De uma ou outra forma, de maneira mais ou menos direta, Bruno de Carvalho, presidente do Sporting destituído no passado dia 23 de junho em Assembleia Geral, continua a marcar a agenda leonina. Basta ver as declarações de Jaime Marta Soares, líder demissionário da Mesa que garantiu a independência da Comissão de Fiscalização que está a analisar o processo disciplinar dos antigos dirigentes mas que pediu celeridade na conclusão do mesmo. Basta ver o documento assinado por um grupo de sócios como Miguel Poiares Maduro, Samuel Almeida, Rodrigo Roquette ou Jaime Mourão Ferreira, que teve também esse dado em conta e os problemas que daí poderão surgir. Basta ver os constantes rumores que dão conta de uma inevitável suspensão enquanto associado que o tiraria da corrida eleitoral. Alheio a tudo isso, o antigo número 1 vai mantendo as suas iniciativas, marcando presença esta noite de terça-feira na Sport TV+. E mostra-se disposto a tudo na luta para ir a votos.

O tempo do Bruno de Carvalho presidente acabou. O de sócio vai ficar suspenso. O de candidato, nunca se sabe

“Estamos a fazer tudo para sermos candidatos. Acredito num país democrático e livre, sabendo dos atropelos e ilegalidades que têm sido cometidas. Há um grupo de associados que pretende marcar uma Assembleia Geral para resolver quem vai ou não às eleições. Acredito que pela lei, não pelas pessoas que lá estão, vamos conseguir. Como dizia Jaime Marta Soares numa reunião, a máquina estava em funcionamento e não havia nada a fazer, agora percebo o que é a máquina. Depois, acredito que as sondagens feitas não dão resultados muito favoráveis e é preciso afastar o ex-presidente destas eleições. Quem não quer que seja candidato? Todos os candidatos e todas estas putativas comissões que andam no Sporting. Marta Soares começou algo ilegal não para terem atos de gestão corrente mas para me afastarem. Até já se fala que posso ser castigado e Carlos Vieira não…”, destacou.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

“Não se pode deixar para amanhã o que se pode fazer hoje”, diz Marta Soares sobre processo disciplinar a Bruno de Carvalho

“Tenho pena porque o Sporting devia ter a paz para fazer as eleições e se sou uma pessoa tão mal vista teria a resposta nas urnas. Sabe, as pessoas acham que não devo fazer ataques, devo ser mais institucional… Vou tentar. Antes da AG já estava destituído, isto deve ser um caso de estudo mundial porque antes já estava suspenso de sócio. E tudo numa AG com um artigo dos estatutos que não existe! Não há uma alínea que diga que o presidente da Mesa podia marcar uma AG assim, disseram-me que podia falar lá e depois afastaram-me… É verdade que às 5h30 desse dia tive um sentimento de frustração muito grande mas o Sporting é mais forte, é como quando dizemos a um filho ‘Não quero mais ouvir-te etc.’ mas não tem interesse nenhum. Repare: muita gente votou ‘sim’ mas não se apercebeu de algumas coisas como por exemplo Marta Soares ter dito que se fosse destituído me podia recandidatar e que por trás daquilo havia uma nota de culpa que se fosse explicada era diferente, porque é algo vergonhoso que quase me chama criminoso e ninguém pessoas com que falo sabia o que dizia”, prosseguiu.

É oficial: direção de Bruno de Carvalho destituída por 71,36% dos sócios. Houve tensão à saída da AG

Voltando a utilizar a expressão “linchamento popular” para descrever todo o processo, Bruno de Carvalho explicou também o porquê de querer lutar pelo regresso à presidência. “Move-me a forma como tudo aconteceu, a forma como os resultados foram anunciados que me colocam muitas dúvidas… Tenho a noção claro que foram cinco anos e meio de trabalho árduo, com as pessoas a esquecerem-se que quando cheguei todos os jogadores podiam rescindir por salários em atraso. Passei de 500 milhões de dívidas para 250, tive o único mandato positivo na SAD e no clube. Sou a prova provada que é possível agarrar numa SAD falida para torná-la sólida, dei património, criei equipas competitivas, no último ano houve um investimento de 100 milhões, nas outras 54 modalidades fomos campeões em 54… Não é por acaso que um rival está há 30 e tal anos e outro também há muito tempo. Os sportinguistas têm gratidão, têm memória e darão uma segunda oportunidade para levar o meu projeto até ao fim, mantendo o ecletismo com equipas seniores masculinas de râguebi e basquetebol, que é o que falta. Não se retira do clube alguém que tem este know how e que já passou por isto tudo, todos devem dar essa oportunidade. Os mais velhos, como o meu pai ou o meu avô, estavam habituados ao ‘Crónico’, que ganhou oito Campeonatos em dez anos; agora, deixem-me dar isso aos filhos e aos netos deles, sem ligar tanto à forma como às vezes parece ligarem tanto”, frisou.

“Para fazer um contrato de 515 milhões com a NOS não foi fácil, para fazer a reestruturação financeira não foi fácil, ir ao Mónaco para o primeiro sorteio e perceber que as pessoas não sabiam que símbolo era aquele que tinha no casaco foi frustrante… Tenho a certeza que me vão dar uma segunda oportunidade porque vão perceber que sou o mesmo Bruno. Quando entrei tinha um bacharelato, em cinco anos fiz a licenciatura, nos últimos três meses fiz um MBA. Queremos um Sporting dos sportinguistas, com a mesma vontade de sempre de ganhar títulos”, completou a esse propósito num claro “piscar de olho” a um elitorado mais velho que nunca foi o seu, antes de falar também sobre o que se passou depois da AG de fevereiro.

O dia em que o Sporting coloca na balança quatro anos de construção e quatro meses de destruição

“Reconheço que, em fevereiro, as pessoas que me rodeavam não eram as pessoas ideias, pelas atitudes que estavam a tomar, porque estavam a mudar e agora percebo melhor o porquê. Fizemos uma primeira AG no dia 4, foram votados todos os pontos menos dois e convenci os restantes membros da Direção que se não tivéssemos 75% iríamos sair. Se forem recordar isso, comecei o discurso a dizer que ia votar ‘não’ e votei mesmo que ‘não’. Se fossem 400 ou 500 pessoas, não iria passar. Os 90% acabaram por ser um problema mas senti que era preciso mudar algumas coisas nas listas. Fui também muito criticado pelos estatutos e pelo Regulamento Disciplinar e quem esteve à frente desse processo nunca se chegou à frente para dizer que tinha sido ele e não eu”, contou entre muitas outras críticas à anterior equipa, fator que acabou por contribuir também para o que se viria a suceder nos meses seguintes até à destituição em reunião magna a 23 de junho.

Os negócios de Roquette, o sonho de Rogério Alves e o legado de João Rocha: Bruno de Carvalho abre AG ao ataque

“O post de Madrid veio numa fase muito complexa da minha vida… Se fazia hoje? É lógico que, como dizia o João Pinto, prognósticos só no fim do jogo. Se soubesse a forma como se empolou tudo… No balneário? Quando tive uma intervenção em Chaves no balneário também fui criticado. O que mudou desde fevereiro? Se calhar, como disse o treinador, foi o vento, porque perdemos na Amoreira… O post foi pensado e refletido e quero dar o exemplo de Pep Guardiola, que arrasa a equipa na flash interview, no jogo a seguir jogam muito bem e no final disse no balneário que não lhe interessa se gostam ou não dele mas sim se ganham ou não. Eu sabia o que se passava no balneário, o problema não era o presidente, mas a seguir tivemos seis vitórias, seis voltas olímpicas. Daí ter escrito num SMS mais ou menos isso: ‘Tenho pena que seja desta forma, mas se jogassem assim tínhamos sido campeões’. O que correu mal? Não termos ganho ao Benfica em casa, porque não se pode ter um jogo daqueles quando estão em causa milhões de euros. Não guardo rancor aos jogadores e tenho de admitir que se não fosse o Rui Patrício tínhamos levado uma tareia quando vínhamos de seis vitórias… Falei com Jesus, disse para não me enervar, que bastava ganhar na Madeira e voltamos a não ter uma exibição condizente”, recordou sobre os últimos encontros da temporada.

“Em vez de 11, fomos nove”. Bruno de Carvalho faz a sua “crónica” e critica vários jogadores do Sporting

“O terceiro lugar trouxe o sentimento de frustração, depois já era por causa do post, disto, daquilo… Começaram a tentar arranjar um pouco de tudo e a Academia foi o final, um crime hediondo onde apanharam uma frase descontextualizada minha. Foi um crime que tem de ser severamente punido mas pegaram nisso para dizer ‘O Bruno não está bem’. Orquestrado? Se existe um cordão policial na Madeira, porque é que está um adepto do Sporting lá dentro? Porque é que um canal guardou imagens com legendas e tudo 15 dias com ameaças e a dizer que iriam lá terça-feira? No dia anterior, tive reuniões com equipa técnica e jogadores e ninguém me falou disso, não consigo perceber”, prosseguiu, pormenorizando também algumas incidências sobre o ataque em si e sobre a entrada dos invasores já depois da primeira chamada de alerta para a polícia: “Jamais pediria essas coisas do ‘apertãozinho’, não sou assim porque se for preciso a 24 jogadores dou eu, não preciso de nada. Acredita que um presidente, depois de perder o Campeonato e a quatro ou cinco dias da final da Taça de Portugal com o Desp. Aves, fazia isso? No final da temporada? Sou um líder, trabalho 24 sobre 24 horas mas não sou uma personagem da Marvel, não consigo saber tudo. Mesmo depois disso, bastava ter pago os sete milhões ao Jorge Mendes, pagar o que pediam os representantes do Bruno Fernandes, do Battaglia, do Leão e do Dost e hoje estava aqui a dar uma entrevista ainda como presidente”.

As longas 96 horas que envergonham o Sporting

Admitindo que, caso tivesse ficado no Sporting, Jorge Jesus não seria treinador para a nova temporada, Bruno de Carvalho falou de José Peseiro e de algumas questões da liderança interina na SAD. “Conheço Peseiro há dez anos, sempre tive uma relação cordial mas houve uma série de pessoas que foram mandadas embora por email e vou ter de resolver uma série de assuntos. Houve outro treinador que foi mandado embora de uma forma que pode trazer problemas, não se despede nem num avião um treinador a caminho de Portugal nem por email. Sousa Cintra esteve mal nas duas vezes mas irei resolver caso seja eleito todos os problemas. Há algo que me assusta: o orçamento para este ano devia ser de 75 milhões e acho que vai passar. Peço que parem e que o próximo presidente tome conta dos assuntos porque parece que deixei lá um poço de petróleo ou uma mina de ouro. O que vai encontrar a auditoria forense? Coisas tão interessantes como… nada! Financeiramente o Sporting está bem, aqueles 40 milhões que falam já estavam reconhecidos e é normal, dos três é a menor. Tesouraria é outra coisa. Em quatro anos, dei um lucro de 20 milhões. É engraçado que a CMVM não permite que esta Comissão de Gestão faça o empréstimo obrigacionista, a entidade reguladora percebeu que era ilegal”, advogou o antigo presidente do Sporting.

Mihajlović deixa o Sporting e o novo treinador é apresentado na próxima semana

“Não tenho dúvidas que sou o homem do ‘faz acontecer’, agora com uma equipa que não sabendo se posso ou não candidatar-me acredita no meu carisma. Nove candidatos? Porque deixei lá um poço de petróleo, uma mina de ouro… Agora é fácil, existe o contrato da NOS que se iniciou agora e vai até 2028, uma negociação que estava a fazer para pagar parte da dívida, a renegociação da compra das VMOC por 30 cêntimos, 180 mil sócios, um Pavilhão que a SAD quer ficar com ele porque diz que o dinheiro foi passado de forma ilegal para o clube. Modalidades? O que fiz foi a passagem de 100% das quotas para o clube e o acordo com a NOS, que tinha uma verba para a TV e outra para o clube. Não admito que andem a vender que são pelo ecletismo e pelo reforço das modalidades e depois querem passar o futsal para a SAD e acabar com mais de metade”, concluiu.

Comissão de Fiscalização diz que aprovar orçamento “é um cheque em branco à Direção para aumentar passivo”