O antigo vereador socialista na Câmara do Porto Manuel Correia Fernandes disse esta sexta-feira ver com “tristeza” a “destruição” do Mercado do Bom Sucesso, para a qual está prevista a instalação de um supermercado, lamentando que o tempo lhe tenha dado razão.

“Desbaratar um edifício que tinha um conjunto de características que foram destruídas é destruição, não há outra palavra para isso. Infelizmente, os factos parecem dar-me razão, a mim e a muita gente que na altura [em 2010] tentou reverter a situação, mas sem êxito”, lamentou, comentando o novo projeto de requalificação para o Bom Sucesso, que prevê a instalação de um “Continente Bom Dia” e de um total de 26 bancas e 40 lojas e restaurantes.

Salientando as características únicas e “raras” do edifício, o antigo vereador do Urbanismo referiu que, com a exceção de alguns imóveis, como o Mercado do Bolhão ou o Pavilhão Rosa Mota, o Porto já não tem locais daquele tipo“.

Eu não conheço os detalhes, se o resultado é esse, é uma tristeza. Para meter supermercados não são aquele tipo de espaços. E nós perdemos património, perdemos património arquitetónico e cultural”, defendeu.

Classificando como “má” a solução encontrada em 2010 para a reabilitação do mercado, o arquiteto reiterou esta sexta-feira o que disse na altura: que a transformação do Bom Sucesso é umerro clamoroso“. “Não tenho dúvida nenhuma, porque mesmo as funções que lá estão hoje [lojas, restauração, e hotel] não recriam aquele tipo de espaço. É um erro de casting, um erro de avaliação”, disse, acrescentando que “um supermercado pode ser feito numa garagem”.

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Correia Fernandes recorda a propósito que também o Mercado Ferreira Borges foi alvo de uma operação idêntica, e também ali, como no Bom Sucesso, “não deu bons resultados”. Para o socialista, tinha sido possível manter as funções primárias daquele edifício, como é exemplo o Mercado de Matosinhos: “um imóvel do mesmo tipo, feito pelos mesmos arquitetos e que está a funcionar muito bem”.

Em fevereiro de 2010, o à data vereador do PS na Câmara do Porto Correia Fernandes tinha já sido crítico do primeiro projeto de reabilitação para o mercado do Bom Sucesso, considerando que estava iminente um “erro clamoroso”. Correia Fernandes referia-se à proposta vencedora do concurso público lançado pela autarquia para a reabilitação do mercado, que apontava para a construção de um hotel low cost [de baixo custo], uma área de escritórios, 44 bancas de produtos gourmet e 23 lojas.

O Mercado do Bom Sucesso foi classificado pelo Ministério da Cultura como Monumento de Interesse Público (MIP) em 25 de janeiro de 2011, no dia em que a autarquia assinou com a empresa Mercado Urbano (subsidiária da bracarense Eusébios & Filhos, SA), o contrato de concessão e requalificação do Mercado do Bom Sucesso. Em agosto, quando as obras começaram, foi revelada a entrada da Mota-Engil no capital da empresa responsável pela requalificação do mercado.

Em dezembro de 2019, a Mota-Engil, que detinha a concessão do Mercado do Bom Sucesso até então, anunciou que ia deixar de gerir a estrutura, passando para as mãos de uma parceria entre a Mercado Prime, estrutura empresarial pertencente ao Grupo Amorim, e a Sonae Sierra. A autorização da transmissão da totalidade do capital social foi aprovada em dezembro, com a abstenção do PS e voto contra da CDU, tendo, à data, o presidente da Câmara do Porto, o independente Rui Moreira, deixado a garantia que existem, no caderno de encargos, “salvaguardas suficientes” para impedir que o Mercado do Bom Sucesso venha a ser transformado num supermercado, como avançou na mesma altura o Jornal de Notícias.

Na semana passada, o promotor indicou à Lusa que a autarquia já deferiu o pedido de licenciamento para a requalificação do Mercado do Bom Sucesso, que prevê a instalação de um “Continente Bom Dia” e de um total de 26 bancas e 40 lojas e restaurantes.