22 de Janeiro de 1956. Belenenses e FC Porto defrontavam-se no Estádio Nacional na 15.ª jornada do Campeonato Nacional, com os dragões a vencerem por 1-0, golo de Hernâni. Na altura, o Estádio do Restelo ainda não existia (seria inaugurado mais tarde nesse ano) e o Belenenses jogava os seus encontros no histórico campo das Salésias, mas acabaria por disputar o clássico azul no Jamor, por motivos de logística.

Mais de 60 anos depois, a logística é outra e bem mais complicada: o Belenenses dividiu-se em dois, entrou numa guerra complexa e a SAD, que detém a equipa de futebol inscrita na Primeira Liga, acabou despejada do Restelo pelo clube Belenenses. Resultado: na temporada 2018/19, os comandados de Silas terão o Jamor como casa emprestada.

E a estreia do Belenenses no Campeonato não podia ter sido mais digna de final de Taça, cheia de emoções, casos e intervenientes decisivos. Foi com dentes de Leite, pezinhos de lã e a ajuda de uma mão na bola que o FC Porto levou a melhor sobre os de Belém e repetiu a história de há 62 anos, com a emoção redobrada. Diogo Leite, o mais jovem em campo, marcou na primeira parte, Otávio, na primeira interceção bem sucedida no encontro, ampliou no segundo tempo, mas Fredy e Keita igualaram o marcador, obrigando Alex Telles a ter frieza para marcar a grande penalidade decisiva no sétimo minuto de compensação, a segunda assinalada por Carlos Xistra durante o encontro.

Belenenses sai do Restelo e passa a jogar no Jamor

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O Belenenses entrou a querer mostrar quem mandava na sua casa emprestada e surpreendeu os campeões nacionais nos minutos iniciais com arrancadas rápidas e um pendor ofensivo superior ao que se poderia esperar. Enquanto nas bancadas eram os adeptos do FC Porto quem mais se fazia ouvir, no relvado eram os comandados de Silas a deixar o primeiro aviso, com Keita a atirar forte, mas por cima do alvo.

O Belenenses procurava sair a jogar desde trás, conservando a posse de bola e chegando à área adversária em ataque organizado, mas muitas vezes corrias riscos desnecessários: Muriel entregou a bola ao meio campo do FC Porto e por pouco Aboubakar não ficou na cara do golo, antes de Brahimi quase fugir depois de nova recuperação de bola portista em zonas avançadas do terreno.

Ficha de jogo

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Belenenses-FC Porto, 2-3

2.ª jornada da Primeira Liga

Estádio do Nacional, no Jamor

Árbitro: Carlos Xistra (AF Castelo Branco)

Belenenses: Muriel; Sasso, Zacarya Bergdich, Gonçalo Silva, Diogo Viana (Sagna, 70′); Matija Ljulic (Dálcio, 39′), Nuno Coelho, Jonatan Lucca; Fredy, Licá (Henrique, 66′) e Keita

Suplentes não utilizados: Mika, Nuno Tomás, Reinildo e Kikas

Treinador: Silas

FC Porto: Casillas; Felipe, Diogo Leite, Maxi, Alex Telles; Herrera, Otávio (Óliver, 73′), Sérgio Oliveira; Brahimi (Hernâni, 81′), Aboubakar e André Pereira (Corona, 64′)

Suplentes não utilizados: Vaná, Chidozie, Adrián e Marius

Treinador: Sérgio Conceição

Golos: Diogo Leite (26′), Otávio (46′), Fredy (55′), Keita (83′) e Alex Telles (90+7′)

Ação disciplinar: cartão amarelo a Diogo Leite (54′), Aboubakar (71′), Felipe (89′) e Lucca (90′)

O equilíbrio era a nota dominante de um encontro que encontrava nas tentativas de construção de jogo em zonas recuadas a maior fonte de oportunidades de golo… mas para as equipas adversárias. Já depois da defensiva do Belenenses ficar em sentido com perdas de bola evitáveis, foi a vez de Casillas ver Felipe atrasar-lhe uma bola que por pouco não ficou nos pés de Keita, com o avançado a incomodar o guardião espanhol e a ganhar mesmo um pontapé de canto.

Não estava fácil para nenhuma das equipas conseguirem construir realmente jogadas dignas de registo, mas tudo mudou em três minutos e a favor dos campeões nacionais. Já depois de Maxi Pereira ver André Pereira desviar um cruzamento seu direitinho à barra defendida por Muriel, aos 23 minutos, (naquele que foi o primeiro remate do FC Porto na partida), foi Alex Telles quem cruzou com conta, peso e medida para a cabeça do jogador mais novo em campo, Diogo Leite, que cabeceou para o fundo das redes.

Era a estreia a marcar de Diogo Leite ao fim de 34 jogos enquanto sénior e do terceiro encontro ao serviço da equipa principal do FC Porto. Mas mais importante do que isso, era o desbloquear do marcador a favor dos dragões, num encontro que não estava nada fácil para o conjunto de Sérgio Conceição.

Daí até ao intervalo, tudo foi mais simples para os dragões, que tomaram as rédeas do encontro e quase ampliaram o marcador em cima do descanso por intermédio de Maxi Pereira, que atirou cruzado, mas ao lado.

E na segunda parte nem deu para respirar. Otávio tinha sido o último a entrar em campo por estar a receber indicações de Sérgio Conceição junto à linha lateral e, com 40 segundos jogados, feriu o Belenenses onde o conjunto de Silas mais se expunha: troca de bola no seguimento do pontapé de saída, tentativa de atraso de Dálcio para Muriel, e Otávio, com pezinhos de lã na sua primeira ação defensiva, a interceptar o passe, contornar o guarda-redes e ampliar a vantagem azul e branca.

O Estádio Nacional está feito para grandes emoções e o Belenenses quis honrar a história da sua nova casa, mas precisou de esperar pela decisão de Carlos Xistra. É que o árbitro de Castelo Branco deixou o jogo seguir depois de a bola embater na mão de Diogo Leite na área, mas acabou por ser chamado por João Capela, no VAR, e, depois de consultar as imagens, decidiu-se pela grande penalidade a favor do Belenenses.

Fredy colocou a bola na marca, deu um, dois, três passos vagarosos, fixou Casillas no centro da baliza e atirou para a direita, a fazer andar o marcador.

O jogo partiu-se, o Belenenses podia ter chegado ao empate pouco depois por intermédio de Licá, mas Brahimi também podia ter feito o terceiro dos dragões na cara de Muriel. Keita, servido por Henrique, obrigou Casillas a aplicar-se para evitar a igualdade, a pouco menos de quinze minutos do final.

E, quando já havia adeptos do FC Porto a abandonar o recinto, pensando talvez que a vitória já estava no bolso dos campeões nacionais, Keita surgiu nas alturas para fazer a festa da Ta.. perdão, da Primeira Liga: lançamento longo nas costas da defesa azul e branca, bom trabalho de Fredy a servir o avançado ao segundo poste para o golo da igualdade, com menos de dez minutos por jogar.

Os dragões queriam repetir a vitória de há 62 anos, mas tinham os olhos no presente e sabiam que os três pontos eram vitais para não deixar fugir Benfica e Sporting já no início do Campeonato. Lembram-se da história do Jamor estar talhado para grandes emoções? Pois é, ainda havia tempo para mais e novamente com Carlos Xistra no centro da decisão, ao consultar novamente o VAR depois de bola no braço, desta feita na área contrária.

O lance foi entre Herrera e Henrique, mas quem saiu a ganhar foi o FC Porto, já que o juíz de Castelo Branco decidiu-se pela grande penalidade e Alex Telles, com frieza, não desperdiçou.

Mais de 60 anos depois, a história repetiu-se mas a emoção redobrou. Quando tudo parecia encaminhar-se para uma vitória tranquila do FC Porto, os azuis do Restelo que jogam no Jamor puxaram dos pergaminhos e obrigaram os campeões nacionais a suarem para levarem a melhor num palco que está habituado a grande emoções e que hoje acolheu um encontro que, não fosse valer três preciosos pontos para o futuro dos dragões na Primeira Liga, poderia perfeitamente ser de final da Taça.