que será na quarta-feira, 30, pela manhã — é a primeira intervenção política de Cavaco Silva após ter saído da Presidência da República. Cavaco é também o segundo ex-Presidente da República a participar no evento que dá formação política aos jovens: o primeiro foi Mário Soares.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Duarte Marques explica que para o “Instituto Sá Carneiro e para a Direção da Universidade de Verão é uma honra acolher o professor Cavaco Silva, uma personalidade ímpar na construção do Portugal moderno.” O também deputado do PSD acrescenta que Cavaco Silva esteve “20 anos de mandatos nos dois cargos mais importantes da democracia” e que “o desenvolvimento de Portugal no período de ouro da década de 80 é obra sua.” O vice-presidente do Instituto Sá Carneiro destaca ainda que “como Presidente, Cavaco Silva foi sempre uma referência de estabilidade, alertando no momento certo para os problemas e desafios do país“.

Passos puxa por Cavaco para ‘picar Marcelo?

O mesmo elogio à postura de Cavaco Silva tem sido feito pelo líder do partido a Cavaco Silva em várias circunstâncias. No plano político, os elogios de Passos Coelho a Cavaco Silva como referência de estabilidade, são entendidos como farpas ao atual Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa. Ao que o Observador apurou, Passos Coelho não só concordou como apoiou a ida de Cavaco Silva à Universidade de Verão, embora a decisão dos oradores passe sempre pelo reitor da UV, Carlos Coelho, que tem total autonomia nas escolhas.

Em clima de desconfiança permanente com o atual Presidente da República, Passos Coelho tem feito questão de estar presente em momentos importantes para Cavaco Silva. Foi isso que fez a 23 de julho quando foi de propósito a Santiago Compostela para assistir à cerimónia em que o antigo Presidente recebeu a medalha de ouro da Galiza. O líder do PSD foi convidado a estar na cerimónia e não hesitou em aceitar.

Já em fevereiro, quando Cavaco Silva apresentou o livro “Quinta-feira e outros dias”, Passos Coelho fez questão de estar presente na apresentação do livro no Centro Cultural de Belém.

Cavaco Silva saiu de líder do PSD em 1995 e, mesmo quando liderava o partido, tentava ter o mínimo de intervenção direta possível no aparelho. Sempre quis transmitir a imagem do político que não era político. Até quando assumiu a liderança, passando a imagem de que foi fazer a rodagem de um Citroën ao Congresso da Figueira da Foz e acabou, quase involuntariamente líder.

Suspendeu depois a liderança do partido para se candidatar a Presidente da República, em 1996. Perdeu as eleições para Belém e só voltaria a votos 10 anos depois, em 2006. Ganhou e tornou-se chefe de Estado. Repetiu a proeza em 2011 e ficou, assim, 10 anos em Belém. Durante este período evitou ligações ao PSD e não apareceu em eventos partidários. O mesmo aconteceu quando saiu do Palácio de Belém. Agora, voltou a aparecer.

Sérgio Sousa Pinto, o convidado socialista

O programa da Universidade de Verão de 2017 conta com a presença de um ex-dirigente do PS, que foi líder da JS e que é presidente da Comissão de Negócios Estrangeiros. Sousa Pinto era do secretariado nacional de António Costa, mas demitiu-se por não concordar com a constituição da chamada “geringonça”.

É comum haver socialistas como oradores na universidade de verão do PSD. A edição de 2016, teve o antigo presidente da Assembleia da República, Jaime Gama, mas foram vários outros em anos anteriores: o antigo ministro Luís Amado, o histórico fundador Mário Soares, o antigo ministro António Vitorino.

Do programa constam ainda debates “Eutanásia: Sim ou Não ?”, que colocará frente-a-frente a deputada Paula Teixeira da Cruz (que é pelo sim) e o deputado Ricardo Leite (que é pelo não). O eurodeputado Paulo Rangel, uma das presenças mais assíduas nos últimos anos na UV, irá dar uma aula com o tema “Portugal e o futuro da Europa”.

Os incêndios também vão ser alvo de debate na Universidade de Verão do PSD, com um painel com o mote: “Porque é que Portugal arde tanto?” O vice-presidente da câmara de Mação, António Louro, e o antigo adjunto de Operações Nacional da instituição Autoridade Nacional de Proteção Civil, Marco Martins.

Entre os vários oradores estarão o comissário Carlos Moedas, o antigo ministro Miguel Poiares Maduro, o deputado Miguel Morgado e a relatora especial da ONU para a água e saneamento, Catarina Albuquerque. O encerramento será feito no domingo numa cerimónia que contará com discursos do líder da JSD, Simão Ribeiro, do reitor da UV, Carlos Coelho, e do líder do partido, Pedro Passos Coelho.