Um grupo de cidadãos pediu esta sexta-feira à Câmara do Porto a classificação municipal da antiga estação ferroviária da Boavista, onde o Corte Inglés tem intenção de construir, depois de a Direção-Geral do Património Cultural ter arquivado um pedido semelhante.

Em declarações à Lusa, Hugo Silveira Pereira, investigador do Centro Interuniversitário de História das Ciências e da Tecnologia da Universidade Nova de Lisboa, explicou que o grupo tomou esta decisão depois de analisar o despacho de arquivamento da Direção-Geral do Património Cultural (DGPC), que o grupo considera abrir a porta à classificação daquele património como de interesse municipal.

Embora respeitando a decisão, o grupo, composto por 60 personalidades ligadas à academia e ao património, diz não poder concordar com ela, por estar se tratar “da primeira estação totalmente operacional da cidade do Porto”, “da primeira aplicação da tecnologia ferroviária de bitola estreita”, e “da primeira iniciativa ferroviária privada que foi bem-sucedida, apesar de não contar com nenhum apoio do Estado português”.

O grupo entende que a estação é parte essencial da história da ferrovia nacional e por isso merecia a classificação como bem imóvel de interesse nacional” pelo que com o requerimento enviado esta sexta-feira à Câmara do Porto, pretendem reforçar a necessidade de classificar e assim proteger o edifício.

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“Tendo em conta que a Câmara Municipal do Porto manifestou – e muito bem – a intenção de recuperar e devolver ao usufruto público outro património ferroviário da cidade – o antigo ramal da Alfândega – esperamos que faça o mesmo com a estação da Boavista, que é um elemento importantíssimo da história da cidade e do país”, concluí Hugo Silveira Pereira.

Juntamente com o requerimento seguiu um parecer da Associação Portuguesa para o Património Industrial que sustenta, entre outros argumentos, que “desaparecimento das instalações da Estação da Boavista não só representaria uma significativa perda para o património cultural do Porto – dado que para além da Ponte Maria Pia – numa incompreensível situação de abandono e também da Estação de Campanhã e, mais tarde, a de São Bento, a cidade não dispõe de muitos vestígios dos primórdios da construção da rede ferroviária”.

O pedido de abertura de procedimento de classificação de âmbito nacional da antiga estação ferroviária estava em apreciação desde janeiro, tendo sido arquivado por decisão da DGPC em 14 de maio, com base na proposta da Direção Regional de Cultura do Norte (DRCN) que considerou que esta “não reúne os valores patrimoniais inerentes a uma distinção como valor nacional”.

Segundo a DGPC, a decisão foi então comunicada ao município para ponderar “a eventual classificação como de interesse municipal.”

Até ao momento, a cadeia espanhola pagou à Infraestruturas de Portugal, proprietária do terreno, 18,7 milhões de euros, tendo, em outubro de 2019, submetido um Pedido de Informação Prévia (PIP) para a construção de um grande armazém comercial, de um hotel e de um edifício de habitação comércio e serviços, revelou o jornal Público em novembro.

Esse pedido teve pelo menos duas interações negativas, a última das quais tornada pública em 2 de junho pelo Movimento por um Jardim Ferroviário que revelou que “a proposta de decisão final apresentada pelos serviços da câmara foi desfavorável, tendo por base a auscultação de vários departamentos internos da CMP [Câmara Municipal do Porto] e de entidades externas, que se pronunciaram, na quase totalidade, negativamente”.

Em resposta à Lusa, o El Corte Inglés esclareceu que não houve um indeferimento do PIP, mas apenas a comunicação por parte da Câmara do Porto da intenção de indeferir o pedido caso o projeto não seja retificado, considerando este procedimento no normal.

Na ocasião, à Lusa, a diretora de Comunicação e Relações Institucionais da cadeia espanhola, Susana Martins dos Santos, adiantou que o Corte Inglês vai apresentar uma reformulação do projeto para os terrenos da antiga estação ferroviária da Boavista.

De acordo com aquela responsável, a posição do grupo não mudou, mantendo-se a intenção de fazer naquele local um investimento, “assim haja condições para tal”, e contribuir, na medida do possível, para a qualificação do comércio.