Esta segunda-feira à tarde, a CNN Portugal revelou imagens de um encontro entre o antigo presidente do Benfica, Luís Filipe Vieira, e o antigo vogal e hoje vice do clube, Jaime Antunes. Mais tarde, confrontado com esse almoço, o dirigente comentou apenas que “os amigos não se deixam cair, sobretudo quando estão em baixo”. No entanto, nem todos relativizaram o facto em termos internos na Luz. E, apesar do bom momento desportivo que a equipa atravessa depois da derrota no dérbi com o Sporting, foi mais um episódio capaz de gerar comentários. “Mas nada a comparar com o que se passa com o Jesus”, explicam ao Observador.

Desde o início da época que havia um elefante na sala no futebol do Benfica. A equipa conseguiu o objetivo de entrar na fase de grupos, ele continuava. A equipa liderou o Campeonato nas rondas iniciais, ele continuava. A equipa deixou-se ultrapassar na classificação e perdeu com o rival lisboeta, ele continuava. Qual é então a diferença em relação ao que havia? O aparecimento em cena do Flamengo e o anúncio com grande pompa e circunstância da viagem para Portugal tendo como principal meta a contratação de um treinador. Foi a partir daí que o elefante na sala, o mesmo que havia, foi começando a partir coisas. E o elefante tem o nome que já tinha no arranque da temporada: a renovação do contrato com o Benfica, que acaba em junho.

É desta novela que saíram as informações esta quarta-feira, véspera do clássico com o FC Porto no Dragão para a Taça de Portugal, que davam conta de uma proposta do clube carioca ao treinador e de um “sim” do treinador a essa proposta. Nem uma nem outra existem. Para já. Mas é esse o facto que pode levar à saída de Jorge Jesus da Luz mais cedo do que estava previsto e que era no final da época. Vamos por partes.

Do lado do treinador, existe vontade de assumir um regresso ao Rio de Janeiro, onde ganhou quase tudo o que havia para ganhar apenas num ano (ficando apenas a faltar o Mundial de Clubes, onde perdeu frente ao Liverpool no prolongamento). E não era preciso o encontro em sua casa, revelado pelo MaisFutebol e pelo Record, para os dirigentes do Flamengo, no caso Marcos Braz, vice para o futebol, e Bruno Spindel, diretor executivo, saberem da abertura de portas depois das conversas que tinham mantido antes com Bruno Macedo, agente do técnico. No entanto, e isso também assumido ao Observador por fontes próximas de Jesus, se existisse uma proposta de renovação do Benfica, o treinador daria prioridade ao clube da Luz. Questão: o técnico sabe que essa hipótese não está a ser ponderada e, partindo desse mesmo princípio, veria com bons olhos a possibilidade de rumar já ao Brasil em janeiro. Problema: tem seis meses de contrato.

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“É óbvio que o Flamengo e o Marcos Braz têm necessidade de contratar um treinador. Se esse treinador pudesse ser o Jorge Jesus, é claro que iriam querê-lo, de certeza absoluta. Ele nunca disse que não ou que sim, não houve nenhuma conversa a esse respeito, não há rigorosamente nenhuma proposta. Agora, aqui há uma questão e eu não tenho problema nenhum em dizer isso: neste momento, o ambiente à volta de Jorge Jesus no Benfica não é fácil. Não é fácil, primeiro, porque não está a ganhar e, depois, porque há um somatório de coisas em que o menos responsável é o Flamengo, que está fazer a parte que lhe compete”, comentou no início da semana Luís Miguel Henrique, advogado de Jorge Jesus, à CNN.

Do lado do Flamengo, e não havendo uma máquina do tempo que permita que o Benfica faça os dois jogos no Dragão para a Taça de Portugal (esta quinta-feira) e para o Campeonato (dia 30) sem que os dias avancem, a postura existente é a de esperar. Desde que chegaram a Portugal na semana passada, o Observador sabe que no fim de semana houve uma abordagem direta a Paulo Sousa no sentido de perceber a disponibilidade do técnico para assumir já o comando dos cariocas – o que faria com que abdicasse do playoff de apuramento para o Mundial pela Polónia, em março – e conversas informais com pessoas próximas de outros técnicos portugueses como Paulo Fonseca, Rui Vitória ou Vítor Pereira (Rui Faria foi um nome também ventilado mas não confirmado, Carlos Carvalhal já tinha estado na lista dos rubronegros no ano passado). Ainda assim, por várias razões distintas, Jesus continua a ser o alvo número 1. E a vontade do técnico também ajuda.

Se a questão salarial não será um problema (daí que não tenha de haver a tal “proposta”, porque o português voltou ao Benfica a ganhar menos um milhão de euros por época), o principal obstáculo tem a ver com os seis meses de contrato com os encarnados e com a possibilidade de o próprio conjunto da Luz querer ou não sentar-se à mesa com os responsáveis do Flamengo para negociar uma verba que seria sempre superior à que foi paga há ano e meio por Luís Filipe Vieira para resgatar o treinador. Caso exista um sinal nesse sentido, a história poderá ser igual à do verão de 2020, com papéis trocados mas os mesmos protagonistas.

“O Flamengo procura um treinador europeu, qualificado. O mister Jorge Jesus é um profissional de primeiro nível, fez um trabalho maravilhoso, é nosso amigo. É natural que tenhamos o desejo de que seja treinador do Flamengo, ele preenche todos os requisitos. É um desejo mas afirmo que não fizemos qualquer proposta para ele. Há uma série de outras conversas que estamos a ter em Portugal e eventualmente noutros locais da Europa. A nossa missão é levar o treinador com este perfil para o Flamengo e vamos ficar cá o tempo que precisarmos para concluirmos essa missão. Custos para levar Jesus? Há uma série de conversas que têm de acontecer para que ele ou outro treinador possa vir para o Flamengo, conversas privadas. Não é simples, Jesus tem contrato com o Benfica, é uma questão complexa, mas a história dele e a amizade que tem com todos nós fala por si só”, salientou Bruno Spindel em declarações esta manhã à CNN.

Do lado do Benfica, o desconforto com toda esta situação é crescente. No início da semana, uma fonte dos encarnados tinha revelado que ninguém acreditava em coincidências num comentário perante as imagens públicas dos encontros do agente Bruno Macedo com os responsáveis do Flamengo e os últimos dias vieram reforçar ainda mais essa ideia. A corda como que esticou numa altura em que os dirigentes da formação da Luz queriam apenas que todas as atenções estivessem centradas só nos encontros com o FC Porto mas percebem que existe também quase que uma vontade não assumida das partes em prolongar a “novela”.

As relações entre a estrutura e o técnico estão longe de ser as melhores nesta fase e pouco ou nada tem a ver com as declarações de Jesus depois do apuramento para os oitavos da Champions, quando confidenciou que era o único a acreditar que o Benfica poderia deixar pelo caminho o Barcelona. Até mesmo depois disso, e da parte do clube, as palavras que saíram para fora foram de defesa do treinador até perante a contestação que se tornou bem visível após o dérbi com o Sporting, como aconteceu numa entrevista de Domingos Soares Oliveira, CEO e administrador da SAD, à BTV. Contudo, esse apelo à estabilidade não significa que Jesus seja a opção para a nova temporada, onde o clube tentará abrir um novo ciclo desportivo – e esse é um problema. Assim, a dúvida que sobra é sobre o posicionamento dos encarnados perante uma proposta do Flamengo. Dúvida 1: aceita ou não? Dúvida 2: quanto vai pedir? Dúvida 3: tem plano B para entrar de imediato? É nesse ponto que, no final, irá entroncar o último capítulo da novela em forma de folhetim que leva uma semana.