“I want more berries and that summer feeling”, lê-se sob a imagem de um ursinho mal disposto capaz de aquecer o coração ao espectador menos atento às modas. Lisboa, noite 23: a t’shirt rosa com a frase, retirada do tema “Watermelon Sugar” foi mais um sucesso instantâneo, que assinalou a despedida das atuações na Europa. Em duas semanas, Styles segue para os EUA, onde deverá voltar à carga na infalível combinação Gucci+Adidas com a sua Love on Tour. Para a história nacional fica um charriot para Harry, ou a anatomia do guarda-roupa escolhido para a atuação deste domingo, numa Altice Arena esgotada. Falta acrescentar a esta trindade os ténis da marca alemã, que o têm acompanhado nas últimas paragens, e as calças de pele bicolores, com o carimbo da marca italiana — se lhe sobrar espaço na bagagem, considere um frasco de verniz para as unhas, o sortido de anéis e uma grinalda arco-íris, acessórios que de essencial têm tudo.

A influência do músico britânico não é um mero detalhe quando analisamos os números do segundo trimestre do ano, de acordo com um dos barómetros mais considerados do meio. Os dados mais recentes do index da Lyst (empresa de tecnologia da moda e app de compras premium) mostram como a Gucci, até aqui em segundo lugar, roubou o lugar cimeiro ocupado pela Balenciaga, recuperando assim o título de marca mais quente do mercado.

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No final de junho, a marca detida pelo gigante de luxo Kering, anunciava em Milão o reforço do vínculo com o ícone pop. Styles prepara-se para lançar em outubro a coleção de menswear HA HA HA autêntico objeto de desejo por qualquer género, em mais um passo na revolução de estilo servida pelo cantor. Se Harry por si só é um fenómeno de culto, o toque de midas ganha naturalmente outra força quando se mostra em palco. A digressão é pretexto para divulgar o mais recente álbum de estúdio do britânico, Harry’s House, mas também para desfilar os looks personalizados da Gucci, com o styling de outro Harry, Harry Lambert. “Quando me for”, disse ao The Guardian, “só espero que o que fique sejam pequenas coisas, como pôr pérolas no Harry e que os homens possam usar colares sem que isso seja algo de especial – é por isso que quero ser lembrado. Isso e quando as pessoas se vestem de Harry no Halloween. Significa que fizemos algo que teve impacto cultural.“, admitia em maio, juntando ao seu portfolio a intervenção em nomes como os atores Emma Corrin e Josh O’Connor, outros motores de mudança — para não falar da namorada do britânico, Olivia Wilde (já agora, apanhada a dançar entre o púbico durante o concerto em Lisboa).

O conjunto de 25 peças que a casa italiana e o artista vão lançar em conjunto promete fazer jus à melhor herança britânica e aos materiais italianos, entre a alfaiataria e a vibe 70’s, para uma pitada de disco millenial que não esquece o poder dos padrões e das jardineiras, duas fontes inesgotáveis entre o leque de uniformes que têm marcado a odisseia europeia e cumprido esse distanciamento de tudo aquilo que já deu o que tinha a dar. Ou como diria o seu stylist à Coveteur, que pretende usar a moda para encetar um poderosos diálogo, “Acho que o mundo já viu suficientes smokings pretos e vestidos bonitos.” Para a revista GQ, pelo menos, não há margem para dúvida: Harry Styles “é o músico mais bem vestido do mundo”.

Depois de ter passado os últimos nove meses a correr atrás do prejuízo, a injeção de genica na marca com direção criativa de Alessandro Michele está também associado à parceria com a Adidas. De acordo com a plataforma Lyst, a pesquisa pela etiqueta deu um pulo de quase 300% em apenas 48 horas depois do lançamento da coleção.

A relação de Styles com a Gucci manifesta-se num crescendo de força e popularidade desde que o enlace se formalizou. Talvez ainda se lembre das cândidas imagens do músico na campanha masculina Cruise 2019. E escusado será dizer que o guarda-roupa facilmente navega pelo departamento do lado, sem preconceitos ou hesitações — não menos histórica e memorável foi a capa que protagonizou em dezembro de 2020 para a revista Vogue, entrevistado por Amish Bowles e fotografado com peças femininas da Gucci.

Mas claro que a evolução e a aclamada atenuação de fronteiras entre masculino e feminino no que à composição dos looks diz respeito exigiu aturada construção, com o dedo do jovem Harry Lambert, o stylist responsável pela imagem singular de Styles e pelas silhuetas mais excêntricas, numa indiscutível fluidez. Trabalhando em conjunto desde 2015, devemos a Lambert os blazers colorblock e as calças de cintura super subida, do videoclipe de Watermelon ao icónico look de Fine Line, sem esquecer as produções nas principais passadeiras vermelhas.

Styles encetou a sua carreira em 2010, concorreu ao programa de talentos The X Factor a solo, e acabaria por se juntar aos One Direction. Ainda que os fatos prevalecessem em boa parte do moodboard, as adolescentes escolhas ficam bem arrumadas no passado. Em 2014, a Saint Laurent, a Lanvin ou a Dior entrariam em cena para acentuar a necessária rutura e o desejado salto em frente.

2015 American Music Awards - Arrivals

Em 2015, à chegada aos American Music Awards, em Los Angeles, ainda com os One Direction. Styles elegeu um fato Gucci © Getty Images

A estética para uma nova era começaria a consolidar-se por fim em 2017, quando Styles figurou em Dunquerque e projetou toda uma nova imagem na capa do seu novo álbum — para a história passa também o visual tartan com selo Gucci que exibiu ao vivo no programa Saturday Night Live, em abril daquele ano. Um ano mais tarde, a marca italiana anunciava que o músico seria a cara da sua nova campanha de tailoring. Daí até à passagem pelos perfumes foi um passo e por fim, a escalada dos cobiçados degraus da Met Gala, evento que co-apresentaria em 2019, fiel à sua estética-assinatura (que assimila sem pingo de pudores fiadas de pérolas, saltos saltos, plumas e cor-de-rosa quanto baste).

Da joalharia à exuberante boca de sino, nem a carteira com pega de bambu fica em falta quando a ocasião o exige. Assim aconteceu em 2021, quando o músico triunfou nos Brit Awards com o singles “Watermelon Sugar”. O fato? Um Gucci em lã e seda, claro, com um grafismo saído de uma das décadas mais estimadas.

Pelo caminho, vale a pena assinalar incursões em território com ADN português. Que o diga a Ernest W. Baker, quando viu o músico finalizar um dos looks para o vídeo de seu novo hit “As It Was” com um par de luvas da marca, pretas com acabamento em crochet encarnado, que se juntariam ao sobretudo da londrina Bianca Saunders e ao cachecol preto do designer belga Dries van Noten.

Canções sem falhas e juras de amor eterno: em Lisboa, Harry Styles foi um mestre de glória pop

Depois da capital portuguesa, Styles segue para os EUA, onde atuará ao longo dos próximos meses, seguindo-se o continente sul americano até ao cair do ano. Já em 2023, encontram-no do outro lado do mundo, entre Austrália e Nova Zelândia. Online não faltam completos arquivos de estilo, para quem procura inspiração permanente. E em outubro, chega aos cinemas em “My Policeman”.

Se dúvidas restassem sobre o poder de atração de Harry Styles — e porque nem a casa e a decoração escapam ao seu efeito — em junho o músico ocupou a capa da centenária Better Homes & Gardens, o quarto título mais vendido nos EUA, para uma conversa exclusiva sobre isolamento e tranquilidade doméstica.