Até esta quinta-feira, a humanidade terá consumido tudo o que o planeta pode produzir num ano sem se esgotar, o que significa que viverá o que resta de 2022 a crédito, alertem duas Organizações Não Governamentais (ONG).
Em sentido figurado, seriam necessários 1,75 planetas Terra para suprir as necessidades da população de forma sustentável, segundo um indicador criado por investigadores no início dos anos 1990, que continua a piorar.
Esta data, 28 de julho, corresponde ao momento em que “a humanidade consumiu tudo o que os ecossistemas podem regenerar no espaço de um ano”, explicam as ONG Global Footprint Network e WWF.
“Durante os 156 dias restantes [até o final do ano], o nosso consumo de recursos renováveis irá consistir em corroer o ‘capital natural’ do planeta”, alerta Laetitia Mailhes, da Global Footprint Network.
Estes dados nem têm em conta as necessidades de outras espécies que vivem na Terra.
“Temos também que deixar espaço para o mundo selvagem”, refere.
O Overshoot Day (Dia de Sobrecarga da Terra) ocorre quando a pressão humana excede as capacidades regenerativas dos ecossistemas naturais.
Segundo a Global Footprint Network, que monitoriza esta mediação, este indicador tem aumentado ao longo de 50 anos: 29 de dezembro de 1970, 4 de novembro de 1980, 11 de outubro de 1990, 23 de setembro de 2000 e 7 de agosto de 2010.
Em 2020, esta data foi adiada por três semanas, devido ao efeito dos confinamentos motivados pela pandemia de Covid-19, antes de regressar aos níveis anteriores.
Esta pegada ecológica é calculada a partir de seis categorias diferentes: agricultura, pastagens, áreas florestais necessárias para produtos florestais, áreas de pesca, áreas construídas e áreas florestais necessárias para absorver o carbono emitido pela combustão de ‘combustíveis fósseis’ e que está intimamente ligada aos padrões de consumo, principalmente nos países ricos.
Por exemplo, se todos os humanos vivessem como os franceses, o Overshoot Day teria ocorrido ainda mais cedo, em 5 de maio de 2022.
O WWF e a Global Footprint Network apontam o dedo em particular para o sistema alimentar.
“O nosso sistema alimentar perdeu a cabeça com o consumo excessivo de recursos naturais, sem atender às necessidades da luta contra a pobreza” por um lado, e por outro uma epidemia de excesso de peso e obesidade, sublinha Pierre Cannet, do WWF França.
As duas ONG destacaram que a pegada ecológica dos alimentos é considerável, sendo que a produção de alimentos mobiliza todas as categorias de pegada, em especial as de cultura (necessárias para a alimentação animal e humana) e de carbono (a agricultura é um setor de alta emissão de gases de efeito estufa).
“No total, mais da metade da biocapacidade do planeta (55%) é usada para alimentar a humanidade”, salientam.
Mais especificamente, “uma grande parte dos alimentos e matérias-primas são utilizados para alimentar os animais e os animais que consumimos posteriormente”, detalha ainda Pierre Cannet.
No caso da União Europeia, “63% das terras cultiváveis (…) estão diretamente associadas à produção animal”.
No entanto, a agricultura contribui para a desflorestação, para as alterações climáticas, emitindo gases de efeito estufa, para a perda de biodiversidade e para a degradação dos ecossistemas, enquanto utiliza grande parte da água doce, apontam as ONG.
Com base em recomendações científicas, estas defendem a redução do consumo de carne nos países ricos.
“Se pudéssemos reduzir o consumo de carne para metade, poderíamos adiar em 17 dias a data do Dia de Sobrecarga da Terra”, explica Laetitia Mailhes.
Já limitar o desperdício de alimentos permitiria adiar a data em 13 dias, acrescentou, salientando que um terço dos alimentos é desperdiçado no mundo.
Se planeta consumisse como Portugal os recursos para este ano acabavam no sábado