O procurador José Ranito e o juiz desembargador Vítor Ribeiro completaram esta quarta-feira o processo de audição no parlamento dos candidatos a procurador europeu, valorizando experiências profissionais muito distintas para a indicação ao cargo na Procuradoria Europeia.

Atualmente a desempenhar as funções de procurador europeu delegado, José Ranito realçou o passado de 20 anos na investigação criminal e a passagem pelo Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP), sem esquecer o papel central no processo Universo Espírito Santo, mas valorizando também conhecimentos indispensáveis para esta instituição europeia.

“Parece-me necessário o conhecimento de contratação pública, do mercado de capitais – parte do Plano de Recuperação e Resiliência assenta em áreas de risco -, e do sistema financeiro”, elencou o procurador, que explicou também o funcionamento da Procuradoria Europeia e a importância dos últimos anos para dominar a organização transnacional.

Assinalando o percurso desde o caso BES/GES na recuperação de ativos e na cooperação judiciária, José Ranito traçou como prioridades para um eventual mandato a criação “de mecanismos de trabalho próprios que permitam assegurar que o regulamento é cumprido” e a implementação de “vasos comunicantes” entre autoridades nacionais e Procuradoria: “Existem 22 jogadores em campo e é suposto que os 22 usem o mesmo equipamento”.

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José Ranito foi ainda questionado pelos deputados da Comissão de Assuntos Europeus sobre outros aspetos, como os metadados, que considerou “uma ferramenta imprescindível de investigação”, o reforço de meios da Procuradoria Europeia, que vincou ser “absolutamente crucial”, a tolerância “nula” a fugas ao segredo de justiça e até a fluência em inglês, lembrando ter nascido na África do Sul.

“O procurador europeu delegado tem de ter um domínio bastante acentuado de tudo o que é a construção processual de inquéritos criminais e de todos os instrumentos de cooperação judiciária. Estamos perante fenómenos de criminalidade organizada. O modo de compatibilizar tudo em investigações transnacionais não é fácil“, resumiu o elemento indicado para o cargo pelo Conselho Superior do Ministério Público.

A terminar o processo de audições iniciado na terça-feira – no qual foram ouvidos os juízes Carlos Alexandre, Catarina Pires e Filipe César Marques – esteve o desembargador Vítor Ribeiro, que destacou as quase três décadas na magistratura judicial e que o levaram a passar pelas varas criminais de Guimarães, pelos Tribunais da Relação e a desempenhar funções como inspetor judicial no Conselho Superior da Magistratura.

“Tive conhecimento de todas as etapas de investigação e pude inteirar-me da sua eficiência ou ineficiência. Tive uma perspetiva externa, mas forçosamente detalhada”, disse, acrescentando: “A circunstância de ser juiz e de não ter intervenção na investigação não constitui um óbice à indicação. Candidato-me pela relevância da Procuradoria Europeia no projeto europeu”.

Vítor Ribeiro enfatizou ainda a “versatilidade e capacidade de adaptação a diferentes funções”, além de ter garantido que possui uma “visão muito ampla do sistema judicial português”. Por outro lado, não deixou de fazer alguns desabafos sobre o modo de funcionamento da justiça.

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“Há um grave problema de comunicação da justiça”, referiu o desembargador, assumindo a “frustração” por ver muitas vezes investigações com prova insuficiente para uma condenação, e lamentou também que os juízes não tenham formação a nível informático: “Quando há um novo programa, vamos aprendendo por nós”.

O processo de candidatura e seleção do sucessor do procurador José Guerra, cujo mandato termina em julho, como procurador europeu português tem estado envolvido em polémica e reviravoltas, com desistências de candidatos, como foi o caso do juiz Ivo Rosa.

O magistrado português José Guerra foi nomeado em 27 de julho de 2020 procurador europeu nacional na Procuradoria Europeia, órgão independente com competência para investigar, instaurar ações penais e deduzir acusação e sustentá-la na instrução e no julgamento contra os autores das infrações penais lesivas dos interesses financeiros da União (por exemplo, fraude, corrupção ou fraude transfronteiriça ao IVA superior a 10 milhões de euros).