A pandemia, a crise económica e social que dela emergiu, e também o Afeganistão foram temas que abriram o discurso de Marcelo Rebelo de Sousa em mais uma Assembleia Geral da ONU, em Nova Iorque. Reforçando que o mundo é “multipolar”, o Presidente da República assegurou que “nenhum polo, nenhuma potência por poderosa que seja tem condições para enfrentar sozinha ou com alguns parceiros” desafios como as alterações climáticas, pandemias, crises económicas, terrorismo e até desinformação.

“A governação de um mundo multipolar exige compromisso e concertação entre as nações, isto é multilateralismo”, afirmou. 

“Portugal esteve sempre — estará sempre —, do lado dos consensos que resolvam crises”, continuou Marcelo, assegurando que o país está, tal com a União Europeia, “do lado do multilateralismo das Nações Unidas, da ordem internacional baseada em regras, dos direitos humanos”. Portugal está ainda empenhado “na reforma da Organização Mundial de Saúde, no Tratado Internacional sobre Pandemias” e também na garantia das vacinas como “bem público global”.

O Presidente da República discursou em sétimo lugar numa cerimónia que arrancou pelas 14h (hora em Portugal continental), no decorrer da 76.ª sessão da Assembleia Geral da ONU, em Nova Iorque. Já antes a Lusa escrevia que Marcelo iria discursar em defesa do diálogo global e das prioridades de António Guterres à frente da organização.

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Referindo-se ao discurso dado anteriormente por António Guterres, o PR elogiou a mensagem “clara, lúcida e virada para o futuro”, considerando-a mais do que um apelo aos Estados, um “apelo a todos os cidadãos do mundo”. “Não é só no clima que não existe Planeta B. É em tudo.”

Consideramos que as grandes questões do nosso tempo, como o clima, a pandemia, as crises económicas e sociais, as guerras e as inseguranças, as migrações e os refugiados, só demonstram que isolacionismo, protecionismo, unilateralismo, intolerância, populismo e xenofobia, inevitavelmente conduzem a becos sem saída.”

O PR pediu multilateralismo não nos discursos, mas sim nas ações: “Os governantes serão tentados a fazerem discursos por um lado a prometer multilateralismo e, por outro, esquecê-lo, a adiá-lo, a perderem tempo”. “Precisamos mais do que nunca de um multilateralismo efetivo. Não há mesmo mais tempo a perder.”

“Nós não mudamos de princípios”, garantiu ainda, apontado os olhos no futuro. “Manteremos, também, o rumo caso nos deem a vossa confiança para um mandato no Conselho de Segurança daqui a cinco anos.”

“Um discurso curto e  incisivo para que todos percebessem”

Em declarações aos jornalistas à saída da Assembleia Geral da ONU, Marcelo Rebelo de Sousa classificou o discurso dado momentos antes como “curto” e “incisivo”, feito de “frases diretas” para que “os países de todo o mundo percebessem”. Em causa, assegurou o PR, esteve salientar o essencial. “O fundamental é dizer que este mundo já não é o que era”, afirmou, para depois destacar uma frase em particular da mensagem proferida esta tarde: “Não há nenhum polo ou potência que por si só, ou apenas com alguns parceiros, possa resolver os problemas”.

“O que é multilateralismo? É diálogo, é compromisso, é consenso”, disse, relembrando que as Nações Unidas “só funcionam se forem reformadas” e que “não bastam discursos”. “Dá-se com uma mão o que se tira com a outra e o mundo fica ingovernável.” Pelo meio, Marcelo abordou a Conferencia dos Oceanos no próximo ano, mas também que Portugal é “candidato ao Conselho de Segurança daqui a cinco anos”.

“Meter isto tudo em 8 minutos para que as pessoas agarrem o essencial e que fique uma mensagem: nós não mudamos. Disse isso três vezes. Com Portugal já sabem com o que podem contar.”

Esta foi a quarta intervenção de Marcelo em representação do país no debate geral anual que reúne mais de 100 chefes de Estado e de Governo e representação diplomática de todos os 193 Estados-membros da ONU — as três vezes anteriores aconteceram em 2016, 2018 e 2019.

Guterres pede cooperação porque mundo nunca enfrentou tantas ameaças

Antes de Marcelo Rebelo de Sousa foi a vez de o secretário-geral da ONU, António Guterres, discursar: esta terça-feira afirmou que o mundo nunca enfrentou tantas ameaças, dando como exemplos a destruição da paz, a desconfiança e até as alterações climáticas. O antigo primeiro-ministro de Portugal pediu ainda, de acordo com a Lusa, cooperação entre todos os países presentes na abertura do debate geral.

Abordando ainda o fosso entre ricos e pobres, a desigualdade de género nas sociedades e a divisão digital, António Guterres classificou de “obscenidade” e grande “falha ética” global o facto de as vacinas não serem distribuídas de forma uniforme: “Em vez do caminho da solidariedade, estamos num caminho sem fim para a destruição”, lamentou.