Uma ativista russa em Portugal diz que o recurso a associações para efeitos propaganda e recolha de informações, como aquelas a que estavam ligados os colaboradores pró-Putin que recebiam refugiados ucranianos em Setúbal, é um padrão comum do regime.

“Não é nada estranho, é um padrão bastante replicado, usar este tipo de propaganda tentando criar uma rede de associações que pretendem unir os russos“, disse à Lusa Ksenia Ashrafullina, uma ativista opositora do regime de Vladimir Putin que vive em Portugal há cerca de dez anos.

O jornal Expresso noticiou sexta-feira que refugiados ucranianos estão a ser recebidos em Setúbal por responsáveis de uma associação pró-russa, levando alguns a sentirem-se ameaçados.

Em reação à notícia, Ksenia Ashrafullina não se mostrou surpreendida, referindo que a relação próxima entre supostas associações da sociedade civil e a Federação russa, através das embaixadas, é comum.

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“Pode ser ou um agente que já trabalhava com a embaixada, ou pode ser que agora tenha aparecido pressão para estas organizações começarem a recolher informação”, explicou, ressalvando, no entanto, que em causa estão duas pessoas concretas e que não se deve assumir uma posição contra os russos em geral.

No caso concreto de Setúbal, o Expresso escreve que pelo menos 160 refugiados ucranianos já terão sido recebidos por Igor Khashin, antigo presidente da Casa da Rússia e do Conselho de Coordenação dos Compatriotas Russos e líder da Associação dos Emigrantes de Leste (Edintsvo), subsidiada desde 2005 até março passado pela Câmara de Setúbal, e pela mulher, Yulia Khashin, funcionária do município.

O jornal refere ainda que Igor Khashin é um dirigente associativo com dupla nacionalidade, que se apresenta como “gestor de projetos”, e que as associações a que terá estado ligado estavam nos ‘sites’ da Ruskyi Mir e da Rossotrudnichestvo, instituições estatais criadas pelo Kremlin para divulgar a cultura e o mundo russos, mas que, segundo fontes citadas pelo jornal, “podem servir de cobertura a elementos dos serviços secretos” da Rússia.

Para Ksenia Ashrafullina, a posição de ambos em relação ao regime de Vladimir Putin não era desconhecida, sobretudo através das redes sociais, e, por isso, a ativista questiona o comportamento da Câmara Municipal de Setúbal e até a relação entre o PCP, que lidera a autarquia, e o regime russo.

De acordo com o Expresso, Igor Khashin e a mulher terão, alegadamente, fotocopiado documentos de identificação dos refugiados ucranianos, no âmbito da Linha de Apoio aos Refugiados da Câmara Municipal de Setúbal e questionado os refugiados sobre os familiares que ficaram na Ucrânia.

Para Ksenia Ashrafullina, é incompreensível que a autarquia não disponibilizasse uma lista cos documentos que podem ser solicitados e do tipo de informação que pode ser pedida aos refugiados ucranianos.

“Há muitíssimos tradutores voluntários, isto não deveria ser um problema”.

Contactada pela agência Lusa, a Câmara de Setúbal comprometeu-se a reagir ainda esta sexta-feira em comunicado.

Vários partidos já requereram, entretanto, a audição do presidente de Câmara Municipal de Setúbal na Assembleia da República para esclarecer as notícias.