Pelo lado direito, porta fechada. Pelo meio, porta fechada. Pelo lado esquerdo, porta fechada. Não estava propriamente fácil ter acesso ao interior do espaço no edifício Éden, nos Restauradores, onde Bruno de Carvalho inaugurou esta quinta-feira a sua sede de campanha para as eleições de dia 8 de setembro. O mesmo espaço que, menos de uma hora antes, não se sabia ao certo se seria inaugurado. Ou se, pelo menos, servirá mesmo para alguma coisa. E era disso que se falava cá fora entre as dezenas de apoiantes do antigo presidente do Sporting que esperavam pelo ex-líder para acederem ao interior do espaço.

“Quanto é que levou?”, perguntava-se. “Um ano? Um ano? Isso é esse malandro do Marta Soares”, respondia um outro adepto que estava ali ao pé mas não demorou a meter-se na conversa. Há feridas que, por maiores ou mais pequenas que depois possam demonstrar-se em termos de universo leonino, estão por sarar. Mas nem mesmo essa notícia acabou por desarmar os presentes, que passaram por cima de um facto incontornável: se as eleições do clube fossem amanhã, Bruno de Carvalho estava fora. No meio disto, começamos também a perceber o porquê  das portas fechadas – a ideia era que aquele aglomerado de pessoas se juntasse a quem estava no interior do espaço quando o ex-presidente chegasse, mas os jornalistas poderiam aceder ao local onde já estavam alguns membros das listas, família e amigos do antigo líder mais cedo, por uma porta lateral.

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Inês Simões começou então a chamar os elementos que, perante o atual contexto, lutarão em tribunal ou em Assembleias por ir a votos. Primeiro do Conselho Fiscal e Disciplinar, depois da Mesa da Assembleia Geral, por fim do Conselho Diretivo. Pelo menos metade acabou por não estar presente, por motivos profissionais que foram sendo enunciados pela apresentadora do evento. Até que chegou à zona do pequeno palanque Bruno de Carvalho, que foi direto ao assunto e comentou com ironia as ausências: “Bem, pelo número de pessoas estava já a pensar que só podiam cá vir os suspensos”. “Oh Bruno, mas não foste notificado!”, atirou um dos apoiantes. “Fui, fui”, confidenciou. “Não foste nada notificado”, continuou. “Já fui, já fui”, repetiu.

Se dúvidas ainda existissem, as mesmas tinham ficado dissipadas ali. Da mesma forma como, se dúvidas ainda existissem sobre a resposta do presidente destituído em AG, as mesmas também não demoraram a ser dissipadas. Antes, houve tempo para explicar o porquê de ter avançado com uma candidatura no seguimento da “derrota” de 23 de junho no Altice Arena.

“Estamos aqui a demonstrar a nossa força e o nosso apoio a um Sporting forte, vencedor e independente; um Sporting eclético, que não se resigna face às dificuldades; um Sporting influente e dono do seu destino; um Sporting exigente, sem lugar ao discurso do coitadinho. Somos verdadeiramente leais ao Sporting e queremos de volta o ‘Crónico’, assim como queremos de volta o Sporting que é dos sócios e para os sócios. É por isso que apresentei a minha candidatura e estou mais determinado do que nunca, depois de um período muito difícil, em que fui alvo de uma campanha negra, nunca vista no futebol português”, comentou.

“Quem não deve, não teme e é por isso que sou candidato. Quem não deve, não teme e é por isso que, mais uma vez, peço aos atuais responsáveis do Sporting que aceitem a minha candidatura e a de todos os sócios que se queiram apresentar a eleições. Quem não deve, não teme. Não matei ninguém, não roubei ninguém, só procurei defender os interesses do Sporting, segundo a informação que tinha em cada momento, perante uma sucessão de acontecimentos estranhos e avassaladores! É por isso que mereço uma segunda oportunidade, para retomar o caminho de sucesso iniciado em 2013″, prosseguiu, antes de voltar a dizer que tudo poderia ser diferente se tivesse aceite algumas “exigências”. “Não pensei em mim, pensei no Sporting”, disse.

“Hoje sou o mesmo Bruno mas, agora, sou um Bruno mais experiente, um Bruno que aprendeu com os erros, um Bruno mais preparado para os enormes desafios que se colocam ao Sporting (…) Fui ingénuo e voluntarista na defesa dos superiores interesses do Sporting mas mesmo assim, acusaram-me de tudo. O Sporting foi vítima de um ataque planeado contra o rumo certo que tínhamos iniciado com o novo mandato em 2017 e, hoje, apoiar Bruno de Carvalho é quase um ato de coragem e resistência. Não temos medo, as grandes vitórias começam assim. Tenho comigo uma grande maioria silenciosa. De Norte a Sul, há milhares de sportinguistas comigo, uns que dão a cara, outros que mandam mensagens de apoio”, realçou.

De seguida, Bruno de Carvalho admitiu que a sua candidatura “ainda não foi aceite” mas deu dez razões para que isso venha a acontecer, puxando dos galões em relação a alguns dos aspetos que terá mudado nos últimos cinco anos em Alvalade:

1 – “Dei património ao clube com a construção do Pavilhão João Rocha”;
2 – “O Sporting teve e terá sempre uma posição dominante na SAD”;
3 – “O Sporting assinou o maior patrocínio de um clube de futebol em Portugal, 515 milhões até 2028”;
4 – “A época de 2017-2018 foi a melhor da história desportiva porque fomos campeões em andebol, atletismo masculino e feminino, futebol feminino, futsal, hóquei em patins, ténis de mesa ou voleibol”;
5 – “O ciclismo voltou às estradas de Portugal”;
6 – “A Sporting SAD começou a dar lucros depois de anos e anos de prejuízos e da falência iminente”;
7 – “O Sporting aumentou o número de sócios de cerca de 90 mil para quase 180 mil, o que permitiu aumentar o valor para as modalidades através da quotização para os nove milhões”;
8 – “A assistência média em Alvalade quase duplicou, passando de 26.500 pessoas em 2012/13 para 43.500 pessoas em 2017/2018, o que quase que triplicou as receitas”;
9 – “O Sporting tornou-se mais forte e mais eclético, passando de 35 modalidades que iam acabar para 55”;
10 – “Muito importante, devolvi aos três milhões e meio de sócios e adeptos o orgulho de serem sportinguistas”.

“Quando cheguei havia três meses de ordenados em atraso com os jogadores a poderem rescindir com justa causa, modalidades desmotivadas e sem apoios, um PER em cima da mesa, uma falência iminente. Fui eu que tirei o Sporting desse buraco negro da nossa história. O que hoje estamos a ver é um interesse eleitoral muito grande num clube que cresceu. Construímos o poço de petróleo e agora não faltam candidatos mas o problema é que o Sporting precisa de um líder que o ame e respeite, com carisma, frontalidade, que coloque os interesses do clube em primeiro lugar. Com todo o respeito pelos outros, esse líder sou eu. O Sporting precisa de paz, estabilidade e unidade, tenho obra feita, um projeto e peço que me deixem continuar”, rematou.

Bruno de Carvalho e a “segunda oportunidade”, do exemplo de Guardiola ao MBA tirado em três meses

Em resposta a algumas perguntas, Bruno de Carvalho voltou a destacar que não considera a Comissão de Fiscalização legitima e prometeu avançar com tudo para poder concorrer no próximo sufrágio eleitoral do clube verde e branco.

“Não reconheço a Comissão de Fiscalização, para mim todo este processo é ilegal e o email que me mandaram foi para o spam. Não me considero suspenso de absolutamente nada. O processo é todo ilegal. Digam à Comissão que estiveram aqui centenas que não vão desmobilizar e vão ser obrigados a levar-nos a eleições. Se vamos agir? Já agimos com várias providências cautelares. Reparem que alguém que está à frente de uma Comissão ilegal e que é antiestatutária escreveu que ou se afastava o presidente ou então todos tinham de se afastar do Sporting. Com isto, está tudo dito. Mas não serão cinco pessoas da Comissão de Fiscalização e mais uma Comissão de Gestão ilegal que se podem sobrepor à vontade de centenas de milhares de sportinguistas”, atirou, antes de ironizar também sobre a passagem de Zeferino Boal para a lista de José Maria Ricciardi: “Foi uma perda para os sportinguistas, era um excelente candidato… Mas acredita que Ricciardi é muito melhor e só estou ansioso por poder debater com todos os candidatos. A única coisa que quero é ir a votos”, concluiu.

No final do discurso já tinham caído balões verdes e brancos, de seguida foi descerrado um pano branco a assinalar a abertura oficial da sede de campanha. Tudo em ambiente de festa, no dia em que Bruno de Carvalho teve pouco para festejar.