O ministro do Interior de Itália, Matteo Salvini, autorizou o desembarque de 27 dos 29 menores (os que não viajam acompanhados por adultos) que estão a bordo do navio humanitário “Open Arms”, noticia o diário italiano La Repubblica. A decisão surge na sequência de uma carta aberta publicada pelo primeiro-ministro italiano, Giuseppe Conte, na sua página do Facebook, na qual apela a Salvini que autorize o desembarque dos menores.

Em resposta, Salvini diz que não muda de opinião sobre o assunto e coloca a responsabilidade do desembarque exclusivamente no primeiro-ministro. “Reconheço que o senhor dispõe que os (alegados) menores a bordo do navio ‘Open Arms’ devem desembarcar”, escreveu Salvini, sublinhando que dará a autorização com “muito pesar”, como “enésimo exemplo de leal colaboração”, ao mesmo tempo que alerta para o “perigoso precedente” aberto pela autorização.

O navio encontra-se há 16 dias ao largo de Lampedusa com 134 migrantes e 19 voluntários a bordo. O ministro do Interior tem recusado terminantemente a entrada da embarcação nos portos italianos, na linha da política de “portos fechados” que tem seguido. Este sábado, o fundador da ONG Open Arms lançou um apelo desesperado, evocando uma “situação fora de controlo” em que não pode “garantir a segurança” dos 134 migrantes e dos voluntários “sequestrados” no navio há 16 dias ao largo de Lampedusa.

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“A situação está fora de controlo. Escapa à nossa capacidade”, afirma Óscar Camps num vídeo gravado numa lancha frente ao navio humanitário “Open Arms”, gerido pela organização não-governamental espanhola como mesmo nome. “A partir de hoje não nos podemos sentir responsáveis nem garantir a segurança dos 134 migrantes e dos 19 voluntários da tripulação que estão sequestrados no ‘Open Arms’, porque já é impossível manter a calma. A qualquer momento pode acontecer um motim e nós não o poderemos travar”, alertou.

“Há 100 maneiras de se automutilar numa embarcação como o ‘Open Arms’ e 100 maneiras de se suicidar a bordo. Já não temos capacidade nem podemos detê-los, muito menos controlar estas 134 pessoas”, disse, repetindo que as pessoas resgatadas têm “necessidade extrema” de assistência, assim como os voluntários, todos há 16 dias no mar.

Camps disse que na sexta-feira comunicou esta situação ao chefe do Governo espanhol, Pedro Sánchez, à chanceler alemã, Angela Merkel, ao Presidente francês, Emmanuel Macron, ao presidente do Parlamento Europeu, David Sassoli, e “a todas as autoridades italianas”. O “número um” da ONG exigiu “o cumprimento” da resolução judicial italiana — que na quarta-feira autorizou o navio a aportar em Lampedusa —, frisando que ela “é em si um título suficiente não só para entrar em águas territoriais como para a retirada imediata das pessoas resgatadas e a prestação de assistência imediata”.

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E apelou a Pedro Sánchez que “proteja os direitos dos cidadãos espanhóis que têm a seu cargo a segurança de pessoas num navio com bandeira espanhola sequestrado em águas italianas”. O navio humanitário “Open Arms” resgatou a 01 de agosto 147 pessoas do Mar Mediterrâneo, mas o seu desembarque foi recusado pelos dois países mais próximos, Itália e Malta. Há três dias, devido ao estado do mar ao largo de Lampedusa, o navio foi autorizado a entrar em águas territoriais italianas, mas impedido de aportar na ilha italiana.

Apesar de, na quinta-feira, seis países europeus, entre os quais Portugal, se terem oferecido para receber os migrantes a bordo do navio humanitário, atualmente 134, o Open Arms continua sem autorização do ministro do Interior italiano, Matteo Salvini, para aportar.

A oferta de outros países europeus é, aliás, um dos temas da carta aberta escrita esta semana por Giuseppe Conte a Matteo Salvini. “França, Alemanha, Roménia, Portugal, Espanha e Luxemburgo informaram-me de que estão disponíveis para redistribuir os migrantes. Mais uma vez, os meus homólogos europeus estendem-nos a mão”, lê-se na carta do primeiro-ministro italiano, que insiste na busca por uma “solução europeia” que impeça Itália de ficar “completamente isolada numa situação que se tornará, novamente, cada vez mais insustentável”.

“Se queremos verdadeiramente proteger os nossos ‘interesses nacionais’, não nos podemos limitar a exibir posições de intransigência absoluta. Temos quilómetros de linha costeira e estamos a poucas horas de África e do Médio Oriente”, escreve o primeiro-ministro italiano, sublinhando que é difícil impedir os “desembarques ilegais quotidianos”.

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Entre quinta e sexta-feira, 12 pessoas foram retiradas do navio por necessitarem de assistência médica urgente, permanecendo no navio 134 migrantes e 19 voluntários.

Na sexta-feira a Procuradoria de Agrigento, Sicília, abriu uma investigação por delito de sequestro contra desconhecidos para determinar por que razão os migrantes são impedidos de desembarcar, depois de a guarda-costeira italiana, num documento enviado ao Ministério do Interior, ter pedido “urgentemente” uma solução para o caso e assegurado que “não vê nenhum tipo de impedimento” ao desembarque.

Já hoje, a Procuradoria de Agrigento ordenou uma inspeção médica a bordo, para constatar as condições de higiene e saúde das pessoas a bordo.

Matteo Salvini, líder do partido de extrema-direita Liga, mantém a recusa e acusa a ONG de “provocação política”. “Em 16 dias teriam chegado tranquilamente à vossa casa em Espanha. A batalha desta ONG é política, não é humanitária, travada sobre a pele dos imigrantes. Vergonha. Eu não me rendo”, escreveu hoje Salvini no Twitter em resposta a uma mensagem da Open Arms alertando para “o pesadelo” que se vive a bordo.