“Até agora o Estado não suportou nada. Nem um euro”. A informação foi dada pelo ex-ministro das Finanças, Fernando Teixeira dos Santos, à pergunta sobre quanto tinha custado a nacionalização do Banco Português de Negócio, na primeira comissão parlamentar de inquérito a esta intervenção. A resposta foi dada em junho de 2009, oito meses depois de o Governo de Sócrates ter decidido nacionalizar o banco. Teixeira dos Santos explicou ainda ao então deputado do CDS, Nuno Melo que o que estava a acontecer era a Caixa Geral de Depósitos estar a injetar liquidez no banco nacionalizado para assegurar que este não entrava em incumprimento das suas obrigações. São operações bancárias normais, acrescentava.

A afirmação faz lembrar declarações mais recentes feitas por governantes no quadro da venda do Novo Banco que, segundo afirmou António Costa em 2017, não traria novos encargos para os contribuintes porque as então descritas como contingentes — só se materializavam mediante o cumprimento de condições cumulativas e não garantidas — as chamadas de capital  seriam financiadas pelos bancos via Fundo de Resolução.

Costa: “Não há novos encargos para contribuintes” no Novo Banco

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Mas Teixeira dos Santos nunca terá afirmado que a nacionalização não traria custos para o Estado — era inevitável que tivesse — defendeu sim que a falência seria desastrosa, podendo ter um efeito sistémico. O BPN foi a primeira intervenção pública num banco, então feita pelo Estado num modelo que não se voltou a repetir. Foi preciso esperar mais de uma década para se chegar a um montante que já é quase final: 6.200 milhões de euros, segundo o saldo acumulado apresentado pelo Tribunal de Contas no parecer à conta geral do Estado do ano passado.

Caixa meteu 3.000 milhões no BPN, mas recebeu tudo e com juros

O BPN foi nacionalizado com um buraco de 1.800 milhões de euros, que correspondia à situação líquida negativa depois de as contas terem conhecido prejuízos e responsabilidades que estavam escondidos em sociedades offshore e no famoso Banco Insular, com sede em Cabo Verde. Mas, na altura, o poder político fazia passar a mensagem de que o Estado poderia recuperar uma parte desse buraco com a venda do banco, para além de se assumir que a alienação e exploração dos ativos que vieram com o banco, nomeadamente imóveis e sociedades participadas, permitiram gerar receita suficientes para reembolsar as injeções de liquidez que a Caixa deu ao banco, e que o Estado garantiu.

Essas injeções chegaram aos 3.000 milhões de euros e foram transformadas numa emissão obrigacionista que deu ao BPN, e mais tarde as sociedades públicas que ficaram a gerir os ativos tóxicos do banco, 10 anos para pagar, com juros elevados, todo o dinheiro que a Caixa emprestou nos meses de maior aperto, quando a instituição foi parar às mãos do Estado. Sabemos entretanto que a reprivatização do BPN, em 2012, no auge do resgate financeiro e por ultimato da Troika, permitiu apenas recuperar 40 milhões de euros, para além de manter o Estado exposto a um conjunto significativo de riscos e encargos e que voltam a surgir na proposta de Orçamento do Estado para 2021, com o valor de 50 milhões de euros.

Oito anos depois de vender o BPN ao EuroBic, o Estado ainda está a pagar

Mas o maior prejuízo já estava na esfera do Estado e pesado nas contas públicas durante anos. Como as sociedades sucessoras do BPN — Parvalorem, Parups e Parparticipadas — não conseguiam gerar com os ativos ditos tóxicos receitas suficientes para pagar os juros e o capital à Caixa, o Tesouro teve todos os anos de emprestar centenas de milhões de euros para cumprir esses compromissos e os saldos entre as receitas e as despesas do Estado foram, sistematicamente, muito negativos.

E o maior desses empréstimos foi dado em 2019, no valor global de 1,26 mil milhões de euros. Este financiamento permitiu a estas sociedades amortizarem antecipadamente os compromissos financeiros pendentes com a Caixa Geral de Depósitos e com a emissão de papel comercial. No total, o esforço financeiro do Estado que o Tribunal de Contas ainda atribui ao caso BPN totalizou 1,327 mil milhões de euros no ano passado, um valor que chega a ultrapassar a transferência de 1,149 mil milhões de euros feita para o Novo Banco, através do Fundo de Resolução.

O Tribunal de Contas assinala ainda que, sem considerar no passivo os empréstimos do Estado, e tendo sido concluído o reembolso dos empréstimos da CGD, as contas da Parvalorem, Parups e Parparticipadas apresentavam no final de 2010, e pela primeira vez, capitais próprios positivos de 259 milhões de euros. As propostas orçamentais de 2020 e 2021 ainda inscrevem empréstimos para estas sociedades, mas em valores muito mais reduzidos — 7 e 6 milhões de euros, respetivamente.

“Em 2019, o saldo negativo acumulado decorrente da nacionalização e reprivatização do BPN atingiu 6.201 milhões de euros, não sendo expetável, dado o referido montante de capitais próprios, uma variação muito significativa quando ao valor final a pagar pelo Estado”.

É certo que continuam a existir encargos nas sociedades Parvalorem que empregam cerca de 150 trabalhadores, e que ainda há muitas responsabilidades pendentes de processos judiciais e litígios vários, mas o pagamento dos juros e do capital da emissão obrigacionista subscrita pela Caixa, e que muitos apontam como tendo sido um excelente negócio para o banco público, era o principal custo e esse ficou saldado em 2019.

Ainda de acordo com o Tribunal de Contas, só o BES/Novo Banco exigiram um esforço financeiro maior ao Estado, que já vai em 6,750 mil mihões de euros, um número que ainda não está fechado.

Apoios públicos à banca custaram 1.730 milhões por ano entre 2008 e 2019