Um “orifício bónus”. É assim que o website de uma instituição de caridade britânica que se dedica a disseminar informação e lançar campanhas de prevenção contra o cancro do colo do útero sugere que nalguns casos se refira a vagina, um conselho que está a gerar indignação.

Como escreve o Telegraph, a instituição — Jo’s Cervical Cancer Trust, a única entidade focada especificamente no cancro do colo do útero, mencionada na página do serviço nacional de saúde britânico — escreveu sobre esta “alternativa” para tentar não ferir a susceptibilidade de homens transgénero ou pessoas não binárias, mas está a ser atacada por isso.

No site da instituição existe um glossário de “linguagem a usar para apoiar homens transgénero e/ou pessoas não binárias”. É nesse contexto que aparece, na letra B, a expressão “bonus hole”, ou “orifício bónus”, definida assim: “Uma palavra alternativa para vagina. É importante verificar quais as palavras que cada pessoa prefere usar”.

O mesmo conselho, umas linhas mais à frente, para “front hole”, ou orifício da frente, em português.

Nessa espécie de manual explica-se que usar a linguagem correta para falar da identidade de género de alguém é uma forma “simples e eficaz de mostrar apoio e reconhecimento”. “Se for usada linguagem incorreta é usada sem ser corrigida, isso pode fazer com que alguém se sinta magoado ou perturbado. Isto pode levá-los a procurar apoio noutro lado”.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

O manual esclarece ainda que “toda a gente comete erros de vez em quando” e que é importante reconhecê-los, corrigi-los, aprender com eles e “seguir em frente”. Explorar ainda mais esses erros pode fazer com que a pessoa em causa fique ainda mais “desconfortável”.

O glossário foi construído em parceria com a LGBT Foundation, mas está a ser questionado. O Telegraph cita Bev Jackson, uma ativista dos direitos das mulheres (da organização LGB Alliance, que na sua sigla não inclui o “T” para pessoas transgénero), que diz que esta é uma “linguagem nojenta” que “desumaniza intencionalmente as mulheres” e deve “ser rejeitada por todas as pessoas razoáveis”.

“O facto é que as mulheres têm vaginas. É espantoso que alguém possa pensar que a realidade é ofensiva. Se acham que é ofensivo é problema vosso. Não há razão para que o resto da sociedade se adapte a uma linguagem para não ofender pessoas que se ofendem com a realidade”, apontou, acusando “algumas pessoas” de quererem ignorar “as diferenças biológicas muito claras entre homens e mulheres”.

Este é, de resto, um ponto de conflito recorrente entre parte dos movimentos feministas e da comunidade transgénero — parte das ativistas feministas defende que não se pode ignorar as diferenças biológicas nem desvalorizar intencionalmente as experiências que são especificamente femininas, algo contestado por ativistas transgénero e que defendem a autodeterminação de género.

Um porta-voz da Jo’s Cervical Cancer Trust disse ao Telegraph que a informação disponível no website é dirigida a profissionais de saúde que atendam pacientes transgénero (no caso, pessoas cujo género biológico seja feminino mas que se identifiquem como homens, podendo ainda ter características físicas próprias do sexo feminino). “A página não serve para promover o uso destes termos com todas as mulheres, é uma lista de expressões que os enfermeiros podem constatar que alguns pacientes preferem”, cita o jornal.

“As mulheres são o nosso público principal. Ainda assim, alguns homens transgénero e/ou pessoas não binárias têm útero, e para reduzir ao mínimo possível os cancros do colo do útero é importante que também providenciemos informação a este grupo e aos profissionais de saúde que o apoiam”, lê-se na mesma resposta.