Parece estranho mas é verdade. Na Coreia do Norte, onde grande parte das ações e decisões da população é controlada pelo Governo e pelas autoridades, os supermercados são cada vez mais uma realidade económica. Existem 436 supermercados licenciados na Coreia do Norte que, todos juntos, rendem cerca de 56,8 milhões de dólares por ano ao Governo através de impostos e rendas.

De acordo com uma investigação divulgada este domingo pelo Centro para Estudos Estratégicos e Internacionais, baseado em Washington, o maior de todos os supermercados norte-coreanos — que fica em Chongjin, a terceira maior cidade do país — lucra anualmente cerca de 850 mil dólares. A rede de supermercados na Coreia do Norte começou a expandir-se a partir de 2002, impulsionada pela intensificação das relações comerciais entre o país e a vizinha China.

O processo começou quase espontaneamente e tornou-se uma maneira de os cidadãos conseguirem uma atípica subida de poder de compra e de qualidade de vida, na medida em que se viravam para o comércio para fugir à pobreza. Com o passar dos anos e a proliferação dos supermercados, o Governo começou a encorajar o fenómeno para aliviar as pressões sociais, políticas e económicas. Ainda assim, quando necessário, o Estado norte-coreano atrofiou o desenvolvimento dos supermercados e complicou o seu funcionamento. O site Quartz partilhou um mapa onde é possível ver a distribuição dos supermercados pela Coreia do Norte.

Fonte: Quartz

De acordo com um inquérito recente feito pelo mesmo Centro para Estudos Estratégicos e Internacionais, 83% dos cidadãos norte-coreanos considera que os bens e a informação estrangeiros que adquiriram através dos supermercados teve um maior impacto nas suas vidas do que as decisões do Governo. A mesma investigação testemunhava o desagrado da população com as tentativas do Estado de renomear a moeda norte-coreana ou desvalorizá-la, acabando por basicamente retirar todo o valor ao dinheiro que as pessoas guardam em casa.

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O crescimento do peso dos supermercados na economia norte-coreana sofreu um grande empurrão quando o atual líder Kim Jong-un subiu ao poder – ele que se tem esforçado para ganhar a reputação de reformador económico, numa cisão com as políticas que tinham sido seguidas pelo pai e pelo avô. O número de supermercados na Coreia do Norte duplicou a partir de 2010 e pelo menos 40% da população está envolvida em algum tipo de comércio.

As receitas obtidas a partir deste setor são cada vez mais importantes para a economia norte-coreana, numa altura em que as sanções internacionais afetam de forma dura os cofres do país. De acordo com o banco central da Coreia do Sul, que monitoriza a economia do outro país da península coreana, o PIB da Coreia do Norte contraiu em 2017 devido à queda das exportações e da atividade industrial.

Mas o desenvolvimento do comércio e o consequente encorajamento por parte do Governo pode ter consequências para a liderança de Kim Jong-un. O Centro para Estudos Estratégicos e Internacionais aponta para a possibilidade do crescimento de uma “sociedade civil latente”, numa altura em que cada vez mais pessoas comunicam via mensagens de texto – ainda que numa rede interna -, partilham informação e desenvolvem uma progressivamente maior autonomia do Governo.