Foram precisos 11 meses para que o projeto artístico da brasileira Juliana Notari ficasse concluído — e poucos dias para que a polémica chegasse à imprensa internacional, inclusive ao britânico The Guardian. A enorme escavação no formato de uma “vulva/ferida” com 33 metros de altura, 16 de largura e outros seis de profundidade, chamada “Diva”, está no centro de um aceso debate que está a dividir a política e a sociedade.

Em meio a tantas rochas no meio do caminho desse ano distópico, finalmente termino o ano com a obra Diva pronta!! Foi um…

Posted by Juliana Notari on Wednesday, December 30, 2020

A instalação de arte foi revelada no sábado num parque de arte rural em Pernambuco. No Facebook, a artista publicou um longo texto onde explica que para a conclusão do projeto foram precisos mais de 20 homens e que a “Diva” pretende explicar questões que remetem para “a problematização do género a partir de uma perspetiva feminina” e que pretende também questionar a relação “entre natureza e cultura na nossa sociedade ocidental falocêntrica e antropocêntrica”, temas que se têm “tornado cada vez mais urgentes”.

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É nessa mesma publicação que se encontram comentários de desagrado, com algumas reações até “obscenas”. Milhares de críticas — cuja maioria o The Guardian associa a apoiantes do Presidente Jair Bolsonaro — invadiram a página da artista de forma irada, tais como “Quem é que vocês esquerdistas pensam que estão a enganar? Além de idiotas úteis à esquerda, claro”.

Esta não foi, porém, a única publicação que originou comentários negativos: ainda antes de 2020 acabar, a artista divulgava nas redes sociais fotografias alusivas ao projeto, uma delas de si mesma na companhia de alguns dos 20 homens que a ajudaram na construção da instalação artística, todos eles negros. A imagem trouxe à tona da água questões raciais. À Folha de S. Paulo, a artista esclarece que estava em harmonia com a equipa, embora compreenda como a imagem possa ser interpretada: “Eu a equipa estávamos em harmonia, mas quando se vê a imagem, realmente ela mostra a diferença de classes. (…) A imagem extrapola o campo da arte e entra no contexto do que é o Brasil”.

Além do contexto social e racial, houve quem também acusasse a obra de ser transfóbica — há críticas que lembram que nem todas as mulheres têm uma vagina —, quem questionasse a necessidade de gastar dinheiro em projetos relacionados com arte feminista, ao invés de projetos sociais, e quem se focasse na questão ambiental. Mas enquanto uns questionam a arte de Juliana Notari, outros celebram-na: a verdade é que publicação acumula mais de 25 mil comentários e já foi partilhada mais de 13 mil vezes. Ao Correio Braziliense, a artista comenta ainda que vai considerar as críticas construtivas nos próximos trabalhos.