Solidariedade quase unânime em relação a Volodymyr Zelensky e aos apelos que deixou no Parlamento português em nome da Ucrânia. A palavra chave é o “quase”: as reações dos partidos ao discurso do Presidente ucraniano ficaram inevitavelmente marcadas pela posição isolada, e muito dura, do PCP – uma reação que mereceu, aliás, as suas próprias reações e até uma saída do plenário dos deputados da Iniciativa Liberal, em protesto contra os comunistas.

O PCP foi o único partido que não esteve presente na sessão solene em que o Parlamento, Marcelo Rebelo de Sousa e Augusto Santos Silva receberam, por videoconferência, Volodymyr Zelensky. Mas não deixou de estar no Parlamento e prontificou-se rapidamente a prestar declarações aos jornalistas em reação ao discurso do chefe de Estado ucraniano.

Se a líder parlamentar do PCP, Paula Santos, começou por repetir o que se tem lido nos comunicados do partido – é preciso encetar esforços para a “paz” e a vinda de Zelensky “instrumentaliza” o Parlamento português e “anima a escalada da guerra” – cedo a declaração começou a subir de tom. O PCP não gostou de ouvir as referências ao 25 de Abril pela boca do presidente ucraniano – Zelensky fez o paralelismo entre o regime de Putin e a ditadura portuguesa, defendendo que o povo português sabe “perfeitamente” o que é lutar pela liberdade – e disparou: a menção à Revolução portuguesa não passa de um “insulto”.

Porquê? Porque a revolução portuguesa foi feita “para pôr fim ao fascismo”, justificou Paula Santos. E foi mais longe: “Qual é a comparação que há quando o 25 de Abril permitiu a libertação de antifascistas e na Ucrânia o que se está a passar é exatamente o contrário?”.

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Ou seja, apesar de se distanciar politicamente do “capitalista” Putin, o PCP usa um argumento semelhante ao do presidente russo, que diz estar a tentar “desnazificar” a Ucrânia. Isto porque há alguns batalhões de extrema-direita e com elementos neonazis no exército ucraniano – mas politicamente a extrema-direita não tem representação no Parlamento do país.

Mesmo assim, para o PCP, Zelensky representa um “poder xenófobo” que “persegue comunistas e democratas” (o partido comunista foi ilegalizado na Ucrânia). E defende que Portugal “desencadeie ações no plano diplomático” para acabar com a guerra – soluções que não passem por sanções contra a Rússia.

Não é o que Portugal está a fazer, nem o que Augusto Santos Silva fez na sua intervenção, declarou Paula Santos: “Não é a intervenção que deve corresponder a um órgão de soberania, pelo cinismo e branqueamento do regime da Ucrânia”.

Partidos condenam “indignidade” do PCP

Ora, os outros partidos aplaudiram de pé e em uníssono, não só Zelensky, como Santos Silva – e nas reações à saída da sessão mostraram-se mais uma vez em sintonia, mas ao condenarem a reação dos comunistas. Uma “indignidade”, classificou André Ventura, do Chega. Um partido que prefere estar ao lado de “regimes opressores e ditaduras” (“é de estranhar que o PS tenha entendido aceitável aliar-se” ao PCP), sentenciou Paulo Mota Pinto, do PSD.

“Incompreensível que o PCP não tenha prestado o devido respeito ao povo da Ucrânia”, lamentou Rui Tavares, do Livre, que levou um cravo ao peito para esta sessão. No PAN, Inês Sousa Real lamentou que nem todas as forças políticas tivessem apoiado a sessão.

Já pelo CDS, que já não tem representação parlamentar, Nuno Melo, que ali estava na qualidade de eurodeputado, atirou:  “Não estiveram deputados do PCP; o CDS não elegeu deputados, mas estamos aqui porque esta é a casa mãe da democracia e o que esteve hoje em causa foi a opção ou pela defesa das democracias ou o lado das ditaduras”.

Na Iniciativa Liberal, o protesto foi outro: no debate seguinte, sobre a participação de Portugal na Cooperação Estruturada Permanente, os deputados liberais abandonaram o hemiciclo enquanto o deputado comunista João Dias intervinha, regressando aos lugares quando acabou de falar.

Mais ajuda à Ucrânia, incluindo armas

Fora o fator PCP, as reações dos partidos também tiveram outro grande traço em comum: o apoio à Ucrânia em termos muito concretos, mesmo que em graus diferentes – a maior parte defendeu a ajuda militar e humanitária, mas houve quem pedisse taxativamente ao Governo português para ser mais ativo e “passar das palavras aos atos”.

Concretamente, o PSD pediu ao Governo para fazer mais e apoiar a Ucrânia “sem hesitação”, depois de ouvir os “apelos lancinantes” de Zelensky. “O Governo deve sem hesitação promover o apoio diplomático e também militar ao alcance”, incluindo armamento “em quantidade e qualidade suficiente para o invasor perceber que não vai conseguir vencer a guerra”.

Ventura falou no mesmo sentido: Portugal deve fazer “tudo o que estiver ao alcance” para apoiar Ucrânia a nível militar e económico – perante a “humildade” do presidente ucraniano em pedir ajuda, o Governo deve ser “sensível e recetivo” a esses pedidos.

No PS, o líder parlamentar, Eurico Brilhante Dias, saudou a referência de Zelensky ao 25 de Abril – “tem um especial significado” – e defendeu que é o momento de “lutar pela paz”, por entre referências ao povo português “representado pelos 230 deputados” na sessão – na verdade foram 225, descontando os deputados do PCP, que não estavam no hemiciclo.

Na Iniciativa Liberal, João Cotrim Figueiredo instou o Governo português a oferecer um “apoio continuado” à Ucrânia quanto ao armamento e que o país seja “mais assertivo na escalada das sanções”. O PAN também defende que os pedidos de ajuda militar sejam acolhidos e que se vá “atrás dos bens dos oligarcas russos” – “o Estado português ainda não fez tudo ao alcance” nesse sentido”. Já o Bloco, que apesar de ser pela dissolução da NATO aplaudiu de pé Zelensky, falou pelo “apoio à resistência dos ucranianos”, mas colocando o foco nas sanções a Putin.