Moçambique vai continuar sem pagar aos credores pelo menos até 2023, segundo um relatório do Fundo Monetário Internacional (FMI), que prevê também que o país se mantenha com uma dívida insustentável, impossibilitando um programa de assistência financeira.

De acordo com a agência de informação financeira Bloomberg, que teve acesso ao documento que será debatido na sexta-feira pela direção do FMI, Moçambique não tenciona pagar aos credores até 2023, ano em que as receitas da exploração de gás natural deverão começar a chegar em força aos cofres do Estado.

“É nosso entendimento que as autoridades [moçambicanas] planeiam continuar sem fazer quaisquer pagamentos sobre os empréstimos em incumprimento financeiro” pelo menos até 2023, escreveram os autores do relatório sobre a Análise da Sustentabilidade da Dívida, que será debatida pela direção do FMI juntamente com a análise anual da economia de Moçambique, ao abrigo do conhecido Artigo IV.

“A dívida de Moçambique está atualmente em ‘situação problemática’ [‘debt distress’, no original em inglês], e a dívida pública total está numa trajetória insustentável”, escrevem os peritos do FMI, que notam que qualquer reestruturação da dívida com os credores tem de levar em conta o risco de existirem mais atrasos nos projetos de exploração de gás natural.

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A consideração do FMI sobre Moçambique estar em ‘debt distress’ é particularmente importante para o país, uma vez que as regras do Fundo impedem a celebração de um programa de assistência financeira a países que tenham uma dívida insustentável, sendo necessário, para ultrapassar a situação, a celebração de um acordo prévio que estipule um conjunto de medidas de austeridade para depois garantir o financiamento da instituição liderada por Christine Lagarde.

Moçambique anunciou a realização de uma série de reuniões com os credores em Londres, no dia 22, para apresentar o plano de reestruturação da dívida pública.

Nas declarações aos jornalistas, o ministro das Finanças moçambicano, Adriano Maleiane, referiu que 87% do ‘stock’ de endividamento de Moçambique tem origem multilateral (com instituições financeiras) ou bilateral (acordada entre países) e em relação a essa parcela maioritária “não há problemas absolutamente nenhuns”.

“O que estamos a discutir representa 17% [do ‘stock’], mas 50% do serviço de dívida total. Por isso é um problema e é com isso que estamos a negociar”, concluiu.

O rombo nas contas públicas surgiu em 2013 e 2014, quando três empresas públicas com negócios de fachada, segundo uma auditoria internacional, contraíram dívidas de cerca de dois mil milhões de dólares, com base em garantias do Estado assinadas à revelia da lei, dos doadores internacionais e das autoridades nacionais, naquele que ficou conhecido como o escândalo das dívidas ocultas.

O destino da maior parte do dinheiro continua por apurar, justificando as empresas que se trata de matéria de segurança nacional.

Entre os credores, há detentores de 727,5 milhões de dólares em títulos de dívida, que já aceitaram uma redução nos pagamentos e uma extensão do prazo da maturidade, o que levou diretamente à descida do ‘rating’ de Moçambique para ‘default’, ou incumprimento financeiro.

Os detentores destes títulos (que resultam da troca por obrigações da Ematum) recusam ser equiparados a bancos e investidores que emprestaram os restantes 1,4 mil milhões de dólares às empresas públicas Mozambique Asset Management (MAM) e à Proindicus.

Os bancos que emprestaram o dinheiro foram o Credit Suisse e o russo VTB, cujo presidente, Andrey Kostin, disse há um mês à Bloomberg querer reunir-se com o Presidente de Moçambique, Filipe Nyusi, “para o convencer a negociar” o pagamento da dívida do país.

A agência de notação financeira Standard & Poor’s (S&P) deu como provável no início de fevereiro uma reavaliação do ‘rating’ de Moçambique “para emissões em moeda estrangeira, depois de a reestruturação estar completada, embora o prazo não seja ainda claro”.

A S&P mantém o país no nível mais baixo de classificação, ou seja, SD (‘selective default’, no original em inglês) devido ao incumprimento na remuneração de títulos em divisa externa, colocando-o no patamar B- para emissões de dívida soberana de curto prazo em moeda local e em B para longo prazo.