“Olá, nós somos italianos e vamos jogar com bola”. Esta frase pode não compreender em si tudo o que é a história do futebol. Como é do conhecimento geral, se há gente neste Mundo que sabe defender, essa gente é muito provavelmente de Itália.

E quem segue o desporto rei já viu, e provavelmente já sentiu quase na pele – fosse uma equipa sua a defrontar um conjunto transalpino –, como funciona o sistema italiano. Aquele cinismo quase histórico. Este ano, pelo menos no Europeu e dando continuidade aos três últimos anos, pode ter passado à história.

A Bélgica, líder do ranking FIFA, já tinha sido pragmática quando eliminou Portugal, acabando por ter de portar-se da mesma maneira esta sexta-feira, frente aos italianos. Seria de esperar que os belgas, com vários craques no plantel (Eden Hazard novamente de fora, por lesão), fossem das melhores equipas a jogar futebol. Não se demonstrou, mas também vale o que vale face aos resultados alcançados, que se somaram por vitórias nos grupos e numa eliminação de Portugal.

Mas os tais italianos que gostam de jogar com bola querem-na mesmo muito, pelo que defendem à frente, muito mais à frente, numa pressão que fazia os belgas jogarem sempre longo, para despachar, ou a procurarem o “pivô” Lukaku. Olhando para o jogo, foi sem grandes surpresas que os dois grandes lances de perigo da Bélgica, por De Bruyne e Lukaku, tenham vindo de ataques rápidos pelo corredor central e não de jogo paciente. Em ambos os casos, Donnarumma não deixou a sua equipa ficar a perder.

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Por volta dos 30′, aproveitando uma confusão dentro da área, perigosamente perto da baliza de Courtois, o médio italiano Barella saiu do meio dos defesas com bola e rematou forte e cruzado para o golo. Estava feito o 1-0 e, agora sim, a Bélgica assumiu o jogo e foi para cima da Itália. Mas os rapazes vestidos de azul têm o tal gene da defesa e foram aguentando até que, Insigne sacou da cartola um golaço de fora da área, colocando à beira do intervalo os belgas numa posição muito desconfortável (1-0). No entanto, o irreverente Doku ganhou um penálti do outro lado, um minuto depois, e Lukaku reduziu, no quarto golo da prova. Depois, as equipas seguiram para o descanso, bem merecido, depois de excelentes 45 minutos e um final de primeira parte muito intenso.

As equipas apareceram novamente descomplexadas para a segunda parte, mantendo a cor de um jogo fantástico. A Bélgica obrigou a Itália a recuar um pouco no arranque do segundo tempo, mas os italianos acabaram por voltar ao seu jogo, com combinações rápidas e bastante facilidade na chegada às imediações da área adversária. Podiam ter feito mais golos, mas a verdade é que de frente a frente, sem grandes complicações, foram os belgas a ter as melhores oportunidades de golo, sempre um bocado contra a toada do jogo. Aos 61′, ou Lukaku falhou um golo cantado ou Spinazzola fez um excelente corte. Talvez um pouco dos dois. Passados dez minutos, outro lance de perigo pelo mesmo lado, o esquerdo, mas Lukaku e Thorgan Hazard também não conseguiram finalizar.

No entanto, quer através do médio Barella, ou dos extremos Chiesa e Insigne, apoiados pelos laterais Spinazzola (saiu lesionado aos 80′) e Di Lorenzo, era a Itália que jogava mais, e toda a equipa mantinha uma intensidade elogiável. Até ao fim do encontro os italianos que gostam da bola lá recuaram um pouco, sem nunca esquecerem a importância de atrasar o início da construção belga, e seguraram bem o jogo até ao final. Agora, para aquecer ainda mais as coisas, vem aí um Espanha-Itália nas meias-finais do Euro 2020.

O jogo a três toques

Para recordar

A Itália apareceu e apareceu para jogar à bola. Com uma pressão alta e a tal histórica habilidade defensiva, as coisas “para trás” estavam mais ou menos garantidas. Para a frente, no entanto, a equipa era um pouco incógnita no início da competição. Mas, agora, os italianos são uma equipa que se diverte e diverte quem vê. Com facilidade em criar, quer em ataque organizado, quer por jogadas mais rápidas. Mas que qualidade de Insigne e Chiesa, que luta de Barella, que pés de Jorginho, que rapidez de Di Lorenzo e Spinazzola (para quem o Euro deve ter acabado, mas já lá vamos). Muitos queriam ver a squadra azzurra defrontar alguém com mais “nome” e, assim que tiveram oportunidade, jogaram e bem. Nota elevada para a Itália.

Para esquecer

Foi ele que marcou o golo belga, mas também falhou dois, um deles quase feito, acertando em Spinazzola. Lukaku sai do Europeu com quatro golos (menos um que Cristiano Ronaldo) e foi o jogador alvo dos belgas, quase sempre. Mas esta noite, quando foi preciso, a verdade é que falhou aqueles lances. É como que injusto, mas o futebol também. Para esquecer é também a lesão de Spinazzola. Todas as lesões são de lamentar, mas não é por isso que o que aconteceu ao lateral italiano não merece uma palavra: sendo uma das revelações do Euro e a fazer uma competição fantástica pela ala esquerda, Spinazzola saiu de maca a chorar, provavelmente com uma lesão muscular e com o Europeu a ficar por aqui.

Para valorizar

Jeremy Doku foi o jogador mais irreverente da Bélgica e o mais inconveniente para as hostes italianas. Com o papel de substituir Eden Hazard (o que já tinha feito um par de vezes neste Europeu), fê-lo com muita qualidade. Ganhou a grande penalidade que deu o golo belga no final da primeira parte, teve uma oportunidade de golo num lance individual no segundo tempo, e foi, apenas com 19 anos, o melhor jogador belga. O lado esquerdo foi sempre o mais perigoso dos belgas, muito por culpa do jogador do Rennes.